quarta-feira, 6 de outubro de 2010

No rescaldo do impasse na Ficha Limpa

O GLOBO, 6 de outubro de 2010


Apurados os votos, surgem em toda a dimensão os efeitos negativos do fato de o Supremo Tribunal Federal (STF) não ter sido capaz de superar o impasse causado pelo empate em cinco votos em torno da vigência da Lei da Ficha Limpa.

A primeira decorrência deletéria foi, no desdobramento da renúncia de Joaquim Roriz, cuja candidatura ao governo de Brasília era o tema em julgamento, o político haver colocado em seu lugar um candidato laranja, a mulher Weslian, sem qualquer preparo para disputar eleições. O que dirá assumir o cargo.

Mas o poder de Roriz de ordenhar votos em currais eleitorais levou-a a um segundo turno com o candidato petista, Agnelo Queiroz.

Nas eleições proporcionais é que os problemas são extensos. Um levantamento, ainda sem considerar o Acre, calcula em 8,6 milhões os votos colocados em suspenso, à espera da decisão final do STF. Na lista dos dependente do veredicto judicial estão dois candidatos a governo estadual, sete senadores, 42 deputados federais e 92 estaduais.

Há casos de puxadores de votos fichas-sujas cuja eliminação do pleito como se espera alterará a composição de casas legislativas. Como candidatos se elegeram com parte desses votos, eles também não poderão ser diplomados. Paulo Maluf (PPSP), ficha-suja notório, por exemplo, amealhou 497.203 votos, ajudando outros candidatos da legenda.

Situação idêntica à de Anthony Garotinho (PR-RJ), dono de 693.705 votos, todos sob risco de não serem contabilizados oficialmente.

A situação no Pará é única. Estão sub judice os candidatos ao Senado Jader Barbalho (PMDB) e Paulo Rocha (PT). A votação dos dois somou cerca de 3,5 milhões de votos, ou 57% do total. Assim, se mais da metade dos votos paraenses dados a concorrentes para o Senado for declarada nula, outro pleito terá de ser convocado.

Basta que saia vencedora no STF a tese de que a Ficha Limpa, por tratar de matéria constitucional a probidade do homem público , não se subordina à regra da anualidade exigida para alterações na legislação eleitoral. Além disso, argumenta-se, sequer a Ficha Limpa faz mudanças nesta legislação; apenas estabelece novos critérios para a sua aplicação.

A própria supressão dos votos dados aos fichas-sujas não é pacífica, pois há quem de-fenda que, conforme decisão anterior do STF, os partidos são os donos da expressão da vontade do eleitor. O voto é do partido, não do candidato. A ver.

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Ricardo Lewandowski, também ministro do Supremo, remeteu ontem ao STF o recurso do deputado Jader Barbalho à condenação pela Lei da Ficha Limpa. A mais alta Corte do país poderia se apressar para colocar o processo em julgamento, a maneira mais rápida de tentar romper o impasse, sem esperar a nomeação do 11oministro, depois do segundo turno.

E espera-se que todos reflitam sobre propostas colocadas em discussão no julgamento do caso Roriz. Uma delas, defendida pelo próprio Lewandowski, com apoio no regimento interno da Corte, a da proclamação do veredicto anterior (TSE), a favor da vigência imediata da lei, caso ocorra novo empate.

Tribunal de Justiça afasta vereadores em Dourados

G1, 6 de outubro de 2010

Políticos foram denunciados pelo Ministério Público por corrupção e fraudes. Parlamentares afastados vão seguir recendo o salário mensal

O Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul (MS) determinou, nesta terça-feira (5), que sete vereadores da cidade de Dourados sejam afastados do cargo. Os políticos foram denunciados pelo Ministério Público por corrupção e fraudes em licitações.

A assessoria da Câmara afirmou que a Casa ainda não havia sido notificada da decisão até o final desta tarde, e que não sabia informar o motivo dos afastamentos.

Os vereadores foram presos no começo de setembro, juntamente com prefeito da cidade, o vice, o procurador-geral do município e quatro secretários. Segundo a assessoria da Câmara, a presidente da Casa, Délia Razuk (PMDB), mesmo sem ter sido notificada, já se reuniu com o procurador-jurídico da Casa para discutir a substituição dos vereadores. Os suplentes devem ser chamados para assumir os cargos ainda nesta quarta-feira (6).

Ainda conforme a assessoria, o tempo de afastamento deve ser de 90 dias. Durante este período, os vereadores afastados vão seguir recebendo o salário mensal. O prefeito, o vice e outros quatro vereadores continuam presos. A cidade tem sido administrada interinamente por um juiz de direito.

Candidato tucano reforça articulação nos Estados

O ESTADO DE S. PAULO, 6 de outubro de 2010

Bornhausen e Aloysio formam trio com Guerra; campanha intensifica contato com grupos religiosos e foca no eleitor que migrou para Marina

Na primeira reunião ampliada do segundo turno, o presidenciável do PSDB, José Serra, escalou uma trinca de aliados para reforçar a articulação política nos Estados. Também ficou definido que a campanha tucana intensificará o contato com grupos religiosos cristãos e focará no eleitor de classe média que migrou, na primeira fase da eleição, para Marina Silva (PV).

Num encontro no comitê do PSDB, em São Paulo, Serra convidou o presidente de honra do DEM, Jorge Bornhausen, para formar um trio com o senador eleito por São Paulo, Aloysio Nunes Ferreira, e com o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), atual coordenador político da campanha. No primeiro turno, a função ficou exclusivamente nas mãos de Guerra, o que sobrecarregou o senador e levantou críticas de aliados que não se sentiram contemplados.

