quarta-feira, 7 de abril de 2010

Autonomia do MP: Conselho emite nota técnica contra projeto de Maluf

SITE DO CNMP, 7 de abril de 2010

O Conselho Nacional do Ministério Público expediu ontem, 6 de abril, uma Nota Técnica em que se manifesta contrário à aprovação do projeto de lei n. 265/2007, de autoria do ex-deputado Paulo Maluf, que propõe alterações na Lei 4.717/65 (lei da ação popular), na Lei 7.347/85 (lei da ação civil pública) e na Lei 8.429/93 (lei da improbidade administrativa).

O CNMP já havia se manifestado sobre o PL 265/2007 em agosto de 2007, quando o projeto foi apresentado. A nova Nota Técnica do CNMP reitera os argumentos da anterior e apresenta novas razões contrárias à aprovação do projeto.

Os 14 conselheiros do Conselho Nacional do Ministério Público, incluindo o presidente, Roberto Gurgel, estiveram também neste dia 6 de abril na Câmara dos Deputados, reunidos com o presidente da casa, Michel Temer. O motivo da reunião foi a entrega da Nota Técnica do CNMP.

Durante a visita, o presidente do CNMP, Roberto Gurgel, argumentou que a aprovação do PL 265/2007 “é absolutamente desnecessária, uma vez que o Conselho Nacional tem prerrogativas constitucionais e plenas condições de efetuar o controle da atividade dos membros que venham a cometer excessos, portanto, o conteúdo do PL já é atribuição do CNMP".

O presidente do Conselho fez questão de ressaltar que os argumentos colocados na Nota Técnica, contrários à aprovação do projeto de lei, “representam a posição de todo o CNMP, órgão de controle externo heterogêneo, com representantes de diversos segmentos da sociedade, e não uma posição apenas de caráter corporativo.”

O presidente da Câmara, Michel Temer, disse durante o encontro que os argumentos da Nota Técnica do CNMP colocam a discussão sobre o projeto sob um novo foco. Para ele, “a propositura de um projeto de lei que amplie as competências do CNMP é um novo argumento e extremamente útil, até o presente momento esse argumento não havia chegado à Câmara.” Michel Temer disse ainda que, apesar do pedido de urgência assinado por todos os líderes, não colocará, por enquanto, o projeto em pauta.

Leia aqui a nota divulgada pelo CNMP

Ministério Público promove Dia Nacional de alerta contra a "Lei Maluf"

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PR, 7 de abril de 2010


Representantes do Ministério Público de todo o país reuniram-se ontem em Brasília no auditório da Procuradoria-Geral da República, durante manifestação em repúdio ao projeto de lei 265/2007, que tramita em regime de urgência na Câmara dos Deputados. O objetivo foi alertar a sociedade, uma vez que a eventual aprovação da chamada "Lei Maluf" – ou "Lei da Mordaça", como também é conhecida – implicaria num duro golpe contra todos aqueles que, como o Ministério Público, atuam na defesa do interesse público. A proposta do deputado Paulo Maluf estabelece responsabilidade civil pessoal de membros do MP e dos demais autores de ações civis públicas e ações populares, sempre que se reputem "temerárias, de má-fé ou com finalidade de promoção pessoal ou perseguição política".

A promoção do "Dia Nacional de Alerta Contra a Lei Maluf" foi definida pelo Grupo de Coordenação Política do Ministério Público, integrado por representantes do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União (CNPG), da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP), da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANP) e da Associação Nacional do Ministério Público Militar (ANMPM). O CNPG, que é presidido pelo procurador-geral de Justiça do Paraná, Olympio de Sá Sotto Maior Neto, em nota oficial distribuída à imprensa, classifica a proposta malufista como mais uma tentativa de atacar ou silenciar o Ministério Público brasileiro nas iniciativas que visam preservar o patrimônio público. "Ao invés do Projeto melhorar a atividade de fiscalização do erário, caminha no sentido inverso. Não acrescenta nenhuma vantagem para as camadas populares despossuídas e visa facilitar a vida daqueles que estão lesando os cofres públicos".

