segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Reformulação do Código de Defesa do Consumidor divide especialistas

GAZETA DO POVO, 14 de setembro de 2009

Parlamentares discutem formas de atualizar a lei, mas as organizações de defesa do consumidor temem retrocessos


Na última sexta-feira, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) completou 19 anos desde sua promulgação. Para comemorar a data, o Congresso Nacional promoveu um seminário que avaliou os avanços conquistados neste período e anunciou a formação de uma comissão especial, composta por deputados e senadores, destinada a propor “reformulações” e “atualizações” dessa legislação.

A iniciativa, no entanto, não agradou a especialistas e entidades de defesa do consumidor, que temem que o pretexto da reformulação do código abra espaço para seu enfraquecimento. Outro receio é o do risco de uso do debate como palco político para a criação de leis populistas que acabem desfigurando o projeto original do CDC, diminuindo seus efeitos, hoje bem consolidados.

“O Idec entende que o CDC, hoje, atende amplamente às necessidades do consumidor. Apesar de ter 19 anos, é muito atual e contempla todos os preceitos. Por isso mesmo o código é considerado um dos diplomas legais mais modernos e avançados do mundo”, afirma a assessora de relações institucionais do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Marilena Lazzarini, que participou do seminário, em Brasília.

Melhorar o que já existe

Segundo a especialista, os esforços deveriam partir do poder Executivo, no sentido de melhorar a aplicação das regras já existentes, aprimorando sua estrutura de implementação com o fortalecimento dos Procons, das associações de consumidores e da implantação de um programa de educação para o consumo. “Tudo isso pode ser feito na esfera da normatização”, defende.

Para a coordenadora do Procon-PR, Ivanira Gavião Pinheiro, o maior benefício da criação do Código nestes 19 anos foi o de trazer cidadania aos consumidores e responsabilidade aos fornecedores. “Hoje as empresas precisaram atualizar os seus processos para as novas práticas, porque o consumidor, seja ele de qualquer classe social, sabe que está protegido”, avalia.

A coordenadora também não vê motivos para o início de uma discussão em torno da atualização do código. “Não vejo o que poderia ser acrescentado ao CDC. O código é tão amplo e abrangente que até mesmo as situações criadas com o uso de novas tecnologias, como as compras pela internet, já são de certa forma contempladas no artigo que define a compra realizada fora do estabelecimento comercial. É uma questão de interpretação”, diz.

Já para professora da Uni­versidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Cláudia Lima Marques, o CDC corre riscos e é necessário defendê-lo. Ela afirma que o crescente volume das ações gerou uma interpretação de que o consumidor estaria agindo com má-fé, se aproveitando do sistema de defesa. A especialista defende que as violações aos direitos do consumidor é que se multiplicam como resultado do crescimento do mercado consumidor. “Por isso é preciso manter o arcabouço jurídico já conquistado e aperfeiçoá-lo”, defende.

Lavoura de trigo na região de Cornélio Procópio sofre enormes prejuízos

AGORA CORNÉLIO, 11 de setembro de 2009

Em entrevista concedida ao nosso site de notícias, o economista do Deral (Departamento de Economia Rural) do Núcleo Regional da Secretaria Estadual da Agricultura e Abastecimento (Seab) de Cornélio Procópio, Santo Pulcinelli Filho (foto) disse que a cultura do trigo está sendo uma decepção para os produtores este ano na região. Segundo ele, foram plantados 170 mil hectares de trigo nos 23 municípios sob responsabilidade do Deral local e a expectativa no início do plantio era positiva, pois esperava-se colher entre 411 e 455 mil toneladas do produto.

No entanto, a partir de julho com o excesso de chuvas (cerca de 280 milímetros) causou enormes prejuízos para a cultura. Foi enviado relatório ao Secretário Estadual da Agricultura e Abastecimento, Walter Bianchini, informando que as perdas na área plantada de trigo estavam em torno de 40%. Alerta, entretanto, que essa perda pode ser maior uma vez que tem chovido acima do normal agora em setembro. Esta, segundo ele, é uma das maiores perdas na lavoura de trigo na região de Cornélio Procópio. "Estimativas mostram que foram perdidas em torno de 173 mil toneladas, resultando em prejuízos de R$ 74 milhões para os produtores de trigo da região", lamentou. Isso porque só nos primeiros dez dias de setembro choveu o equivalente 181 milímetros.