"A ideia é somar e não tirar o lugar de ninguém. Cada um terá uma função. Vamos dividir o trabalho", disse Bornhausen. Ele contou que hoje, após o evento de campanha em Brasília que dará partida ao segundo turno, ele, Aloysio e Guerra vão ajustar as linhas de trabalho de cada um.

Na véspera do encontro no comitê, um núcleo menor de aliados de Serra se encontrou no Palácio dos Bandeirantes para jantar e definir as linhas gerais do segundo turno. Participaram o governador Alberto Goldman (PSDB) e o prefeito Gilberto Kassab (DEM), entre outros.

O governador eleito por São Paulo, Geraldo Alckmin, também entrará na costura política. Ontem, ele conversou com Marina Silva e defendeu a parceria com o PV no Estado. Questionado sobre a participação dos verdes em seu futuro governo, disse: "Isso só em novembro."

Alckmin também entrou em contato com aliados em oito Estados como Piauí, Acre, Santa Catarina e Pará. Ele defende uma investida principalmente nos locais em que Serra perdeu.

O comando da campanha também articula a maior aproximação com os grupos religiosos, principalmente entre os evangélicos e carismáticos - os votos desses setores em Marina foram decisivos para empurrar a disputa para o segundo turno. O PSDB quer evitar que a campanha petista consiga reverter a tendência de queda entre esses segmentos.

O presidente do PTB paulista, Campos Machado, disse que organizará um encontro religioso em São Paulo para cerca de 3 mil pessoas. "Temos contatos com 30 templos evangélicos. Será uma campanha do bem contra o mal", declarou o líder petebista.

Questionado sobre o assunto, o presidenciável se esquivou. "Não houve uma articulação específica sobre isso. Mas se tivesse eu também não falaria."

De acordo com participantes da reunião de ontem, Serra passará a partir de agora a receber representantes de vários Estados, o que aconteceu com pouca frequência no primeiro turno. Ontem conversou com políticos de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul e do Rio Grande do Norte, neste caso, por telefone.

Bornhausen disse que o presidenciável pediu empenho do governador eleito de Santa Catarina, Raimundo Colombo (DEM), e dos senadores eleitos pelo Estado, Paulo Bauer (PSDB) e Luiz Henrique (PMDB).

No encontro ficou acertada a ida de Serra ao Estado no próximo sábado. O tucano venceu a eleição em Santa Catarina com vantagem de 200 mil votos em relação a Dilma Rousseff (PT). A meta agora é fazer frente de pelo menos 1 milhão de votos.

Serra insinua que adversária petista finge otimismo

ESTADÃO ONLINE, 6 de outubro de 2010

Tucano considera que Dilma está pessimista após ver frustrada a vitória no 1º turno, como indicavam pesquisas

O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, insinuou ontem que Dilma Rousseff (PT) demonstra abatimento por não ter vencido a eleição no primeiro turno, como apontavam as pesquisas. "Tenho experiência política e sei quando um político está pessimista e está fingindo ser otimista. A gente percebe na hora, nos olhos", afirmou Serra, em clara referência a Dilma.

Questionado se estava se referindo à candidata, ele sorriu e disse que não falaria sobre a campanha petista, mas apenas da sua própria.

Em uma clara demonstração de afago aos aliados, Serra participou à noite de reunião no comitê tucano na capital paulista com articuladores políticos e candidatos eleitos em Santa Catarina - o governador Raimundo Colombo (DEM), o vice, Eduardo Pinho Moreira (PMDB), e os senadores Luiz Henrique Silveira (PMDB) e Paulo Bauer (PSDB) -, além do deputado Paulo Bornhausen (DEM) e do ex-senador Jorge Bornhausen (DEM).

"Nós nos encontramos agora com os vitoriosos de Santa Catarina, todos eleitos agora com uma grande vantagem e uma grande votação, aliás, em um Estado em que eu também cheguei na frente", afirmou.

Embora a maioria dos deputados e senadores eleitos no dia 3 faça parte da base do governo, Serra insistiu que será capaz de formar maioria no Congresso. "Nós pensamos em governar o Brasil com um governo forte, de maioria. Temos todas as condições para fazer dessa maneira, e eu tenho experiência nessa área", afirmou. "Sempre contei com maioria política para levar adiante os projetos fundamentais do Brasil, do meu Estado e da minha cidade", disse. "É muito importante termos a certeza e a determinação de formarmos um governo de maioria no Brasil, um governo que some com base em propostas, projeto, e que some no Brasil inteiro e em todas as regiões."

Serra disse que fará um "governo de soma, não de divisão entre os brasileiros e brasileiras".

Rumos. O tucano afirmou que se encontrará hoje em Brasília com governadores, senadores e deputados eleitos no domingo. De acordo com ele, o objetivo será discutir os rumos da campanha no segundo turno. "De alguma maneira vou ouvir, além de dizer, claro, o que estou pensando. Mas é tudo cobra criada, gente experiente, com muita trajetória política e eleitoral. Não vou ensinar ninguém. Vamos é compartilhar análises e propósitos."

Colombo e Silveira disseram que vão se dedicar inteiramente à campanha de Serra. "Viemos trazer nosso apoio, renovar nossa admiração e nosso desejo de ajudar. Todo nosso time vai trabalhar o dobro porque temos certeza de que estaremos ajudando o Brasil a ser cada vez melhor. Serra é, com clareza, o melhor para o Brasil e estamos prontos para lutar firme e construir essa grande vitória", disse Colombo.

