terça-feira, 18 de maio de 2010

Desvio na Assembleia Legislativa já comprovado é de R$ 26 milhões

GAZETA DO POVO, 18 de maio de 2010

Segundo o MP, esse foi o montante de dinheiro desviado por meio de apenas duas famílias de fantasmas e laranjas


A investigação do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) já conseguiu comprovar que o esquema de corrupção montado dentro da Assembleia Legislativa do Paraná (AL) desviou pelo menos R$ 26 milhões dos cofres públicos. Esse montante, sem correção monetária, se refere apenas aos depósitos feitos pela Casa na conta bancária de 17 funcionários fantasmas – oito parentes do funcionário João Leal de Mattos e nove de Daor Afonso Marins de Oliveira – este último, foragido da Justiça.

Os promotores do Gaeco, braço do Ministério Público Estadual (MP), identificaram que nenhum deles de fato prestou expediente no Legislativo. Mas o grupo recebeu R$ 26 milhões em salários desde 1994. Foram R$ 13 milhões envolvendo a família Leal, como já havia sido revelado há duas semanas. Agora surgem outros R$ 13 milhões comprovadamente desviados por meio do pagamento de salários aos familiares de Daor Oliveira.

Na última sexta-feira, a Justiça decretou a prisão preventiva de Daor Oliveira. Uma nova prisão preventiva também foi decretada para os ex-diretores Abib Miguel (diretoria-geral), José Ary Nassiff (diretoria administrativa) e Cláudio Marques da Silva (de pessoal). Os ex-diretores estão detidos acusados de desvio de dinheiro, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

Os promotores sustentam que Abib Miguel, conhecido como Bibinho, chefiava uma quadrilha montada dentro da Assembleia para desviar dinheiro público. Nassiff e Cláudio Marques teriam envolvimento direto na contratação de funcionários fantasmas com o objetivo de se apropriar das verbas públicas do Legislativo. Leal de Mattos e Daor Oliveira teriam a função de obter documentos pessoais de seus familiares para possibilitar a contratação deles na Assembleia.

Daor Oliveira é corretor de imóveis e trabalha na mesma sala comercial, num prédio no centro de Curitiba, onde funciona uma empresa de Bibinho e Nassiff. Ele tem cargo em comissão na Assembleia e conseguiu emprego para Roseli do Rocio Luccas de Oliveira (esposa), Luiz Alonso Luccas de Oliveira (filho), Maureen Louise de Oliveira (filha), Clori de Oliveira Gbur (irmã), Pierre, Alessandro e Eduadro Gbur (os três sobrinhos), e para Glaucilene de Souza Gbur (esposa de Pierre) e Thayse Pereira Gbur (esposa de Alessandro).

A reportagem da Gazeta do Povo e da RPCTV tiveram acesso ao depoimento de Maurren Louise de Oliveira. Maurren disse ter certeza de que ela, o pai, a mãe e o irmão nunca trabalharam na Assembleia. Afirmou ainda desconhecer o fato de seu nome aparecer na lista de funcionários da Casa divulgada pelo presidente Nelson Justus (DEM) em 2009.

Maurren contou também que acredita que os demais parentes também não trabalharam na Assembleia. “Luiz Alonso é ator, mora em São Paulo. E, quando morou em Curitiba, trabalhava como professor de Educação Física. Pierre é garçom. Eduardo, taxista. Alessandro é funcionário de uma empresa. Glaucilene é do lar e Thayse, funcionária de uma empresa”, disse ela.

No depoimento aos promotores, Maurreen contou que recebe apenas R$ 900 como estagiária num escritório de advocacia. Mas documentos obtidos com exclusividade pela Gazeta do Povo e pela RPCTV revelam que a Assembleia fez 16 depósitos na conta bancária dela, entre 2006 e 2009, que totalizaram R$ 286 mil. Só em setembro de 2006 a Assembleia pagou R$ 25 mil de salário para Maureen. Para receber esse volume de dinheiro ela teria de trabalhar por dois anos no atual emprego.

A situação do irmão dela é ainda mais grave. Maureen afirmou que Luiz Alonso trabalha como ator em São Paulo, onde mora há dois anos. Mesmo a distância, a Assembleia depositou R$ 238 mil na conta bancária dele entre os anos de 2008 e 2009.

A reportagem tentou falar com Daor Oliveira pelo telefone celular, mas o aparelho dele estava desligado.

Ex-foragido

O contador Douglas Bastos Pequeno – que cuidava da contabilidade de uma das fazendas do ex-diretor-geral da Assembleia Legislativa do Paraná Abib Miguel – foi ouvido na semana passada pelos promotores do Gaeco. Pequeno estava foragido da Justiça desde 8 de maio, quando o MP deflagrou a Operação Ectoplasma 2.