Santo Pulcinelli Filho lembra que os produtores estão desanimados em acumular prejuízos com o trigo e estão optando por outros produtos que proporcionam melhores rendas a eles. O técnico pediu ao secretário Bianchini durante visita à 12ª Exposição Agropecuária e Industrial de Cornélio Procópio, no parque de exposições Arthur Hoffig, que interfira junto ao Banco do Brasil e seguradoras para encontrarem uma saída que amenize o drama dos produtores de trigo da região que estão desanimados com prejuízos oriundos de chuvas em excesso e de estiagens nos períodos de plantio e colheita.

Observa que apenas 10% das lavouras de trigo foram colhidas até agora dos seguintes municípios: Cornélio Procópio, Santa Mariana, Bandeirantes, Nova Fátima, Congonhinhas, Nova América da Colina, Itambaracá, Santa Amélia, Uraí, Rancho Alegre, Leópolis, Sertaneja, Jataizinho, Assaí, São Jerônimo da Serra, Curiúva. Sapopema, Abatiá, Figueira, Nova Santa Bárbara, São Sebastião da Amoreira, Santo Antônio do Paraíso e Santa Cecília do Pavão.

Além disso, a expectativa era de que os produtores iriam receber R$ 33,00 que é o preço mínimo, mas o mercado está pagando pela tonelada de trigo em torno de R$ 26,70. "Isso representa uma perda de 29% no preço pago aos produtores", apontou. No início do ano, a prolongada estiagem ocorrida na região de Cornélio Procópio, resultou em prejuízos superiores a R$ 200 milhões para os agricultores.

FRUTAS - A região de Cornélio Procópio tem hoje uma área plantada de pelo menos 6 mil e 500 hectares de frutas, com destaque para a banana que ocupou espaço de 2 mil 839 hectares na safra de 2006, seguido da uva com mil e 48 hectares, abacate 346 hectares, laranja 191 hectares, pêssego 106 hectares e goiaba 36 hectares. A afirmação é do economista do Deral (Departamento de Economia Rural) do Núcleo Regional da Secretaria Estadual da Agricultura e Abastecimento (Seab), Santo Pulcinelli Filho. Ele acredita, inclusive, em aumento na área plantada de frutas, uma vez que muitos produtores estão aderindo à fruticultura nos 23 municípios da região de Cornélio Procópio.

Doenças emergentes assolam o planeta

JENNIFER KOPPE, Gazeta do Povo, 14 de setembro de 2009

Miséria e desmatamento são os principais responsáveis pelo aparecimento de novas infecções e pela volta de surtos que pareciam ter sido erradicados da Terra


No fim do século passado, acreditava-se que seria possível erradicar todas as doenças infecciosas do planeta e que a única preocupação da humanidade seriam as doenças crônico-degenerativas. A explosão da aids, durante a década de 1980 e o reaparecimento de doenças que tinham praticamente sumido do mapa como a dengue e a tuberculose, fez com essa teoria caísse por terra.

A pandemia da influenza A (H1N1), a chamada gripe suína, que hoje se espalha pelo mundo nos alerta para o fato de que, provavelmente, jamais nos livraremos das doenças infecciosas – o que não quer dizer que seremos para sempre reféns dos vírus e bactérias que parecem tomar conta do mundo. O controle e a vigilância constante são as armas que temos para combatê-los.

Podemos classificar as doenças infecciosas como emergentes e reemergentes. As emergentes, como explica a epidemiologista Mirian Marques Woiski, chefe do Departamento de Vigilância e Controle em Agravos Estratégicos do Estado do Paraná, são as doenças novas, que nunca existiram em um determinado meio ou que já existiam, mas nunca chegaram a atingir o homem. “Também podemos chamar de emergentes as doenças que causaram infecções em outras populações e que chegam a uma nova região, pela primeira vez. Caso da micobactéria, que já existia em outros estados do Brasil, mas que só chegou ao Paraná em 2007.”