"O Serra falou em otimismo e temos todas as razões para estarmos otimistas", afirmou Silveira. De acordo com ele, a oposição ao governo Lula elegeu 25 dos 40 deputados estaduais, 10 dos 16 deputados federais e os 2 senadores. "Vamos disponibilizar toda a nossa força política para elevar, e muito, a diferença com que José Serra venceu em Santa Catarina."

Produção industrial do Paraná tem a maior queda do país em agosto

G1, 6 de outubro de 2010

O índice do estado recuou 7,2% em relação ao mês anterior. No período, a queda geral registrada, considerando todas as regiões, foi de 0,1%06/10/2010 09:25

A produção industrial teve queda em 9 das 14 regiões pesquisadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em agosto, descontadas as influências sazonais. De acordo com levantamento divulgado nesta quarta-feira (6), o Paraná apresentou o maior recuo, de 7,2%. No período, a queda geral registrada, considerando todas as regiões, foi de 0,1%.

No período, tiveram baixas acima da média nacional Goiás, com recuo de 4,8%, Rio Grande do Sul, com queda de 4,3%, Pernambuco, com diminuição de 4%, Amazonas, com retração de 3%. Região Nordeste também ficou acima da média, com queda de 1,9%, seguida por Bahia, recuo de 1,7%, e Espírito Santo, retração de 1,1%. Já Minas Gerais registrou o mesmo resultado da produção industrial geral.

Por outro lado, em agosto, a produção industrial cresceu no Pará (2,4%), Rio de Janeiro (1,6%), São Paulo (1,3%), Ceará (0,8%) e Santa Catarina (0,1%).

Patrimônio de parlamentares é, em média, de R$ 2,4 milhões

ESTADÃO ONLINE, 6 de outubro de 2010


As declarações de bens entregues à Justiça Eleitoral pelos 513 deputados federais eleitos no domingo mostram que o parlamentar brasileiro tem, em média, um patrimônio de R$ 2,4 milhões. A fortuna acumulada pelos representantes do povo na Câmara soma R$ 1,23 bilhão.

Levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo na base de dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) revela ainda que 194 deputados têm patrimônio superior a R$ 1 milhão. A bancada dos milionários representa 37,8% do total da Câmara e é superior à soma das cadeiras obtidas pelo PT (88) e o PMDB (79), os partidos com a maior representação no parlamento.

Levando-se em consideração que o rendimento médio do trabalhador brasileiro é de R$ 1.472,10, de acordo com a última Pesquisa Mensal de Emprego divulgada no dia 23 pelo Instituto Brasileiro de Geografia de Estatística (IBGE), seriam necessários mais de 125 anos para que um assalariado conseguisse somar recursos suficientes para se equiparar à fortuna média dos parlamentares - isso se não gastasse nada de seu salário ao longo desse tempo.

A maior parte dos 513 deputados registrou atividades políticas como principal ocupação ao fazer o registro de candidatura na Justiça Eleitoral. São 271 deputados, 12 vereadores e três senadores. Ou seja, os políticos profissionais representam 55,7% do parlamento. O total de empresários eleitos chega a 36. Advogados são 24 e médicos, 22. E há representantes, na Câmara, de outras 34 atividades profissionais.

O deputado federal mais rico, de acordo com os dados do TSE, é o usineiro João Lyra (PTB-AL). Seu patrimônio declarado é de R$ 240,4 milhões. Apenas a sua Usina Laginha Agroindustrial é avaliada em R$ 196 milhões. Em segundo lugar, bem distante, está o industrial Alfredo Kaefer (PSDB-PR), com R$ 95,7 milhões. O pódio dos milionários é completado pelo veterano político e empresário mineiro Newton Cardoso (PMDB-MG), com R$ 77,9 milhões.

Lula determina guinada na campanha de Dilma, que vai explorar privatizações

FOLHA DE S. PAULO, 6 de outubro de 2010


O presidente Lula e os governadores eleitos cobraram ajustes na estratégia de campanha de Dilma Rousseff (PT) no segundo turno. Uma delas é explorar o tema privatizações nos programas de TV, numa reedição do que foi feito em 2006.

Outra orientação foi tirar a agenda religiosa, incluindo a polêmica do aborto, imediatamente do foco da campanha, e usar os programas de TV para comparar os projetos de governo petista e tucano.

Acatando críticas dos governadores eleitos, Lula determinou que Dilma se aproxime mais das pessoas e da imprensa, acabando com o tom cerimonial e com o cerco de segurança de suas viagens e entrevistas.

Durante reunião com governadores eleitos, ontem no Alvorada, Lula disse que a campanha de Dilma tem de enfrentar a polêmica do aborto, mas não pode deixar que o tema domine o segundo turno, fazendo o jogo que interessa a José Serra.

"FROUXIDÃO MORAL"

O deputado federal Ciro Gomes (PSB-CE) foi anunciando como um dos novos coordenadores da campanha, para a região Nordeste.

Logo na estreia, Ciro fez críticas indiretas aos recentes escândalos de irregularidades no governo, como a demissão de Erenice Guerra e a quebra de sigilo fiscal de pessoas ligadas ao PSDB.

Ele disse que os eleitores que apoiaram Marina Silva (PV) no primeiro turno estão preocupados com a "frouxidão moral" demonstrada "aqui e ali" e que a ida de Dilma ao segundo turno foi uma "lição de humildade".