Confira, a seguir, a íntegra do protesto:


NOTA À IMPRENSA
CNPG – CONSELHO NACIONAL DE PROCURADORES-GERAIS DO MINISTÉRIO PÚBLICO DOS ESTADOS E DA UNIÃO A PROPÓSITO DO PROJETO DE
LEI Nº 265/2007 DE AUTORIA DO DEPUTADO FEDERAL PAULO MALUF

Diante do requerimento nº 6447/2010, apresentado em 16 de março de 2010 no Plenário da Câmara dos Deputados em assinatura conjunta dos Líderes dos Partidos Políticos, postulando urgência na apreciação em plenário do Projeto de Lei nº 265/2007, de autoria do Deputado Federal Paulo Maluf, o CNPG, visando contribuir para o debate em torno da questão e alertar a opinião pública quanto a gravidade de seu conteúdo, vem considerar o que segue.

1) O Projeto prevê a responsabilidade pessoal do agente do Ministério Público que atua em nome da Instituição, propondo ações civis públicas, "quando a ação for temerária ou for comprovada má-fé, finalidade de promoção pessoal ou perseguição política", impondo-lhe condenação por custas e honorários.

2) Não pode o membro do Ministério Público ser atingido pessoalmente quando quem atua é a Instituição Ministério Público e não a pessoa do Promotor de Justiça nos Estados ou do Procurador da República na União. O artigo 129, III, da Constituição Federal dispõe textualmente que é função institucional do Ministério Público "promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos". Desta maneira, dá-se instrumento para a sociedade, através do Ministério Público, realizar a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127 da C.F.). As práticas de improbidade também são atacadas mediante ação civil pública. Estas normas constitucionais deixam claro que é a Instituição Ministério Público que atua nos processos cumprindo suas funções. Não se trata de atuação pessoal do agente ministerial. Inclusive, vários Promotores de Justiça podem atuar no mesmo processo de forma sucessiva ou concomitante. Este aspecto revela a unidade e indivisibilidade de que fala o artigo 127, §1º, da C.F., também desprezadas pelo projeto de lei.

3) Nestes termos, o projeto de lei descura da natureza jurídica da atuação do M.P. nos feitos em que oficia. A Instituição age pleiteando em nome próprio direitos da sociedade, naquilo que a literatura especializada chama de substituição processual. Não é o agente que age enquanto pessoa física ou natural, como representante ou substituto processual. É –repita-se - a Instituição. Não se quer, com isso, uma absoluta imunidade em favor do agente do Ministério Público. Sua atividade, atualmente, já encontra limites concernentes à litigância de má-fé, previstos no Código de Processo Civil, artigos 15, 16 e 17, aplicáveis à ação civil pública.

4) Para além de colidir com normas constitucionais, especialmente, com os artigos 127, §1º e 129, da C. F, o Projeto de Lei do Deputado Maluf representa mais uma tentativa de atacar ou silenciar o Ministério Público Brasileiro nas iniciativas que visam preservar a coisa pública. Ao invés do Projeto melhorar a atividade de fiscalização do erário, caminha no sentido inverso. Não acrescenta nenhuma vantagem para as camadas populares despossuídas e visa facilitar a vida daqueles que estão lesando os cofres públicos. Se aprovado o Projeto poderá provocar significativo retrocesso neste setor, colocando sob ameaça pessoal o membro do Ministério Público cumpridor de suas funções. Vale assinalar que: a) o Ministério Público não exerce atividade política partidária alguma e quando age o faz respaldado pelas provas colhidas e pelo que disciplina sua missão constitucional; b) as ações civis públicas têm alterado o panorama social do país com inéditas e históricas conquistas e responsabilizações dos malversadores do erário, sendo hoje o principal instrumento de mudanças sociais que dispõe o Ministério Público, inclusive quando comparado com a ação penal.

Olympio de Sá Sotto Maior Neto
Presidente do CNPG

Procuradores pedem para Câmara não votar a "lei da mordaça"

FOLHA DE S. PAULO, 7 de abril de 2010

Integrantes do Ministério Público Federal pediram nesta terça-feira ao presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), a retirada da pauta de votações da Casa o projeto que institui a chamada "Lei da Mordaça" aos procuradores. Liderados pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, os procuradores afirmam que o projeto é desnecessário e traduz "inutilidade", além de ser uma retaliação de políticos que foram investigados no passado pelo Ministério Público --como o próprio autor do texto, deputado Paulo Maluf (PP-SP).

"O projeto apresentado é absolutamente desnecessário. E sendo absolutamente desnecessário, parece que insistir na sua tramitação poderia dar ideia de alguma retaliação de pessoas que foram alvo da ação do MP", disse Gurgel.

