INSTITUTO AME CIDADE, 31 de agosto de 2011
Londrina tem vivido nos últimos tempos uma situação trágica na área da saúde, com um enredo que junta incompetência técnica, corrupção e falha grosseira dos vereadores da cidade em seu dever de fiscalizar os serviços públicos.
Hoje foi divulgada uma decisão importante da Justiça Federal nesta trágica novela: a condenação de 12 dos 16 acusados de envolvimento no esquema milionário de desvio de recursos públicos realizado pelo Centro Integrado de Apoio Profissional (Ciap). Os 12 vão cumprir pena por crimes de peculato, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.
A sentença assinada na última segunda-feira pelo juiz Sergio Fernando Moro, da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba, condena o presidente do Ciap, Dinocarme Aparecido Lima, a 17 anos e 4 meses de prisão em regime fechado. A mulher dele, Vergínia Aparecida Mariani, titular e administradora de várias das empresas envolvidas no esquema criminoso, foi condenada a 14 anos, 11 meses e 15 dias de reclusão também em regime fechado.
Entre os condenados está o engenheiro agrônomo Antônio José Viana Neto, marido da Secretária de Educação de Londrina, Karin da Costa Sabec. Ele foi condenado a oito anos e três meses de prisão.
O nome da secretária aparece na sentença judicial porque ela era proprietária junto com o marido de uma fazenda em Altamira, no Pará. A propriedade foi repassada ao CIAP por R$ 300 mil. Na sentença, o magistrado escreve que a quantia é "bem distante, portanto, dos aludidos R$ 26.417.394,93, que constaram na escritura". A escritura contendo a assinatura de Viana Neto foi apreendida na Operação Parceria, feita pela Polícia Federal em 2010 e que desbaratou a quadrilha. Na época foram presos vários membros do CIAP, inclusive seu presidente, Dinocarme Aparecido Lima, agora condenado pela Justiça.
Já em maio deste ano, o Ministério Público e o Gaeco desencadearam a Operação Antissepsia, que resultou na prisão de 21 pessoas, entre elas o ex-procurador Geral do Município Fidélis Canguçu, nomeado diretamente pelo prefeito Barbosa Neto (PDT).
Hoje o prefeito não foi à audiência de instrução na 3ª Vara Criminal de Londrina, para a qual havia sido arrolado como testemunha de defesa do ex-procurador Canguçu.
No esquema desbaratado pela Operação Antissepsia, da PF, o advogado de Canguçu arrolou o próprio prefeito como testemunha de defesa.
Até ser demitido depois de preso pelo Gaeco, Canguçu era homem de confiança do prefeito Barbosa Neto.
O esquema que tinha no meio até o procurador da prefeitura de Londrina nada tem a ver com a condenação feita agora pela Justiça. A relação com o CIAP é apenas pelo setor em que ocorreu a corrupção: a saúde.
Aí temos outro caso, também na área da Saúde, e com seu desenvolvimento ocorrendo logo depois da denúncia dos desvios de dinheiro público feitos pelo CIAP.
Mesmo depois do bando do CIAP ter sido surpreendido lá atrás, o esquema teve prosseguimento com outro grupo. No entanto, o Ministério Público se manteve atento.
O que Londrina se pergunta é aonde estavam os vereadores nesse tempo todo. Atentos ao seu dever é que não estavam.
É evidente que com vereadores atentos ao seu trabalho não seria possível de forma alguma a continuidade da corrupção.
O desenrolar de tanta corrupção cria tamanho embaralhamento que às vezes até nos obriga a apelar para o humor e considerar que parece que os corruptos adotaram no Brasil uma tática de vencer a população pelo cansaço. Na região é a mesma coisa.
Porém, repondo o assunto à seriedade que ele exige, é preciso perguntar o que fazia a Câmara de Vereadores de Londrina enquanto acontecia esta sucessão de corrupção que criou um caos numa área vital como a da Saúde.
Todo o esclarecimento de cada caso, com a investigação e a descoberta dos desvios, veio do Ministério Público − com o Gaeco como sempre fazendo seu papel exemplar de combate à roubalheira – e da Polícia Federal.
A destruição da saúde em Londrina foi ocorrendo sem nenhuma atitude preventiva da Câmara Municipal de Londrina, que se movimenta com lentidão mesmo depois das ações do MP e da PF. O desleixo dos vereadores com seu dever básico, que é o de fiscalizar para que não haja espaço para a corrupção, se seguiu ao da espantosa leniência mesmo depois de denunciados os crimes.
A ausência dos vereadores até abriu espaço para uma decisão inédita da Assembléia Legislativa paranaense, que aprovou nesta segunda-feira a criação de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) para averiguar a gestão pública da saúde em Londrina. O pedido foi do deputado londrinense Luiz Eduardo Cheida (PMDB).
A CEI, que será composta por sete deputados estaduais a serem indicados nos próximos dias, terá duração de cem dias para a apresentação de um relatório final.
De certa forma, foi a entrada de deputados estaduais em questões que seriam da alçada de vereadores, mas a atitude do deputado Cheida acabou sendo aplaudida em Londrina, cuja população se sente abandonada pelo legislativo municipal.
O foco da corrupção hoje em Londrina está centrado na saúde pública. O CIAP, que teve seus responsáveis condenados pela Justiça Federal, tomava conta de áreas vitais para a saúde do povo londrinense, como a contratação de funcionários para a Policlínica, o Samu, agentes de Endemias, o Programa Saúde da Família, PSF Indígena, Sistema de Saúde Familiar.
Dentro desse programa de terceirização que foi totalmente deturpado está o combate à dengue. E é claro que hoje Londrina é uma das cidades brasileiras em que este grave problema cresce de forma assustadora.
Este ano o número de confirmações de casos da dengue em Londrina já superou a pior epidemia já registrada na cidade, em 2003. No ano inteiro de 2003 Londrina teve 7.352 casos. E até o mês passado a cidade já registrava 7.371 pessoas com dengue.
Este é o resultado de um processo que começou de forma errada, na terceirização da saúde projetada de forma incompetente ou de má-fé. A terceirização foi iniciada no governo petista de Nedson Micheleti. De lá para cá, a saúde em Londrina entrou no ciclo normal de todo processo corruptivo: a destruição da infra-estrutura e a ineficiência no atendimento à população.
No meio disso, como agente determinante desta terrível falência, está a Câmara Municipal de Londrina. Se os vereadores cumprissem com o dever de fiscalizar, os problemas seriam detectados já de início. Também com o acompanhamento criterioso dos vereadores, estes problemas encontrariam solução muito antes de seguirem para o caminho que levou ao caos que vive hoje a cidade.
Sem um legislativo municipal digno, que cumpra com o dever constitucional de fiscalizar e acompanhar os atos do Executivo, as cidades brasileiras seguem para o mesmo caos de Londrina.