O deputado teve sua pré-candidatura abortada pelo PSB no início do ano, por pressão de Lula. Na ocasião, ele disse que Serra era mais preparado do que Dilma e chamou o PMDB de "ajuntamento de assaltantes".

Outras mudanças foram notadas na entrevista de Dilma. A candidata inaugurou a prática de falar em meio à aglomeração dos repórteres. O objetivo é passar para as TVs imagem menos formal.

Outra foi o tom de sua fala. Disse que o governo Lula também atendeu à classe média e frisou que sua campanha irá explorar as comparações na área social e o viés privatizante do PSDB.

"Nosso objetivo principal é deixar cada vez mais claro que se trata do confronto entre dois projetos. Um projeto é necessariamente uma volta ao passado", afirmou.

"Sem dúvida a gente tem que comparar a questão das privatizações. E o tratamento que eles deram à Petrobras, quando tiraram até o que é mais brasileiros, que é o 'bras', e tentaram colocar o 'brax'", disse, se referindo a ideia de 2000 de trocar o nome para "PetroBrax".

Dilma falou rapidamente sobre a polêmica em torno do aborto. Limitou-se apenas a dizer que defende a vida.

"Passei por uma experiência espiritual muito forte, que foi o nascimento do meu neto."

Programa coordenado por Dilma não atinge meta e é prorrogado

FOLHA DE S. PAULO, 6 de outubro de 2010


Coordenado pela então ministra de Minas e Energia, hoje candidata à sucessão presidencial pelo PT, Dilma Rousseff, o programa Luz Para Todos foi prorrogado nesta quarta-feira, por decreto, por não ter atingido sua meta, conforme a Folha antecipou em março.

O Luz Para Todos foi criado em 2003 com a promessa de universalizar o acesso à luz elétrica nas comunidades rurais. O cronograma original era que o programa duraria de 2003 a 2015. Mas logo depois do lançamento, o governo antecipou a meta para 2008. Não conseguiu cumpri-la. O prazo então foi esticado para 2010 e, mais uma vez, precisou ser prorrogado.

No Diário Oficial das União desta quarta-feira, o governo justifica que o prazo passou para 31 de dezembro de 2011 "com o objetivo de garantir a finalização das ligações destinadas ao atendimento em energia elétrica que tenham sido contratadas ou estejam em processo de contratação até 30 de outubro de 2010."

Quando teve a ideia de lançar Dilma sua candidata à sucessão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva passou a chamá-la país afora de "mãe" do programa, assim como o faz em relação ao PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

PV definirá em 17 de outubro apoio no segundo turno

G1, 6 de outubro de 2010


Movimento Marina Silva, intelectuais e religiosos terão direito a voto.
Candidata teve 19% dos votos no 1º turno. Apoio é disputado por PT e PSDB.



O PV divulgou nesta quarta-feira (6), em São Paulo, que fará uma convenção no dia 17 de outubro, a duas semanas da votação do segundo turno, para deliberar sobre a posição do partido na disputa presidencial: se apoia Dilma Rousseff (PT) ou José Serra (PSDB).

A convenção será em São Paulo, em local ainda não definido. De acordo com o coordenador da campanha de Marina, João Paulo Capobianco, a decisão será tomada por cerca de 90 delegados com direito a voto na convenção.

O grupo dos delegados será formado por 15 pessoas de fora do partido (Movimento Marina Silva, intelectuais e religiosos), por toda a executiva nacional (composta por cerca de 40 dirigentes), por candidatos ao Senado e ao governo pelo PV (mesmo os que não conseguiram vaga) e também por deputados federais eleitos.

Segundo o coordenador da campanha de Marina, o nome de todos os delegados, incluindo as pessoas de fora do partido, ainda serão divulgados. Questionado se todas as religiões teriam representantes, o presidente nacional da legenda e deputado federal eleito por São Paulo, José Luiz Penna, afirmou: "Terá evangélicos, católicos (...). Temos uma política clara contra intolerância religiosa. Temos a espiritualidade como postura", disse.

Nesta quarta (6), o PV convidou jornalistas para explicar como será definido o apoio no segundo turno. Além de Penna e Capobianco, participou também o vereador e deputado federal eleito pelo Rio, Alfredo Sirkis, que coordenou a campanha de Marina antes da oficialização da candidatura.

De acordo com Sirkis, há três posições que podem ser definidas na convenção: apoio à ex-ministra Dilma, apoio ao ex-governador Serra ou a "não participação no processo eleitoral".

"No primeiro turno, você vota no seu candidato do coração. No segundo turno, escolhe por exclusão. Pode haver, com razão, a decisão de não escolher nenhum dos dois", disse.

"Participar do segundo turno não significa aderir a um lado ou outro. Nós podemos chegar a um resultado sem nenhuma aliança. Aliança com um projeto e não com um candidato", completou Capobianco.'

Os dirigentes, no entanto, rejeitaram a palavra neutralidade. "Voto neutro jamais defendemos, podemos dizer voto independente. (...) A participação será ativa. Apoiando programa e defendendo que explicitem as propostas aos 20 milhões que votaram em Marina", disse Capobianco. Questionado se a rejeição à palavra neutralidade era apenas semântica, ele completou: "será uma postura independente. Pode se elogiar um candidato pelo programa sem aderir. Apoio gera apoio formal", disse.