O procurador admitiu que há abusos por integrantes do Ministério Público em investigações conduzidas em nível federal ou regional, mas disse que o Conselho Nacional do MP tem "plenas condições" de exercer o controle sobre a categoria, sem a necessidade da "lei da mordaça".

"Há uma diminuta minoria que às vezes comete os seus excessos, e é necessário que quando esses excessos ocorram, que haja atuação de órgão de controle, no caso o Conselho Nacional do Ministério Público. Reforçamos a capacidade do conselho de atuar coibindo esses abusos, quando ocorrem", disse o procurador.

Segundo Gurgel, a Constituição Federal atribuiu ao conselho do MP a responsabilidade por analisara conduta de integrantes da instituição. O procurador admitiu que o conselho precisa ter a "estrutura adequada" para exercer o controle interno da instituição, mas disse que eventuais adequações podem ocorrer em curso prazo.

"Hoje temos corregedorias em cada esfera do Ministério Público. Acima das corregedorias, há o conselho exercendo o controle externo, que existe. Os abusos representam um percentual ínfimo diante da conduta do MP", afirmou.

O procurador disse que chegou a conversar com o deputado Paulo Maluf sobre a proposta, mas o autor do projeto insistiu na sua tramitação. O texto tramita em regime de urgência na Câmara, e pode ser colocado na pauta de votações nas próximas semanas.

Segundo Gurgel, Temer se comprometeu a levar a nota técnica apresentada pelos procuradores aos líderes partidários para que a posição do Ministério Público contrária à proposta seja considerada antes da sua votação.

Proposta
O projeto prevê punição a procuradores e promotores que agirem de má fé --chamada por boa parte dos membros do Ministério Público de 'Lei da Mordaça'. Proposto pelo deputado federal Paulo Maluf, o texto prevê a punição para procuradores e promotores que entrarem com ação contra políticos motivados por promoção pessoal, má-fé ou perseguição. As penas vão de pagamento de despesas com o processo a dez meses de reclusão.

A ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República) organiza uma série de protestos contra o projeto, que terão início nesta terça-feira. Segundo o presidente da associação, Antonio Carlos Bigonha, as manifestações contrárias ao projeto têm o objetivo de mostrar à opinião pública os prejuízos provocados com a aprovação da lei. "A proposta inaceitável de fazer calar o Ministério Público tem de ser combatida com rigor', afirmou Bigonha.

Câmara dos Deputados adia para maio votação do projeto da ficha limpa

Câmara dos Deputados adia para maio votação do projeto da ficha limpa
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FOLHA DE S. PAULO, 7 de abril de 2010

A Câmara dos Deputados decidiu nesta quarta-feira adiar para maio a votação do projeto que estabelece a ficha limpa para os candidatos às eleições --o que na prática pode impedir que a nova regra possa valer nas eleições de outubro. Como apenas a oposição apoia a votação imediata do texto, o projeto voltará para análise da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), que terá até o dia 29 de abril para discutir a matéria.

O projeto, de iniciativa popular, foi apresentado à Casa em setembro do ano passado. Os deputados, porém, afirmam que ainda precisam discutir melhor a matéria antes de colocá-la em votação. O projeto encontra grande resistência na Casa especialmente por estabelecer a inelegibilidade para políticos condenados em primeira instância --desde que a decisão tenha sido tomada por um colegiado de juízes.

"A segunda instância com efeito suspensivo reduz a disputa política. Infelizmente, os tribunais regionais eleitorais são marcados por uma história de prevalência do ambiente político", disse o líder do PT na Câmara, deputado Fernando Ferro (PE).

Os deputados governistas, em sua maioria, trabalham para que somente condenados em segunda instância fiquem inelegíveis, com o direito de recorrer ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) para garantir o efeito suspensivo da condenação.

A oposição apresentou pedido de urgência para a votação da matéria hoje, como previsto inicialmente, mas conseguiu o apoio de apenas 161 deputados --número inferior aos 257 necessários para que a matéria não retornasse à análise da CCJ. Como haverá emendas apresentadas ao texto, o projeto terá que retornar à CCJ.

O presidente da Câmara, deputado Michel Temer (PMDB-SP), disse que PT e PMDB se comprometeram em aderir à urgência se até o dia 29 o projeto não for analisado na CCJ.

