segunda-feira, 18 de julho de 2011

Do Senado às câmaras municipais, legislativo brasileiro dá mau exemplo de gastança

INSTITUTO AME CIDADE, 18 de julho de 2011


O site Congresso em Foco trouxe na semana passada uma reportagem muito reveladora sobre os gastos descontrolados do Senado. O assunto do site foi a verba indenizatória a que cada senador tem direito, com o centro da reportagem em cinco senadores que não usaram esta verba no primeiro semestre do ano: Cristovam Buarque (PDT-DF), Eduardo Braga (PMDB-AM), Eunício Oliveira (PMDB-CE), Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) e Pedro Simon (PMDB-RS).

A verba é um benefício anual de até R$ R$ 180 mil a que os parlamentares têm direito para cobrir despesas variadas, inclusive de consultoria e publicidade das atividades relacionadas ao mandato.

Perto do montante de gastos do Senado é uma verba até pequena, mas o ponto da discussão foi exatamente sobre a falta de necessidade de mais um gasto como este, com tanta estrutura e verbas já disponíveis para os senadores. Esta verba indenizatória vai ser incorporada ao chamado “cotão”, a Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar dos Senadores (Ceaps), criada agora pelo Senado.

A unificação foi feita para que cada senador fique responsável pela compra de suas passagens. Cada senador tem direito a R$ 6 mil em passagens aéreas por mês. A mudança seria para eliminar o uso de uma agência de turismo, que custa ao Senado anualmente R$ 22 milhões.

Apesar do alegado barateamento, o senador Cristovam Buarque acredita que isso pode criar uma confusão sobre um benefício que já não é bem visto pela sociedade de maneira geral. “Isso vai dar a impressão de que os senadores estão usando a verba da passagem em outras coisas”, acredita Cristovam.

Dos que não usaram a verba indenizatória, a melhor opinião é a do senador Pedro Simon. Ele não deixou de usar apenas nos primeiros seis meses deste ano. Simon jamais utilizou a verba, pois acredita que o Senado já oferece uma estrutura suficiente para o parlamentar exercer o mandato em sua plenitude.

“Estão unificando com a cota de passagens para obrigar todo mundo a usar”, reclamou Simon. Também é ótima sua explicação para nunca ter feito uso desse privilégio: “Acho ridículo um senador alugar um carro ou jantar num restaurante e depois mandar a conta para o Senado. O senador já ganha o dinheiro que tinha de ganhar”.

São impressionantes os privilégios de que gozam os parlamentares brasileiros. Em 2007 um estudo da organização Transparência Internacional revelou que o Congresso brasileiro é mais caro as representações de países muito mais ricos que o Brasil. Na época, o contribuinte brasileiro pagava mais para manter um mandato de senador ou deputado do que o contribuinte dos EUA, o país mais rico do mundo.

O estudo mostrava que os nossos senadores e deputados federais são os mais caros na comparação com seus colegas de sete outros países: Chile, México, Estados Unidos, Alemanha, França, Grã-Bretanha e Itália.

Os números são de 2007, mas diferença de cisto entre nossos parlamentares e os desses países deve ter aumentado bastante. Ao contrário do que ocorre no Brasil, preocupados com a crise os governos europeus têm feito cortes de despesas.

Em 2007 o orçamento do Congresso Nacional, contando a Câmara e o Senado, era de R$ 6,07 bilhões. Hoje este orçamento é de R$ 7,57 bilhões, ou seja, teve um aumento de 25%.

Hoje um senador ganha um salário mensal de R$ 26.723,13, com direito a 14º e 15º. Eles terão também um "cotão" de R$ 21 mil a até R$ 43 mil (sendo R$ 15 mil composto pela antiga verba indenizatória). O senador pode ter também um apartamento funcional em Brasília ou auxílio-moradia de R$ 3.800. Hoje, apenas 11 senadores não usam nenhum dos dois benefícios. O Senado também paga a conta telefônica, inclusive de casa, de R$ 500 até R$ 1 mil. O gasto de celular é ilimitado.

Cada senador tem direito também a um carro, 9 funcionários efetivos e 11 comissionados (6 com salário de R$ 8.000,00 e 5com salário de R$ 6.800,00). Todo senador tem também um plano familiar de saúde vitalício. O plano é extensivo à família do parlamentar.

Os parlamentares da ativa e seus familiares não têm limite de despesas com saúde: em 2008, gastaram cerca de R$ 7 milhões - R$ 80 mil por senador. Os senadores não descontam um tostão para ter todas as despesas de saúde pagas.

Os privilégios vêm num crescendo totalmente desavergonhado. Em 1995 o Senado tinha 81 senadores e 500 cargos comissionados. Hoje, os mesmos 81 senadores contam com um número de comissionados três vezes maior: 1500.


Gastos abusivos desprestigiam
o sistema legislativo e afetam a
credibilidade da atividade política

A gastança é altamente problemática pelos custos em si, mas pode-se acrescer a isso o desprestígio que causa ao Legislativo, o que é sempre preocupante num país que ainda tem tanto a construir socialmente, como é o caso do Brasil. O Legislativo aparece cada vez mais aos brasileiros como instituição que só significa custos elevados.

Mas o problema não para aí no Senado. Esses privilégios acabaram criando um efeito-cascata e vão descendo, passando pela Câmara Federal, atingindo as Assembléias Legislativas, para depois desembocar nas Câmaras Municipais. Todos acabam tirando seu quinhão do Estado.

Esses privilégios evidentemente acarretam custos que, no final, nada mais é que uma apropriação que os nossos parlamentares fazem de parcelas da renda nacional. E, seguindo o mau exemplo que vem de cima, até os vereadores se acham no direito de se apropriar de fatias cada vez maiores do orçamento municipal.

E como para esses custos não são criados tributos adicionais, é evidente que o dinheiro terá de sair de algum lugar entre as tantas áreas carentes de verbas nos municípios.

Cornélio Procópio tem sentido esse problema de forma bem destacada ultimamente, com os gastos em diárias de viagens de vereadores, que chegam a 70 mil reais por anos numa cidade de orçamento apertado, e também no recente aumento de salário que os vereadores deram para eles mesmos.

O salário de cada vereador, que era de R$ 2.900,00 líquido, teve um aumento de R$ 445,20. No total, serão R$ 48.081,60 de gastos a mais por ano.

Se for somado aos 70 mil reais de diárias de viagens, dá quase 120 mil reais de gasto anual. É fácil imaginar a diferença de qualidade que uma verba dessas faria numa escola ou num posto de saúde.

É o efeito da gastança que começa lá em cima, no Senado, e passa pela Câmara Federal e as assembléias legislativas, para continuar com os vereadores pelo país afora.