Penna explicou que será possível que militantes e dirigentes discordem da posição adotada na convenção. No entanto, não poderão usar símbolos do partido ao se manifestar e terão de deixar claro que se trata de opinião pessoal.

Marina Silva disse nesta quarta, em entrevista à rádio Jovem Pan, que a decisão do PV sobre qual candidato apoiar não será unânime. "Em um partido como o PV não tem como imaginar, até pela diversidade que temos, ter um processo unânime, único", disse.

Ela obteve 19.636.359 votos no primeiro turno, o equivalente a 19,33% dos votos válidos, e ficou em terceiro lugar na disputa. Já foi procurada por PT e PSDB, que consideram importante um eventual apoio da candidata do PV.

Propostas - Alfredo Sirkis afirmou que, antes de definição do apoio, o PV pedirá que os candidatos a presidente incorporem as propostas de Marina, mas não haverá exigência de que se incorpore tudo. "Não é ame-o ou deixe-o. Não é faca no pescoço. (...) Evidentemente que vão ter que incorporar grande parte do programa e julgaremos o teor das discussões."

Ele disse que os dois candidatos do segundo turno "não têm programa de governo", em referência ao fato de Serra ter protocolado discursos no lugar do programa e de Dilma ter apresentado um documento do PT e depois substituído o documento por outro sem os pontos polêmicos.

Penna disse que o objetivo é que haja um aproveitamento das propostas. "Fizemos 36 [deputados] estaduais, 15 [deputados] federais. É um momento maravilhoso. Queremos aproveitar o prestígio das urnas no futuro programa de governo dos candidatos."

'Incoerência' - Questionado se será uma incoerência caso o PV apoie um dos dois candidatos, já que Marina disse durante a campanha do primeiro turno que os dois eram iguais, o presidente nacional da legenda respondeu: "Não é só no Brasil. Internacionalmente, também buscamos alianças no campo da social-democracia e [PT e PSDB] são dois campos da social-democracia. [Definir por um ou por outro] não causaria estranheza. (...) Marina reconheceu publicamente os avanços dos 16 anos da social-democracia, tanto do governo FHC quanto do governo Lula."

Os dirigentes também não quiseram responder se terão cargos em um eventual governo, caso decidam pelo apoio a um dos dois candiatos. "Discussão de governo é posterior ao segundo turno. Somos políticos, não futurólogos", disse Sirkis. Ele também evitou dizer se o PV espera que Marina volte a se candidatar em 2014: "2014? A nossa capacidade de especular não vai tão longe."


O Congresso de 2011

O ESTADO DE S. PAULO, 6 de outubro de 2010


O presidente Lula impediu o seu partido de apresentar candidatos próprios a governos estaduais - Minas Gerais foi o exemplo mais notório - onde isso dificultaria a construção de alianças em torno da candidatura Dilma Rousseff. Mas, no cômputo geral, a restrição não afetou o desempenho da legenda nas eleições para a Câmara dos Deputados e o Senado. No primeiro caso, ao conquistar 88 cadeiras e com o PMDB perdendo 10, o PT terá a partir de 2011 a maior bancada da Casa. No segundo, em que estavam em jogo 2/3 das 81 vagas, a sua representação passou de 8 para 15 membros.

Os ganhos petistas se inscrevem numa contabilidade ainda mais favorável para o lulismo. Se Dilma se eleger, terá no Congresso uma formidável maioria. Se o eleito for Serra, terá de comer pelas bordas esse contingente, com os talheres de sempre, a fim de neutralizar a inevitável tentativa do PT de impedi-lo de governar. Os números impressionam. Na Câmara, onde se registrou o menor índice de renovação desde 1998, a frente lulista integrada por 10 agremiações somará 311 cadeiras em 513. Para a aprovação de reformas constitucionais são necessários 308 votos.

Já os votos amealhados pelos 6 partidos da coligação serrista se traduzirão em não mais de 136 lugares. As siglas dos 66 restantes não apoiaram nenhum dos finalistas da corrida ao Planalto. Para se ter ideia do baque sofrido pela oposição, PSDB, DEM e PPS perderam ao todo 45 cadeiras. A rigor, as urnas de domingo não criaram uma nova relação de forças na Câmara: acentuaram o quadro existente. Já a qualidade do novo corpo legislativo pode ser medida pela chegada do palhaço Tiririca, com seu 1,3 milhão de votos, e a saída de políticos como os tucanos Arnaldo Madeira e Ricardo Montoro e o petista José Genoino.

A mudança mais significativa se deu no Senado - onde a presença oposicionista funciona como contrapeso ao controle absoluto do Congresso pelo governo. Ali caiu o projeto de prorrogação da CPMF e ali decerto teria caído, caso se materializasse, a emenda constitucional para propiciar a Lula um terceiro mandato. Mas a nova conformação da Casa dará a uma eventual presidente Dilma a supremacia com que o seu criador apenas podia sonhar. Os partidos da base lulista ficaram com 40 das 54 vagas em disputa, ao passo que o bloco PSDB-DEM perdeu 11 das 28 cadeiras que detinha no início da atual legislatura. Na próxima, com 73% dos lugares - índice igual ao da nova Câmara -, o Planalto será o dono do jogo no Senado, na hipótese de vitória de Dilma.