Pequeno se apresentou com o advogado e prestou depoimento, sendo liberado em seguida. O mesmo fizeram Maria Advair Bastos Pequeno e Josiane Bastos Pequeno – respectivamente mulher e filha de Douglas.

Pequeno, a mulher e a filha eram três das 13 pessoas que estavam foragidas. Elas foram informadas dois dias antes da operação do Gaeco e conseguiram fugir – vazamento que está sendo investigado pelos promotores. As outras 10 pessoas, que não tiveram o nome divulgado, estão sendo procuradas pela Justiça.

MP denuncia 13 pessoas por desvio de dinheiro público e outros três crimes

GAZETA DO POVO, 18 de maio de 2010

Gaeco encontrou 18 situações em que foram cometidos os crimes de formação de quadrilha, peculato (desvio de dinheiro público), falsidade ideológica e lavagem de dinheiro


O Ministério Público do Paraná (MP-PR) denunciou 13 pessoas nesta terça-feira (18) por causa do esquema de contratação de funcionários fantasmas e desvio de dinheiro público na Assembleia Legislativa do Paraná. A denúncia foi assinada pelos promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco).

A nova denúncia diz respeito ao esquema de contratação de parentes do corretor de imóveis Daor Afonso Marins de Oliveira, que é funcionário comissionado da Casa de Leis. Além disso, o corretor e os filhos pagariam para terceiros cederem os nomes para nomeações irregulares, de acordo com o MP.

Essas pessoas ganhavam entre R$ 600 a R$ 800 mensais por mês para participar do esquema, e receberiam até R$ 30 mil na folha de pagamento da Assembleia Legislativa. Segundo a denúncia, o Gaeco encontrou 18 situações em que foram cometidos os crimes de formação de quadrilha, peculato (desvio de dinheiro público), falsidade ideológica e lavagem de dinheiro.

De acordo com a denúncia do Gaeco, algumas pessoas receberam dinheiro diretamente de Abib Miguel, que era diretor-geral da Assembleia. O órgão afirmou que algumas pessoas sabiam que os nomes eram utilizados no esquema e que outras descobriram posteriormente, mas aceitaram participar da fraude. Apenas uma pessoa desconhecia a situação e não foi incluída na denúncia.

As pessoas denunciadas nesta terça-feira foram Abib Miguel, José Ary Nassiff, Cláudio Marques da Silva, Daor Afonso Marins de Oliveira, Marlon Christian Luccas de Oliveira (filho de Daor), Maureen Louise de Oliveira (filha de Daor), Roseli do Rocio Luccas de Oliveira (esposa de Daor), Clori Maria de Oliveira, Luiz Alonso Luccas de Oliveira, Eduardo José Gbur, Pierre José Gbur, Alessandro Gbur e Glaucilene de Souza Gbur.

Desses, Abib Miguel (ex-diretor-geral), José Ary Nassiff (ex-diretor de Administração) e Cláudio Marques da Silva (ex-diretor de Pessoal) e já tinham sido denunciados pelo MP em 4 de maio por desvio de dinheiro público, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica. O funcionário João Leal de Mattos também foi denunciado em 4 de maio pelos referidos crimes.

Na primeira denúncia do MP-PR, Abib Miguel e João Leal de Mattos foram denunciados por cometerem 1.182 vezes o crime de peculato (desvio de dinheiro público).

Já com relação a denúncia desta terça-feira (18), Abib Miguel e Daor Afonso Marins de Oliveira foram denunciados 894 vezes pelo crime de peculato.

Por causa do escândalo do Ciap, contratos da Saúde em Londrina podem ter intervenção

JORNAL DE LONDRINA, 18 de maio de 2010

Proposta foi discutida, ontem, em reunião na Câmara. Município mantém 4 contratos no valor de R$ 47 milhões com a Oscip investigada por desviar recursos


Os contratos entre a Prefeitura de Londrina e o Centro Integrado de Apoio Profissional (Ciap), entidade suspeita de desviar R$ 300 milhões em recursos públicos, sendo R$ 10 milhões somente na cidade, podem sofrer intervenção judicial. A proposta foi apresentada, na manhã de ontem, em uma reunião entre a Comissão de Seguridade Social da Câmara de Vereadores, representantes do Executivo, Polícia Federal, Receita Federal e Sindicato dos funcionários de Oscips.

Pela proposta, um interventor do Ministério Público do Trabalho seria o responsável por gerir os contratos. “Isto [a intervenção] é o que dá mais segurança para a continuidade dos serviços. Mas ainda precisamos analisar se a intervenção seria na Oscip ou nos contratos”, afirmou o procurador do Município, Gabriel Bertin.