As reemergentes, por sua vez, são doenças que apareceram, foram controladas, mas que voltaram a se manifestar depois de um determinado período. “A dengue e o cólera são alguns exemplos aqui no Brasil. É comum o vírus sofrer uma mutação ou se combinar com outros e voltar a atacar com novas características”, explica.

Por isso, o controle e prevenção da doença, principalmente por meio da vacinação, é fundamental. “Temos a falsa impressão de que doenças imunoprevisíveis como o sarampo e a poliomelite foram completamente erradicadas. Mas, na verdade, se não continuarmos tomando as precauções necessárias, elas podem voltar. É mais difícil manter controlada uma doença que ‘não existe mais’ do que controlar doenças novas, que chamam a atenção da população sobre os cuidados que devem ser tomados, como é o caso da gripe suína. Com doenças como o sarampo, é comum baixar a guarda. Pais deixam de vacinar os filhos, por exemplo, pensando não haver mais riscos”, explica Woiski.

Causas e controle

O comportamento humano é o principal culpado pelo aparecimento e pela transmissão desses patógenos. O desmatamento e a invasão das florestas fez com que a nossa convivência com di­­ferentes espécies de animais se tor­­nasse mais próxima, segundo a infectologista Rosana Camar­go, diretora do Hospital Oswaldo Cruz. “Para sobreviver, muitos animais migram para as áreas urbanas. É o caso da hantavirose. Enquanto nós desmatamos o ha­­bitat dos ratos silvestres, eles se aproximaram dos galpões de grãos, em busca de alimento e pas­­saram a transmitir a doença.”

O acúmulo de lixo e a falta de saneamento básico, comum nas periferias das grandes cidades, também contribui para a disseminação das doenças, ao provocar o aumento das populações de mosquitos e outros animais que servem como vetores.

A facilidade de deslocamento para outros estados e países é outro fator que aumenta a velocidade das transmissões, causando surtos. Seria o preço da globalização. “Muitas doenças chegaram ao Brasil dessa forma. Caso da febre amarela, que foi trazida da África”, lembra Mirian Woiski.

Para Rosana Camargo, é necessário investir na educação da população sobre as doenças e em um sistema integrado de comunicação para minimizar o impacto das doenças emergentes. Mas, apesar das limitações, os órgãos de vigilância tem conseguido impedir diversos surtos no país. “Conseguimos conter doenças a síndrome respiratória aguda severa (Sars) e a febre do Nilo. Mas esse controle não envolve apenas o trabalho dos órgãos de saúde. É preciso trabalhar em conjunto com outras áreas como agricultura e meio ambiente”, aponta Woiski.

Explosão da aids foi choque de realidade

A explosão da aids durante a década de 80 foi uma espécie de “tapa na cara”, que acabou de vez com a esperança de livrar o mundo das doenças infecciosas. Sem vacina, sem tratamento e se espalhando em um ritmo assustador, o misterioso mal causou pânico e se tornou a doença emergente mais temida pela população.

O Hospital Oswaldo Cruz, em Curitiba, que na época era referência no tratamento de diversas doenças infecciosas, passou a receber pacientes com HIV e teve de se adaptar, rapidamente, a uma nova realidade. “Existia muito preconceito em relação à aids, pois estava ligada ao sexo e ao uso de drogas ilícitas. Nenhum hospital queria atender esses pacientes, por isso passamos a recebê-los em troca de outros com meningite, hepatite e leishmaniose”, lembra a médica Rosana Camargo, diretora do hospital.

A especialista conta que, no início da pandemia, não havia nada a fazer a não ser acompanhar o doente até a morte. “Hoje, a realidade é outra. A maioria dos pacientes pode viver uma vida normal, em sociedade e sem apresentar nenhum sintoma, graças aos tratamentos que existem”, conta. A banalização da aids, en­­tretanto, causada justamente pela eficiência do tratamento, fez com que casos graves da doença vol­­tassem a aparecer nos últimos dois anos. “Muitos pacientes, além de terem tido um diagnóstico tardio, não estão se tratando e, por isso, estão apresnetando sintomas, como o sarcoma de Karpos, que só existiam no início da epidemia. No momento, temos seis pacientes internados com tuberculose, o que costumava ser raro”, completa.