"Se até o dia 29 a comissão não tiver concluído a análise da matéria, os líderes assinarão de imediato a urgência. Eu estou fazendo o possível para ser votado, mas para ir ao plenário tem que haver um ajustamento para que a Câmara saia bem desse processo", disse o peemedebista.

Resistências

Além do PT, o PMDB, PP e PTB se mostraram contrários à votação imediata do projeto. Contrário ao atual modelo do projeto, o líder do PP na Câmara, deputado João Pizzolatti (SC) disse que "há pontos a serem corrigidos" no texto além da questão da inelegibilidade.

"Ou vamos fazer política, ou vamos fazer um projeto legal. Não se pode fazer uma votação açodada por interesses políticos. Um dos problemas é a tipificação dos crimes que tornam um deputado inelegível", afirmou.

O deputado Índio da Costa (DEM-RJ), que relatou o projeto na comissão especial da Casa criada para analisar a matéria, criticou o adiamento da votação. "Todos deveriam ter assinado o pedido de urgência para ir à votação hoje no plenário", disse.

Apesar da pressão de muitos parlamentares para que só ficassem inelegíveis políticos condenados em última instância, o grupo de trabalho decidiu manter a ideia inicial do projeto --com a condenação em primeira instância, mas submetida à análise de um grupo de pelo menos três juízes.

O projeto de iniciativa popular já tem 1,6 milhão de assinaturas na defesa da sua aprovação. O texto, além de estabelecer a chamada "ficha limpa", também determina que os políticos devem ficar inelegíveis por até oito anos depois de cumprirem a pena estabelecida pela Justiça. Pela legislação atual, os políticos perdem o direito de se candidatar oito anos depois da condenação --sem incluir o prazo de cumprimento da pena.

O veto aos políticos condenados pelo colegiado de juízes vale para uma lista de crimes, a maioria ligados à administração pública, como: crimes contra o sistema financeiro, eleitorais, abuso de autoridade, patrimônio público e privado, lavagem de dinheiro --além de outros como tráfico de trocas, racismo, terrorismo, formação de quadrilha e terrorismo.

Outra mudança no projeto muda as regras para que os políticos não possam renunciar aos mandatos com o objetivo de escapar de processos de cassação. Atualmente, o político pode renunciar ao mandato para não ser cassado desde que anuncie a renúncia antes da instauração do processo no Conselho de Ética da Câmara ou do Senado.

OMS adverte sobre impactos negativos da zona urbana para a saúde

Insuficiência de infraestruturas e propagação de doenças contagiosas terão maior impacto no futuro


ESTADÃO ONLINE, 07 de abril de 2010

As zonas urbanas têm um impacto direto, frequentemente negativo, sobre a saúde dos habitantes, mesmo no caso de pequenas e médias cidades, advertiu nesta quarta-feira, 7, a Organização Mundial da Saúde (OMS).

"As cidades concentram oportunidades e serviços, mas também riscos e ameaças à saúde", declarou a diretora-geral da OMS, Margaret Chan, ao apresentar uma campanha que incide no vínculo entre os planos urbanísticos e a saúde das populações, celebrando o Dia Mundial da Saúde.

A OMS ressaltou que praticamente todo o crescimento demográfico dos próximos 30 anos se concentrará nas cidades. Estima-se que em 2030 seis em cada dez pessoas vivam em cidades.

Em consequência disso, tanto nas metrópoles como nas pequenas e médias cidades se observará uma degradação das condições de saúde devido a fatores como insuficiência de infraestruturas, propagação de doenças contagiosas e aumento de doenças crônicas devido a estilos de vida insalubres.

Também se prevê um aumento dos acidentes de trânsito e de atos de violência em geral.

Água e saneamento básico
O limitado acesso à água potável será outro desafio em um mundo cada vez mais urbanizado. Hoje cerca de 94% dos residentes urbanos de países em desenvolvimento contam com pelo menos 20 litros de água por dia em uma fonte a menos de 1 quilômetro de seus domicílios, mas os riscos de poluição da água são elevados.

A OMS também considerou um grave problema que somente 24% da população urbana conte com serviços mínimos de saneamento, como banheiros conectados ao esgoto.