Em Londrina , o Ciap detém contratos que somam R$ 47 milhões para gerir serviços como o Programa Saúde da Família (PSF) - R$ 33 milhões – o Serviço de Atendimento de Urgência (Samu), a Policlínica da zona oeste e o Programa de Endemias, responsável pelos agentes de combate à dengue. No total, 1,1 mil funcionários trabalham na Saúde com contratos no Ciap.

“Os serviços tem que continuar porque a paralisação deles seria o caos para a cidade. Mas como continuar com os pagamentos com a entidade sob suspeita?”, questionou a vereadora Sandra Graça (PP), presidente da Comissão de Seguridade Social da Câmara.

Há dúvidas, por exemplo, se a Prefeitura pode depositar os recursos destinados aos programas de Saúde em uma conta desvinculada do Ciap e gerir os pagamentos dos serviços para os funcionários contratados pela entidade. “Não sei se podemos absorver o contrato e desenvolver as condições necessárias para gerir os pagamentos”, expôs o secretário de Saúde Edson de Souza.

O SindiOscip (Sindicato dos Trabalhadores de Oscip) também avalia se é viável que trabalhadores possam passar a controlar a entidade caso haja destituição da diretoria da Oscip, que tem fins públicos.

Para o procurador jurídico da Prefeitura, uma intervenção na entidade só é possível a partir de um pedido da Procuradoria do Trabalho à Justiça Federal do Trabalho, quando um interventor público pode ser nomeado. A Prefeitura também tentará acessar documentos das investigações da PF e da Receita para que a auditoria nos contratos, determinada pelo prefeito Barbosa Neto, seja mais ágil. A PF avalia que o compartilhamento de documentos é possível, mas deve ser requisitado à Justiça.

Os representantes da Saúde pretendem se reunir com o Ministério Público do Trabalho (MPT) ainda nesta semana. O JL tentou contato com a sede da Procuradoria do Trabalho em Londrina, mas os telefones estavam mudos. (Colaborou Daniel Costa)

“Não podemos puni-los”, diz secretário -
O secretário de Gestão Pública Marco Cito afirmou que não pode punir o Ciap pela inexecução de 30% dos serviços, como descobriu uma auditoria da Prefeitura, porque os contratos são feitos com base em metas. “Se as metas são descumpridas o que fazemos é cortar o pagamento e repassar apenas aquilo que foi executado. Fora isso, não podemos puni-los”, afirma.

Este mês, a Prefeitura de Londrina pagou 11,8% a menos do que o total previsto para os 4 contratos. Dos R$ 2,6 milhões integrais, a Prefeitura repassou ao Ciap R$ 2,3 milhões. A Policlínica está com 26% a menos do total funcionários previstos no contrato; o PSF, com 25% a menos e o Samu, com 29% a menos. “Já são R$ 2 milhões a menos que deixamos de pagar”.

O secretário afirma que a auditoria instalada vai quantificar os pagamentos feitos nos meses em que a remuneração do serviço era pelo valor de teto – e não pela meta cumprida.

PF finaliza investigações em 10 dias -
O chefe da Polícia Federal (PF) de Londrina, delegado Evaristo Kuceki, afirma que as investigações que implodiram o esquema de desvios de recursos do Ciap deve terminar em 10 dias. A intenção da PF é terminar o inquérito enquanto quatro diretores da entidade, entre eles o presidente Dinocarme Aparecido de Lima, estão presos – o que obriga julgamento mais rápido de possíveis denúncias civis e criminais contra o grupo. “Queremos condená-los enquanto estão presos para que permaneçam presos”, afirmou o delegado. Segundo Kuceki, a PF conseguiu atingir os objetivos das investigações com as prisões, apreensões de documentos e bloqueios de bens dos suspeitos e avaliou que “tudo o que foi planejado foi cumprido”. A cassação do título de Oscip – obtido pelo Ciap no Ministério da Justiça –, de acordo com o delegado, “é quase natural que ocorra”.

O título de Oscip qualifica a entidade para disputar recursos públicos em programas com recursos públicos. O delegado ainda afirmou não ter indícios da participação de funcionários públicos da Prefeitura de Londrina no caso, mas afirmou que “se alguém prevaricou [deixou de cumprir obrigação do cargo de funcionário público], pode ser investigado e preso”.

Justiça mantém prisão de 4 suspeitos

A Justiça determinou no final de semana, que quatro suspeitos de comandar o esquema que desviou R$ 300 milhões em verbas públicas a partir do Centro Integrado de Apoio Profissional (Ciap) sigam presos. Entre eles estão o coordenador da entidade, Dinocarme Aparecido Lima e o advogado Fernando Mesquita; além do contador e do auxiliar financeiro do grupo. Os quatro que já estão presos, além de outras duas pessoas - que estão foragidas -, tiveram prisão preventiva decretada no fim de semana.