A captura do Senado terá tido para Lula um sabor quase tão adocicado quanto o da vingança bem-sucedida contra os seus mais acerbos adversários ali - os tucanos Tasso Jereissati, do Ceará, e Arthur Virgílio, do Amazonas. Um foi presidente do PSDB. O outro era líder da legenda na Casa. Lula nunca escondeu que o seu grande desejo, na frente legislativa da batalha eleitoral, era vê-los decapitados. Juntamente com eles, saem os demistas Heráclito Fortes, do Piauí, e Marco Maciel, de Pernambuco - este último provavelmente a maior perda singular sofrida pelo Congresso. De todo modo, o Senado passará a contar, de ambos os lados do corredor, com uma leva de políticos experientes, conhecidos antes pela moderação do que pela beligerância.

O primeiro deles, evidentemente, é o ex-governador mineiro Aécio Neves, do PSDB, o grande vitorioso do 3 de outubro na esfera estadual - elegeu sucessor o seu vice Antonio Anastasia e, para o Senado, o ex-presidente Itamar Franco. Ex-presidente da Câmara dos Deputados, Aécio poderá ocupar o mesmo cargo no Senado. Já a principal voz da oposição dificilmente deixará de ser a do tucano Aloysio Nunes Ferreira, em quem votaram 11,2 milhões de paulistas - um recorde no Estado - contrariando as pesquisas que o situavam em terceiro lugar, depois de Marta Suplicy e Netinho de Paula. Aloysio se distinguiu também por ser o único candidato que não teve medo de exibir no horário eleitoral o apoio do ex-presidente Fernando Henrique.

O Senado renovou-se mais do que a Câmara - uma boa notícia, considerando o retrospecto. O perigo é, se eleita, Dilma valer-se de sua maioria para aplastar a oposição nas duas Casas.

Sem intervalo

O GLOBO, Merval Pereira, 6 de agosto de 2010


Há duas informações contraditórias no noticiário sobre a campanha do segundo turno da candidata Dilma Rousseff: ou bem o tom "Paz e amor" vai prevalecer ou bem o deputado Ciro Gomes vai fazer parte da coordenação política da campanha. As duas coisas não combinam.

O mais provável é que nenhuma das duas aconteça. A maioria dos governadores quer que Lula participe da campanha, mas tire o dedo do gatilho da metralhadora giratória, onde ele o repousou no último mês de campanha.

Querem a volta da criação imortal de Duda Mendonça, que levou Lula à Presidência da República e à qual ele retorna sempre que vê escapando uma vitória pressentida ou que se mete em uma enrascada pelo rancor que guarda no peito.

Apesar de todas as glórias, locais e internacionais, Lula não se sente confortável neste mundo que não lhe dá uma aprovação unânime.

Talvez seja o caso para um psicanalista, mas o fato é que ele não se contenta com menos do que a unanimidade burra identificada por Nelson Rodrigues.

Foi assim também em 2006, quando foi para o segundo turno contra o tucano Geraldo Alckmin. Ficou nada menos que 15 horas desaparecido, curtindo sua mágoa, imprecando contra os seus "aloprados" e também contra o "picolé de chuchu" que ousou enfrentá-lo quase de igual para igual.

Quando se acalmou, reassumiu o papel de "Lulinha Paz e Amor" e fez uma campanha de segundo turno irretocável, colocando no corner seu adversário.

É claro que Dilma não é Lula, e Serra não é Alckmin, e o país é outro hoje em dia. Ficará mais difícil levar a campanha do segundo turno para o campo ideológico, como querem alguns dentro da campanha.

A polêmica sobre o aborto, que retirou de Dilma boa parcela de votos, é uma demonstração de que a nova classe média criada no governo Lula, conservadora como já havia registrado o cientista político André Singer, ex-porta-voz de Lula, não gosta de marolas.

O interessante é que Mangabeira Unger, o professor de Harvard que já foi ministro do governo Lula e foi o estopim para a saída de Marina Silva do Ministério, ao receber de Lula e Dilma a incumbência de cuidar das questões ambientais na Amazônia com um olhar desenvolvimentista, desenvolveu a tese de que os evangélicos brasileiros tinham semelhança com os pioneiros que fundaram os Estados Unidos e tinham o espírito empreendedor que faria a diferença para o desenvolvimento do Brasil.

Esse grupo, e mais os católicos, ao que tudo indica reagiu contra posições ambíguas da candidata Dilma sobre a legalização do aborto, e o debate continua pela internet.

Outras contradições da candidata oficial serão exploradas durante este segundo turno da campanha. Mas uma coisa é inegável: mais uma vez a campanha do PT saiu na frente em organização.

Um exemplo claro disso foi o aproveitamento que Dilma Rousseff fez do bloco de reportagens do programa "Fantástico", da Rede Globo, marcando seu pronunciamento para um horário em que pôde entrar ao vivo na maior audiência do domingo.

O candidato Serra simplesmente não foi encontrado e só foi fazer seu pronunciamento perto da meia-noite.

Outra demonstração de organização foi a convocação dos governadores eleitos e demais aliados para uma reunião em Brasília, já levando em consideração os programas eleitorais do segundo turno, que começam na sexta-feira.

Serra só reunirá seus aliados hoje.

Uma coisa houve de bom para a campanha de Serra. Ele não repetiu o erro de Alckmin, que suspendeu a campanha entre o primeiro e o segundo turno por uma semana, freando todo o embalo que o levou a ter 42% dos votos no primeiro turno.

E, em vez de receber o apoio de Garotinho em primeiro lugar, como fez Alckmin em 2006, Serra desta vez recebeu o apoio de Fernando Gabeira, o que faz toda a diferença.

