INSTITUTO AME CIDADE, 24 de junho de 2010Sempre se pergunta qual é o motivo do ex-prefeito Antonio Belinati ter sido cassado pela Câmara Municipal de Londrina e até hoje não ter sido condenado nas variados ações do Ministério Público levadas à Justiça, em processos cercados de provas e com acusações de desvios até maiores que o caso AMA-Comurb, que levou a perda do seu mandato.
Belinati foi cassado em 22 de junho de 2000 pela acusação de cometer abusos na inauguração do Pronto Atendimento Infantil (PAI), uma vistosa obra no centro da cidade. A inauguração foi em março de 1998 e contou até com a presença de Xuxa, a apresentadora de programas infantis da Rede Globo, obviamente com cachê pago.
A Comissão Processante investigou e concluiu que a prefeitura gastou cerca de R$ 1 milhão para a festa de inauguração do PAI, que custou R$ 3,1 milhões em valores da época.
A diferença entre o processo na Câmara Municipal e os outros que correm na Justiça é que no primeiro existe um peso político inerente ao caráter de todo Legislativo. A ação contra Belinati na Câmara seguiu todos os trâmites legais, inclusive com as provas referentes à acusação e todo o direito de defesa do acusado, que até contratou advogados que atuaram em sua defesa na sessão plenária que concluiu pela cassação. São procedimentos legais que, se não fossem seguidos à risca, poderiam dar margem para a cassação ser contestada na Justiça, o que por sinal foi feito por ele sem alcançar êxito.
Ninguém pode dizer que também na Justiça as motivações políticas também não influam em qualquer julgamento, ou pelo menos no trâmite do processo, que pode muito bem sair do alto de uma pilha para execução e ir dormir numa gaveta escura.
Se não fosse assim, teríamos que acreditar que é apenas para obter seus saberes jurídicos que grandes corruptos contratam ex-ministros da Justiça, altos dirigentes da OAB, antigos secretários, procuradores e até ex-ministros do STF que tiveram, por força de seus cargos, livre convívio com normas da administração pública e até a segredos de Estado, além da expressiva influência que qualquer um angaria em funções públicas no Brasil.
Nossa Justiça permite um conjunto de manobras jurídicas que, nas mãos ágeis de uma banca de advogados bem pagos, pode protelar uma sentença por anos, esticando este período até chegar a prescrição do caso.
E isso não ocorre apenas no âmbito político. Apenas para demonstrar, peguemos o caso do jornalista Marcos Pimenta Neves, que ocupou influentes cargos na imprensa nacional. Pimenta Neves, com 69 anos, matou sua ex-namorada, a jornalista Sandra Gomide, de 32 anos. O motivo do crime teria sido o fim do relacionamento dos dois.
Pimenta Neves deu dois tiros em Sandra Gomide, sendo o primeiro pelas costas. O jornalista foi denunciado pelo Ministério Público por homicídio doloso com dois agravantes. O ciúme, como motivo torpe, e recurso que impossibilitou a defesa da vítima: o tiro pelas costas.
Mesmo tendo fugido da cena do crime e sendo criminoso confesso, Pimenta Neves ficou preso durante apenas sete meses, até 2001. Foi condenado posteriormente, em maio de 2006, a 19 anos, dois meses e 12 dias de prisão pelo assassinato, mas até hoje recorre à sentença em liberdade.
Como a Justiça brasileira dá possibilidade de protelação para casos tão flagrantes e pavorosos como este, não é difícil entender que políticos corruptos alonguem os processos que os atingem até que estes cheguem à prescrição.
Belinati é réu em 34 ações. Nenhuma delas foi concluída na Justiça, sendo difícil até obter informações sobre a situação de cada uma delas. Em reportagem sobre os dez anos da cassação, publicada no último dia 20, o Jornal de Londrina dá a seguinte informação:
“Em pesquisa feita nos cartórios na semana passada, a reportagem do JL encontrou, por exemplo, a ação 686/01, que tramita na 6ª Vara Cível. A última movimentação dela é de 27 de fevereiro do ano passado. De acordo com a consulta feita no computador disponibilizado pelo cartório, há 16 meses o processo está “concluso para despacho”. Porém, não é possível saber sobre o que o juiz vai decidir, já que o processo não se encontra no cartório.”
A verdade é que em casos como o de Belinati, processos vão e voltam no meandros da Justiça, ficando por muitas vezes parados durante anos, por força do trabalho incessante de bancas de advogados experientes em azeitar ou emperrar engrenagens jurídicas, conforme o interesse de cada caso ou ocasião.
O prefeito cassado de Londrina sempre esteve muito bem assessorado por advogados experientes, alguns reconhecidos até na área criminal. Atualmente, um deles é Antonio Carlos de Andrade Vianna, o principal advogado de defesa nas ações referentes ao caso AMA/Comurb.
Vianna é profissional muito conhecido em toda a região do Norte do Paraná. Em Cornélio Procópio é advogado de Arnoldo Marty Júnior, que foi vice do prefeito Amin Hannouche (PP) em sua primeira administração, tendo sido também secretário de muita influência neste segundo mandato. Marty Júnior chegou a ser preso sob a acusação de receptação de máquinas agrícolas roubadas. O ex-vice-prefeito de Cornélio Procópio pagou fiança de R$ 10 mil e responde à acusação em liberdade.
Falando ao Jornal de Londrina sobre os dez anos da cassação de Belinati, Vianna trouxe sua versão sobre a morosidade dos processos contra seu cliente.
“Os juizes trabalham das 14h às 17h, não há expediente que aguente isso”, disse o advogado ao jornal. E quem já viu Vianna em entrevista pela televisão pode imaginar de que modo ele disse isso. Prosseguindo, da mesma forma, o advogado ainda afirmou o seguinte: “Enquanto o profissional liberal hoje trabalha 8 horas e já é pouco, o juiz trabalha 3 horas por dia. Pode ir no Fórum e verificar, de manhã você não acha juiz nenhum trabalhando, só trabalham à tarde e fecham às 17 horas”.
Seria uma boa surpresa para os londrinenses e para todos os brasileiros respeitosos da ética que a Justiça atendesse o advogado do Belinati e fizesse um esforço extra nas ações que acusam seus clientes de tantos crimes, despachando para que finalmente os tribunais dessem ao caso um veredito justo, como o que foi alcançado no Legislativo graças à bravura cívica dos londrinenses.