A médica lembra que, embora o tratamento exista, a aids continua sendo uma doença letal e cercada de preconceito. “Estamos am­­pliando o hospital para poder oferecer aos pacientes uma unidade de terapia intensiva e equipamentos para a realização de diversos exames porque ainda encontramos muita resistência ao mandar um paciente nosso a uma UTI convencional”, explica.

Embora atualmente 98% dos pacientes do Hospital Oswaldo Cruz sejam portadores de HIV, o plano é tornar-se um instituto de infectologia referência no tratamento de outras doenças infecciosas.


Epidemias que causaram pânico no Brasil e no mundo

Aids

Sexualmente transmissível, a síndrome da imunodeficiência adquirida foi reconhecida nos Estados Unidos em 1981, mas o vírus HIV teve a sua origem em chimpanzés da África sub-Saariana. Acredita-se que existam 33 milhões de pessoas infectadas em todo o mundo. Não se conhece cura para a doença, mas é possível minimizar os seus sintomas.

Influenza

Durante o século 20, o vírus influenza causou três pandemias que mataram milhões de pessoas: a espanhola (1918), a asiática (1957) e a de Hong Kong (1968). Altamente transmissível, afeta animais domésticos como aves, suínos e equinos e possui um código genético de fácil mutação. A gripe suína causou uma nova pandemia neste ano e a gripe aviária continua sendo uma ameaça em todo o mundo.

Dengue

Surgiu durante a década de 50 no sudeste asiático e se espalhou pelo mundo. Na década de 80, reemergiu na América Latina. É causada por quatro tipos diferentes de vírus e transmitida por um vetor: o mosquito Aedes aegypti. Ainda não existe vacina para ela.

Paraná perde espaço na economia nacional

CRISTINA RIOS, Gazeta do Povo, 14 de setembro de 2009

Participação do estado na geração das riquezas nacionais encolheu nos últimos cinco anos de 6,4% para 5,8%. Causa está na concentração, dizem economistas


O Paraná perdeu espaço na economia brasileira nos últimos cinco anos. Quebras nas safras agrícolas, falta de grandes investimentos industriais e o avanço dos estados do Norte e do Nordeste contribuíram para reduzir a participação no total de riquezas geradas no país. Levantamento do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico Social (Ipardes) mostra que o estado, que em 2003 representava 6,4% do total do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, fechou 2008 com uma participação de 5,8%.

Situação que pode piorar, de acordo com analistas, com a tendência de concentração, nos próximos anos, das riquezas nas economias de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo, beneficiadas com os royalties do pré-sal. Cada ponto porcentual do PIB nacional equivale a cerca de R$ 28 bilhões, com base nos números de 2008. “O Paraná corre o risco, não desprezível, de perder importância nos próximos anos (hoje o estado é a quinta maior economia do país) se não for elaborado um plano de desenvolvimento de longo prazo de modo a acelerar a atração de investimentos”, diz o economista Marcelo Cu­­rado, vice-diretor do Setor de Ciências Sociais Aplicadas da Uni­versidade Federal do Paraná (UFPR).

Segundo ele, depois da última onda de industrialização, no fim da década de 1990, o Paraná não viveu nenhum grande processo de inovação. “A matriz de produção permanece a mesma desde então, com forte dependência do mercado relacionado a commodities como soja e milho e do setor automobilístico”, afirma.

A principal fragilidade da economia paranaense, no entender de Christian Luiz da Silva, professor de economia da UTFPR, é que a base da indústria do estado também está bastante concentrada em alguns segmentos, como alimentos e automóveis. “Se essas condições não mudarem, vamos continuar nesse elevador. Em alguns momentos subimos nossa participação, em outros reduzimos”, afirma. Os economistas defendem diversificação e desconcentração da produção e políticas de apoio a grandes investimentos, incentivos a inovação e tecnologia como forma de fortalecer a economia paranaense.