As duas campanhas estão se movimentando nos bastidores para conseguir o apoio de Marina Silva e de seu Partido Verde, e a missão é tão importante que os principais líderes do PT e do PSDB estão capitaneando os esforços de aproximação.

O presidente Lula e seu principal adversário, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, estão mais uma vez disputando esse lance político, numa demonstração de que a candidatura de Marina Silva teve o condão de quebrar a polarização entre os dois partidos.

Embora sejam eles que disputam o segundo turno, o protagonismo está com Marina Silva, mais do que com o Partido Verde.

Ninguém sabe exatamente a composição desses quase 20 milhões de brasileiros que escolheram Marina mesmo sabendo que ela não tinha chance de chegar ao segundo turno.

Foram eleitores que quiseram demonstrar sua insatisfação com a dualidade proposta, como sempre Marina salientou nos debates.

Como terão que decidir quem escolher no segundo turno, não é provável que aguardem uma orientação de Marina, nem que ela pretenda ser a guia genial desses eleitores.

As motivações do voto em Marina parecem ser bastante variadas, e cada grupo escolherá o candidato(a) que sobrou, ou escolherá não escolher, de maneira mais independente do que normalmente acontece.

Os petistas desiludidos provavelmente voltarão ao seio do partido, mas eles ao que tudo indica são a menor parte desse contingente, que, também pelas primeiras análises, não é nada parecido com os eleitores que em 2006 escolheram Cristovam Buarque e Heloisa Helena no primeiro turno e depois desembarcaram na candidatura de Lula em peso.

Os eleitores de Marina parecem ser menos ideológicos, assim como ela. Compromissos com uma visão mais abrangente da questão do meio ambiente dentro do projeto de desenvolvimento do país devem ser mais eficazes para uma boa parte desses eleitores.

O que esperar de Dilma e Serra

VALOR ECONÔMICO, Eliana Cardoso, 6 de agosto de 2010


A campanha presidencial foi marcada, até agora, pela ausência de debate em torno de questões concretas. Os candidatos temem se posicionar sobre temas considerados impopulares, como reforma da Previdência, privatizações e controle de gastos. Parte desse temor resulta da falsa ideia de que defender essas bandeiras tira voto. Na disputa do segundo turno, a tendência é que Dilma Rousseff e José Serra sejam confrontados com assuntos que passaram ao largo da campanha.

Como os dois candidatos não expuseram claramente o que pretendem fazer a partir de 1º de janeiro, resta aos observadores avaliar o que eles disseram sobre os vários temas no passado. Melhor ainda é ver o que fizeram.

No primeiro mandato do presidente Lula, Dilma disputou o modelo macroeconômico baseado na geração de superávits primários nas contas públicas, no regime de metas para inflação e no sistema de câmbio flutuante. Em 2003, chegou a sugerir a adoção de um rumo alternativo, mas, provocada por Lula, nunca apresentou uma proposta. Ascendendo ao posto de ministra da Casa Civil em 2005, tornou-se mais pragmática, passando a conviver melhor com o modelo vigente. Mesmo em conversas reservadas, quando pôde expor com mais liberdade suas opiniões, defendeu o tripé de política econômica, inclusive, a autonomia operacional do Banco Central (BC).

Seja quem vencer, política fiscal deve voltar a ser a âncora

Questionada certa vez sobre as inamovíveis críticas do PT ao tripé, a então ministra concedeu: "O partido tem o direito de criticar". Foi o reconhecimento de que, apesar do sucesso do governo Lula, seu partido jamais vai se conciliar com o ideário econômico herdado de Fernando Henrique Cardoso.

Há na sociedade, entretanto, dúvidas quanto ao compromisso firme da candidata com o modelo consagrado por Lula. Não se deve nunca descartar a possibilidade de um presidente eleito, com todo o poder que o cargo encerra no regime presidencialista brasileiro, escolher as políticas que considera mais adequadas para seu governo. Os sinais dados por Dilma não autorizam, porém, a expectativa de ruptura.

Antes mesmo do início da campanha oficial, a candidata anunciou que, se for eleita, reduzirá a dívida líquida do setor público para 30% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2014 - em agosto, essa dívida estava em 41,4% do PIB. Dilma acredita que, se fazer isso, criará as condições para a taxa de juros brasileira convergir para padrões internacionais.

Para atingir a meta anunciada, União, Estados e municípios terão que apertar o cinto, produzindo, nos próximos quatro anos, superávit primário em torno de 3,3% a 3,5% do PIB ao ano. O compromisso com redução da dívida, em vez de com uma meta de superávit primário, é politicamente mais palatável, embora, na prática, produza o mesmo resultado. Para chegar lá, o governo terá que segurar os gastos correntes, principalmente, as despesas com pessoal, que saíram do controle no segundo mandato de Lula.

Há razões para acreditar na promessa de Dilma? Novamente, é preciso recorrer aos sinais, mais do que ao discurso. Quando se observa o núcleo da campanha petista, o que se vê é um triunvirato de políticos da ala moderada do PT - Antônio Palocci, José Eduardo Dutra e José Eduardo Cardozo. Palocci dispensa apresentações; Dutra é uma liderança de fora de São Paulo que, quando passou pelo Senado, se notabilizou pela moderação; Cardozo é um expoente da tendência "Mensagem ao Partido", que, depois do mensalão, chegou a defender a refundação do PT.