A situação é ainda pior para os 170 milhões de residentes em zonas urbanas marginais que carecem inclusive do mais simples banheiro, enquanto outros 500 milhões de pessoas compartilham serviços higiênicos com pessoas de fora da família.

Ao apresentar este quadro, Chan assinalou que a aglomeração que habitualmente se observa em meios urbanos desfavorecidos "amplia as consequências de fatores como a contaminação dos alimentos ou da água, os altos níveis de poluição sonora, as substâncias químicas, os desastres naturais e o surto de doenças".

Como exemplos de cidades que se desenvolveram em boa direção, ela mencionou Adis-Abeba (capital da Etiópia) e Nova York, a primeira por sua limpeza irretocável e a segunda por fatores como a segurança de seus habitantes e medidas como a proibição de fumar em restaurantes e em outros locais públicos.


Quase 40% da população mundial não tem acesso a saneamento básico
Passados dez anos desde os compromissos que a ONU aprovou para melhorar a vida dos mais pobres do planeta, 884 milhões de pessoas seguem sem acesso à água potável e 2,6 bilhões não dispõem de saneamento básico nos locais em que vivem.

Um novo relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) diz que, apesar desses números, os avanços no âmbito da água são certamente encorajadores, com 87% da população mundial bebendo e utilizando água apta para o consumo. Por outro lado, a situação é decepcionante quando se trata do saneamento básico: 39% da população mundial não tem acesso a ele.

A diretora de Saúde Pública e Meio Ambiente da OMS, María Neira, explicou à Agência Efe que a diferença no progresso alcançado nas duas áreas se deve, entre outros fatores, a "razões culturais e à falta de investimento" e "de colaboração entre os diferentes setores públicos envolvidos". "É preciso uma mudança cultural para que o saneamento seja considerado uma necessidade tão clara e tão óbvia como o é o acesso à água potável", acrescentou.

Segundo o estudo, os avanços foram diferentes de acordo com as regiões: um terço das pessoas que não têm acesso à água limpa vive na África Subsaariana, onde 40% da população sofre com essa situação. Já quase metade das pessoas que ganharam acesso à água desde o começo dos anos 90 está na Índia e na China.

Em relação ao saneamento, só metade da população dos países em desenvolvimento tem um banheiro, uma latrina ou um poço séptico de uso doméstico. Os maiores progressos nesse campo nos últimos anos foram registrados no norte da África e em regiões do leste e do sudeste da Ásia.

"Vale a pena chamar a atenção sobre algo que é tão óbvio que quase dá vergonha dizer isso em 2010. Sem água potável e saneamento básico, não há nenhuma base de saúde pública que possa se desenvolver. Se não acabarmos com essa situação, nunca vamos arrancar esses povoados da pobreza", disse Neira.

Desenvolvimento do Milênio

Segundo os resultados do relatório, o mundo alcançará o objetivo do Desenvolvimento do Milênio de cortar pela metade o número de pessoas sem acesso à água potável em 2015, mas fracassará em fazer o mesmo em relação aos serviços de saneamento.

A "boa notícia" é que a prática de defecar ao ar livre - considerada a mais perigosa do ponto de vista higiênico - está em declínio no mundo inteiro em termos percentuais, embora tenha aumentado em números absolutos. Se em 1990 era uma prática de 25% da população mundial, hoje essa taxa se situa em 17%.

Por outro lado, embora a população mundial esteja dividida quase em partes iguais entre rural e urbana, a grande maioria dos que não têm água potável nem saneamento está no campo.

O relatório mostra que as disparidades entre o campo e a cidade são particularmente visíveis em três regiões: América Latina e Caribe, sul da Ásia e Oceania.

As diferenças de gênero também ficam evidentes na questão do acesso à água limpa. Em dois terços das famílias que não têm água encanada em casa são as mulheres que vão buscar esse recurso em outros lugares.

"Muitas das mortes por diarreias que ocorrem a cada ano, além de outras doenças ligadas à falta de higiene, afetam mais as mulheres e as crianças porque são elas que dedicam horas a carregar água", explicou a diretora de Saúde Pública da OMS. Isso significa, acrescentou a especialista, que os menores não vão à escola e, inclusive, se expõem a violações e agressões quando têm que buscar água em áreas remotas.

Além disso, o relatório revela que a água não-potável e as práticas insalubres influenciam na morte de 1,5 milhão de crianças menores de 5 anos todos os anos.