Na mesma decisão, a Justiça libertou outras oito pessoas presas sob acusação de participar do esquema. Os supostos envolvidos foram presos em uma operação policial realizada na terça-feira passada.

Chegou a hora de abrir as contas na internet

O GLOBO, Gil Castelo Branco


Há quase 100 anos, o juiz Louis Brandeis disse que a luz do sol é o melhor dos desinfetantes, referindose ao opaco sistema financeiro dos Estados Unidos. Segundo o magistrado, os banqueiros costumavam se safar ilesos das crises financeiras, enquanto o ônus recaía sobre a classe média. Na verdade, nada muito diferente do que acontece hoje com gregos e americanos. Há mais de um século, sonha-se com a transparência.

No Brasil, existe uma luz no fim do túnel. A partir do próximo dia 28, começa a produzir efeitos a Lei Complementar 131, de autoria do ex-senador João Capiberibe. Com isso, os estados, o Distrito Federal e aproximadamente 275 prefeituras com mais de 100 mil habitantes, serão obrigados, neste primeiro momento, a informar pela internet o quanto arrecadam e como gastam o dinheiro dos contribuintes. Depois, todas as cidades deverão fazer o mesmo, em diferentes prazos, conforme o tamanho da população. A rigor, quem descumprir a legislação terá suspensas as transferências voluntárias do governo federal.

No Rio de Janeiro, por exemplo, 27 prefeituras terão que explicitar imediatamente as suas contas em seus sites. Desde a capital, com seis milhões de habitantes, a Japeri, que segundo o IBGE já possui 101 mil moradores.

Do PMDB, que administra dez dessas cidades, ao DEM, PR e PSC, com uma prefeitura cada. A implantação da lei mostrará quais são os administradores que realmente estão dispostos a prestar contas à sociedade. Embora o acesso à informação seja um direito essencial, os políticos, em geral, só o defendem quando estão na oposição.

Como a transparência é o principal antídoto contra a corrupção, esperase que a população, especialmente a sociedade civil organizada, acompanhe as informações divulgadas e passe a discutir sobre a alocação dos recursos e a qualidade das despesas governamentais.

O orçamento e a cidadania estão chegando pela via digital. É evidente que ninguém quer saber apenas o telefone do Corpo de Bombeiros ou o local onde obterá a carteira de identidade.

Os portais eletrônicos deverão conter, pelo menos, o orçamento previsto, a arrecadação dos impostos, os nomes de todos os fornecedores, o que foi comprado, os serviços prestados, as licitações, os contratos e os programas implementados.

Com a finalidade de aproveitar a ocasião e fomentar o acesso à informação, especialistas no tema das universidades de Brasília e de Campinas, da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo e da Fundação Getulio Vargas debatem com a Associação Contas Abertas sobre o conteúdo dos sites que estão sendo projetados.

Também contribuem nessa discussão experientes profissionais da Controladoria-Geral da União e do Tribunal de Contas dos Municípios do Ceará. A proposta é criar parâmetros de transparência, que irão resultar em notas de zero a dez a serem atribuídas às administrações públicas, de acordo com o grau de transparência dos seus respectivos sites. Com base nas notas, será formado um ranking com os índices de transparência da União, dos estados e dos municípios.

Na prática, quanto mais os governos federal, estaduais e municipais forem transparentes, melhores notas terão. Desta forma, se um município divulgar quanto gasta com os seus funcionários receberá uma determinada pontuação, que aumentará se informar os nomes, cargos e salários dos servidores. Caso publique dados de um único exercício terá pontuação inferior àquela que obterá se oferecer uma série histórica dos cinco últimos anos. E assim por diante.

O objetivo é estabelecer competição saudável entre os gestores federais, estaduais e municipais para estimulálos a mostrar, centavo por centavo, como usam o dinheiro público. Afinal, a publicidade das contas públicas é um dos princípios do Art. 37 da Constituição Federal, juntamente com a legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência. O Estado deve dar conhecimento à população sobre como administra os seus recursos. Por meio desse ranking, a sociedade poderá avaliar a transparência do Estado.

Apesar de reconhecidos avanços, ainda vivemos nas trevas principalmente no que diz respeito à visibilidade das contas estaduais e municipais.

A escuridão impede uma boa faxina nos orçamentos, mas a Lei Complementar 131 pode trazer novos tempos. A administração pública brasileira precisa rapidamente de muito sol, o melhor dos desinfetantes, há mais de um século.

GIL CASTELO BRANCO é economista e fundador da organização não governamental Associação Contas Abertas.