O candidato José Serra critica desde sempre não o tripé da política econômica, mas a sua execução, particularmente, no governo Lula. Acha que o BC erra para cima na condução da política de juros e que isso ajuda a distorcer o câmbio, valorizando excessivamente o real, o que, por sua vez, prejudica a competitividade da indústria nacional. É um crítico ácido também da gastança promovida em Brasília, outro elemento que, em última instância, leva a juros altos e câmbio apreciado.

A exemplo do PT, Serra defende, portanto, a mudança do tripé de política econômica? Não se pode fazer essa afirmação. Sua trajetória em São Paulo mostra que ele é um gestor austero. Em seus três anos de gestão, controlou a evolução dos gastos correntes, liberando recursos para aumentar a capacidade de investimento em infraestrutura - num dado momento, São Paulo, quando comparados apenas os orçamentos fiscais (sem incluir a estatais), investiu mais do que o governo federal com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

O segredo de Serra pode estar justamente na área fiscal. O tripé prescinde do equilíbrio entre as políticas. Uma política fiscal mais restrita cria espaço para a queda dos juros e a desvalorização do real. O candidato tucano reiterou que manterá o modelo, logo, a mudança real que ele pretende fazer está na área fiscal. Se produzir um ajuste além do que vem sugerindo sua oponente na disputa presidencial, Serra teria condições de colocar juros e câmbio nos lugares certos. É esta a expectativa de seus apoiadores.

Na campanha, no entanto, Serra tem feito promessas, como o aumento do salário mínimo para R$ 600, o reajuste de 10% para aposentados, a restauração da aposentadoria integral dos funcionários e a concessão de 13º salário aos beneficiários do Bolsa Família, que, ao fim e ao cabo, arruinariam as contas públicas de uma vez por todas. Essas promessas foram feitas no calor da campanha e contradizem tudo o que o candidato sempre defendeu. Só podem ser entendidas nesse contexto.

FHC entrou pela frente, Dirceu pelos fundos

O GLOBO, Elio Gaspari, 6 de outubro de 2010


No dia em que Marina Silva, uma pobre menina do Acre, nascida no seringal Bagaço, teve 19,6 milhões de votos, José Dirceu, o engenheiro da máquina petista na eleição vitoriosa de 2002, chegou cedinho para votar num colégio de Moema, em São Paulo. Entrou por uma porta lateral e saiu protegido por seguranças.


Há quatro anos, nesse mesmo local, ouviu gritos de ladrão. Na mesma manhã de domingo, Fernando Henrique Cardoso percorreu a pé uns poucos quarteirões e votou no Colégio Sion, o prédio onde, em 1980, um grupo de sindicalistas fundou o Par tido dos Trabalhadores.

Algo está acontecendo debaixo dos olhos do comissariado petista.

Mais: os resultados trouxeram sinais de que algo está acontecendo debaixo dos olhos do eleitorado. Com 255 mil votos, o deputado federal mais votado do PT de São Paulo foi João Paulo Cunha, réu do processo do mensalão.

Numa bancada que já teve Florestan Fernandes e Hélio Bicudo, o líder do PT na Câmara, Candido Vaccarezza, chegará à Câmara numa coligação beneficiada pelos 1,4 milhões de votos dados ao palhaço Tiririca, pior do que está, não fica.

Em Boa Vista, um colaborador de Romero Jucá (PMDB), líder do governo no Senado, ao ver a Polícia Federal, jogou um pacote com R$ 100 pela janela do carro.

Quando Marina Silva se juntou aos movimentos da igreja e ao PT nas causas do andar de baixo do Acre, Erenice Guerra, a filha de um pedreiro, militava nas bases cristãs e no jovem PT. Uma chegou ao Senado, a outra à Chefia da Casa Civil.

Uma saiu do PT e festejou 19,6 milhões de votos, a outra tem os filhos depondo na polícia por conta de maracutaias urdidas no Planalto e na Anac.

O comissariado menosprezou Marina Silva. Esse tipo de erro é neutro. Resulta da impossibilidade de se prever o desempenho de um adversário. O comissariado menosprezou também a descoberta do Ereniçário, um factoide, segundo Dilma Rousseff.

Aí não se tratou de um erro neutro, mas de um produto da soberba petista.

Pode-se supor que Marina Silva recebeu 10 milhões de votos sem culpa, movidos a emoção. Foram eleitores que usufruíram o direito de ficar longe de argumentos extremados como os do mensalão petista e da privataria tucana. Na infância, o PT foi alimentado por esse tipo de voto, daqueles que não queriam trato com os náufragos da ditadura, nem com políticos que formavam aquilo que supunham ter sido uma oposição consentida. (Tremenda injustiça com Tancredo Neves, Franco Montoro e Ulysses Guimarães.) Acreditar que um apoio formal de Marina afrouxe o cadeado aritmético dos 47,6 milhões de Dilma Rousseff é uma aposta arriscada.

Os votos sem culpa não formam um curral. Eles são o contrário disso.

Votos evangélicos saídos da fé podem ir para qualquer lado. Votos evangélicos produzidos por pastores e bispos eletrônicos possivelmente serão devolvidos a Dilma.

O que levará eleitores sem culpa a escolher entre Dilma e Serra será um processo complexo e imprevisível, ligado ao simbolismo que os candidatos constroem em torno de suas figuras. Foi isso que Marina conseguiu.

Por falar em simbolismos, na noite da vitória de 2002 José Dirceu teve um piti porque não foi levado ao pódio de Lula no palanque da festa, na Avenida Paulista. Passados oito anos, foi votar pelos fundos, enquanto FHC entrou pela porta da frente.