Cidades no limite

O GLOBO, EDITORIAL, 7 de abril de 2009

A região metropolitana de São Paulo enfrentou no verão temporais semanas seguidas, e com regularidade de relógio.

Quase sempre no final da tarde, a enxurrada fez transbordar rios, paralisou as marginais do Tietê e Pinheiros, vias essenciais e já saturadas.

Medidos pela autoridade de trânsito, alguns engarrafamentos chegaram a somar 200 quilômetros, perto da metade da distância entre Rio e São Paulo.

Analistas políticos incluíram entre as vítimas das enchentes a popularidade do prefeito Gilberto Kassab (DEM) e até a imagem de administrador público edificada pelo governador tucano José Serra, candidato a presidente.

De tempos em tempos, assistem-se às cenas angustiantes de pessoas carregadas por um córrego em Belo Horizonte, o qual assume dimensões e ferocidade amazônicas quando chove forte na capital mineira — cercada de montanhas e, por isto, vulnerável a este tipo de “cabeça d'água”.

Casos graves de chuvaradas ocorrem também em Santa Catarina, e assim no Brasil afora. Cheias, desmoronamentos fazem parte da crônica de muitas regiões brasileiras. O Rio sequer é uma vítima inédita.

Lembremo-nos de pelo menos duas chuvas torrenciais na década de 60, no século passado, com incontáveis vítimas. Numa delas, a de 66, até um prédio de classe média desabou em Laranjeiras (General Glicério).

O bairro de Santa Teresa quase desceu pelas encostas. Superada a catástrofe, decidiu-se criar a GeoRio e fazer-se um amplo plano de contenção de encostas. Deu certo, tanto que existem áreas aparentemente bem assentadas até hoje.

Mas o problema de uma região costeira, ornada de montanhas, continua. E continua porque há causas estruturais — muitas provocadas pela miopia dos homens públicos — intocadas. Como existem também causas idênticas na região metropolitana de São Paulo e em muitas outras cidades do país.

O administrador público sempre tenta se escudar na magnitude das enxurradas. Em 24 horas, calcula-se, choveu no Rio o suficiente para encher 300 mil piscinas olímpicas.

Foi muito, mas não pode servir de pretexto para passar a borracha do esquecimento sobre tudo o que já se cometeu de errado na região metropolitana carioca, nada muito diferente dos equívocos verificados em São Paulo, Belo Horizonte etc: ocupação irregular de áreas de risco, baixo ou nenhum investimento na infraestrutura urbana em geral, com destaque para transporte de massa rápido, barato e seguro, para se dar exemplos.

Nessas horas, políticos apontam para a ocupação de áreas de risco. O presidente Lula, ontem no Rio, foi um deles.

Mas a favelização se deu e se dá devido a eles próprios, os políticos. No poder ou na oposição, costumam assumir posturas demagógicas de defensores dos “pobres sem teto”.

Que ficam, então, nas encostas cariocas, nas várzeas dos rios paulistanos.

Quando vem a água, é pedido para eles se retirarem, por segurança. É mais do que irônico — é cínico.

Esta enxurrada no Rio não é caso à parte das tragédias ocorridas em São Paulo e em outros centros urbanos brasileiros.

O país se urbanizou em alta velocidade, e o mesmo descaso com a moradia da população pobre verificado desde sempre não se alterou. Não se procurou combater a favelização, e ainda se demonizou o termo “remoção”.

E assim não se investiu em transporte eficiente de massa para ocupar áreas seguras distantes dos bairros que empregam a mão de obra menos qualificada.

São Paulo tem investido mais que o Rio de Janeiro em metrô e trens. Mas a região metropolitana da cidade parece correr à frente dos governos.

Numa visão mais ampla, é todo o Brasil cuja infraestrutura se mostra incapaz de atender à pressão do crescimento: aeroportos, estradas, ferrovias, portos, saneamento.

Claro que falta manutenção e limpeza de bueiros. Mas falta algo bem mais amplo: o Estado, direta e indiretamente — em parceria com o setor privado —, investir na sustentação das cidades, no transporte de pessoas e mercadorias, na efetiva melhoria da qualidade de vida dos brasileiros.

E deixar de gastar bilhões em despesas que não são em cimento, tijolo, asfalto. Amanhã ou depois, o sol retornará, e o risco é essas questões voltarem a ser esquecidas.