quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Câmara Federal poderá obrigar empresas a coletarem lixo

CONGRESSO EM FOCO, 21 de outubro de 2009

Proposta que começa a ser analisada pelos deputados obriga empresas a recolherem do mercado embalagens e produtos recicláveis ou reutilizáveis


Uma proposta que está pronta para ser votada no plenário da Câmara obriga empresas a recolherem do mercado embalagens, produtos e materiais que possam ser reciclados ou reutilizados. De acordo com o projeto, fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de lâmpadas fluorescentes, pilhas, bateria, pneus, óleos lubrificantes e produtos eletrônicos deverão retirar esses produtos de circulação após uso do consumidor.

A medida faz parte do substitutivo ao projeto de lei que cria a Política Nacional de Resíduos Sólidos. A proposta trata de um assunto estratégico para o Brasil: o gerenciamento dos cerca de 170 mil toneladas de lixo produzidas diariamente no país. Mais de cem proposições tramitam juntamente com o substitutivo, que foi construído a partir de um projeto de lei que há 18 anos aguarda votação do Congresso.

Na manhã desta quarta-feira (21), a Comissão de Meio Ambiente da Câmara e a Frente Parlamentar Ambientalista realizam uma audiência pública sobre o tema. O objetivo, segundo a frente, é “arregimentar forças” para sensibilizar e pressionar deputados e senadores a aprovarem o projeto dos resíduos sólidos.

A proposta institui o chamado sistema da logística reversa, pelo qual o setor empresarial passa a ser responsável por estruturar e implementar uma rede de coleta, reaproveitamento e/ou destinação final de produtos descartados pelos consumidores. Por esse modelo, ficará a encargo das empresas, por exemplo, instalar os procedimentos de compra de produtos e embalagens usados e oferecer postos de entrega de materiais recicláveis para os consumidores.

“Cada vez mais há uma cobrança pela sustentabilidade. Esse conceito veio para ficar e este momento é super oportuno. Com essa logística reversa, as empresas terão vantagens econômicas com o retorno dos produtos, e estaremos prevenindo esse passivo ambiental. É melhor prevenir do que remediar”, defende o deputado Arnaldo Jardim (PPS-SP), coordenador do Grupo de Trabalho (GT) de Resíduos Sólidos, responsável pelo projeto.

Polêmica
O substitutivo, segundo o relator, foi elaborado por consenso entre diversos setores. Ainda assim, alguns pontos do projeto devem enfrentar resistência em plenário. Um dos integrantes do grupo de trabalho, o deputado Jorge Khoury (DEM-BA) prevê discussões em torno da implantação do sistema de logística reversa.

De acordo com o projeto, os custos da logística reversa devem ser repassados ao setor empresarial. Se o titular do serviço público de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, por acordo setorial ou termo de compromisso, encarregar-se das atividades previstas nesse sistema de logística, o fabricante, distribuidor, comerciante e importador terá de pagar pelos serviços.

“Há um questionamento se isso não seria uma bitributação. Creio que esse ponto enfrentará alguma resistência quando for a plenário”, prevê Khoury.
Também podem enfrentar resistência o artigo que proíbe a queima a céu aberto sem licença ambiental e o dispositivo que proíbe a importação de “resíduos sólidos perigosos e rejeitos, bem como os resíduos sólidos cujas características causem dano ao meio ambiente e à saúde pública, ainda que para tratamento, reuso, reutilização e recuperação”.

“Embora o projeto não trate de forma tão explícita, ele proíbe, por exemplo, a importação de pneus, que são resíduos sólidos que causam danos. Certamente, haverá um lobby forte para permitir a importação desses produtos”, avalia o líder do PV, Edson Duarte (BA). O líder ambientalista considera fundamental a aprovação da proposta, que servirá de marco regulatório para a gestão de resíduos sólidos no Brasil.

Veja a íntegra do relatório

Quase metade do lixo tem destino inadequado
País não sabe o que fazer com mais de 67 mil toneladas de resíduos sólidos produzidas por dia

O país coleta, por dia, 150 mil toneladas de resíduos sólidos (material, substância, objeto ou bem descartados resultante de atividades humanas). Desse total, mais de 67 mil toneladas (aproximadamente 45%) tiveram destinação inadequada todos os dias ao longo de 2008, segundo relatório da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe).

A proposta do GT de Resíduos Sólidos pretende corrigir esse déficit. Além de estabelecer objetivos e diretrizes gerais de uma política nacional, o projeto traz instrumentos para uma gestão integrada entre União, estados e municípios no que se refere ao gerenciamento do lixo.

O projeto estabelece a necessidade de planos de gestão de resíduos sólidos nos três âmbitos da Federação. No caso dos estados e municípios, os planos serão condições para que tenham acesso a recursos da União.

O setor empresarial também terá de elaborar plano de gerenciamento de resíduos. A intenção é fazer uma radiografia sobre a produção e destinação do lixo em todo o país, estabelecendo programas e metas para reduzir a quantidade produzida.

“O Brasil é frágil no que se refere ao conhecimento de seus resíduos sólidos. Os planos de gestão e gerenciamento vão trazer para o setor público a obrigação de dizer como isso vai ser gerenciado. O setor privado também terá de indicar a direção para o gerenciamento dos resíduos. Toda a América Latina aguarda essa política brasileira para saber qual o caminho exequível”, afirma o secretário parlamentar José Valverde, que participou do GT.

Nessa política, o consumidor poderá ser obrigado a fazer a coleta seletiva. O lixo produzido nas residências brasileiras terá de ser dividido entre resíduos sólidos reutilizáveis e recicláveis para coleta ou devolução. Essa obrigatoriedade, no entanto, só existirá se o plano de gestão dos municípios estabelecer sistema de coleta seletiva.

“O plano de ações em nível nacional é muito importante. Hoje o difícil é que existem leis diferentes em níveis municipais. Ter um plano nacional é importante para organizar isso”, afirma o diretor-executivo do Compromisso Empresarial para a Reciclagem (Cempre), André Vilhena.

“Outro ponto importante do projeto é que ele prevê, dentro dessa visão de logística reversa, o apoio às cooperativas para exercer essa responsabilidade pós-consumo. Isso é fundamental”, defendeu.

Incentivos
A proposta traz também incentivos econômicos para estimular a redução de resíduos sólidos, o desenvolvimento de produtos de menor impacto ambiental, a coleta seletiva e outras ações. Além de linhas de financiamento especiais para entidades que adotem essas medidas, também está prevista a redução de 50% das alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre a aquisição de máquinas e instrumentos destinados à reciclagem.

O primeiro projeto para regulamentar a gestão do lixo no Brasil foi apresentado em 1991 (PL 203/91). Em 2007, o governo encaminhou ao Congresso outra proposta que criava a política nacional de resíduos sólidos (PL 1991/2007). Na época, houve grande expectativa sobre a votação da matéria, mas, com a falta de consenso para votar o texto, foi preciso criar um grupo de trabalho para debater o tema.

“Desta vez conseguimos consenso muito alto sobre a matéria. Os detalhes são detalhes e não terão risco de contaminar o projeto principal. Estou muito animado”, disse Arnaldo Jardim. “Faremos um esforço para que ele seja votado ainda este ano, de preferência na primeira semana de novembro, para irmos a Copenhague já com essa política aprovada”, concluiu.

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