Nos anos recentes, a queda de participação se deveu principalmente aos efeitos da quebra de safra agrícola entre 2005 e 2006. O setor do agronegócio representa 30% da economia do estado, de acordo com o coordenador de conjuntura do Ipardes, Julio Suzuki. “Os problemas climáticos afetaram um setor que tem importância na economia estadual, mas a tendência é voltarmos gradativamente à posição anterior”, afirma. De acordo com ele, os números de participação do Paraná na economia nacional nos últimos dois anos ainda são estimativas e consideraram previsões conservadoras.

O fato de o estado perder posição relativa não quer dizer, no entanto, que a economia do estado vai mal. Quando se olha para o desempenho isolado, percebe-se que o Paraná foi bem nos últimos dois anos, com recuperação do crescimento – no ano passado avançou 5,8% contra 5,1% do Brasil. “O problema é que falta ao estado um processo de inovação que permita que ele cresça em participação, sobretudo com o avanço das economias de outros estados”, acrescenta Curado.

As regiões Norte e Nordeste vêm despontando com crescimento superior à média brasileira, amparadas pelas políticas de distribuição de renda, como o Bolsa Família. As pesquisas mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) só permitem comparar dados entre os estados somente até 2006, mas confirmam o movimento. Entre 2003 e 2006 a região Norte ampliou sua participação de 4,8% para 5,1% na economia brasileira e o nordeste de 12,8% para 13,1%. A região Sul foi a que mais perdeu espaço, com um recuo de de 17,75% para 16,3%. Entre os estados, os que mais tiveram queda foram justamente Rio Grande do Sul, com recuo de 0,7 ponto porcentual, e Paraná, com 0,6.



Maior renda per capita está no Distrito Federal

Apesar de avanços de alguns estados e perda de outros, a economia brasileira prossegue concentrada em apenas oito unidades da federação. Os sete maiores estados e o Distrito Federal tinham 78,73% do PIB do Brasil em 2006, segundo os dados mais recentes do IBGE. Quatro anos antes, esse porcentual era de 79,67%. A riqueza do país está principalmente São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná, Bahia, Santa Catarina e Distrito Federal. O Distrito Federal continua tendo o maior PIB per capita (R$ 37.600), quase o triplo da média nacional (R$ 12.688) e bem à frente de São Paulo (R$ 19.548) e Rio de Janeiro (R$ 17.695).

Principal indicador da atividade econômica, o PIB exprime o valor da produção realizada dentro das fronteiras geográficas de um país, num determinado período, independentemente da nacionalidade das unidades produtoras.

Em outras palavras, o PIB sintetiza o resultado final da atividade produtiva, expressando monetariamente a produção.

Sua variação é adotada como o principal indicador para medir o desempenho econômico de um país, região ou unidade federativa.

Deputado apresenta nota de R$ 1,8 mil com refeição

JORNAL DE MARINGÁ, 14 de setembro de 2009

Parlamentares da Assembleia do Paraná justificam gastos de vários almoços e jantares com um único recibo ou bancam refeições para outras pessoas, num exemplo de falta de regras para despesas com alimentação


A prestação de contas dos deputados estaduais do Paraná, disponível no Portal da Trans­pa­rência da Assembleia Legis­­lativa, revela que alguns parlamentares apresentaram numa única nota fiscal gastos de até R$ 1,8 mil com alimentação – tudo pago com dinheiro público. Levantamento da Gazeta do Povo, com base nas notas entregues pelos deputados em agosto para receber o reembolso, mostra que 29 dos 54 deputados apresentaram notas únicas para justificar despesas variando de R$ 300 a R$ 1,8 mil com refeições.

Alguns parlamentares ouvidos pela reportagem admitem que bancam, com verba da Assembleia, almoços ou jantares para aliados, em encontros políticos. Outros dizem que as despesas que estão numa única nota, na verdade, são referentes ao acúmulo de várias refeições nos restaurantes – e não uma só.

A situação, porém, revela que faltam regras estabelecidas pela própria Assembleia para os gastos dos deputados – que têm uma verba mensal de R$ 15 mil para despesas gerais, como alimentação, viagens e gasolina. A única citação sobre despesas com alimentação que consta no Portal é a seguinte: “Registra as despesas com aquisição de refeições, inclusive lanches e similares, do parlamentar e assessores no exercício da atividade parlamentar”.

Campeão

Quatro parlamentares apresentaram numa única nota gastos superiores a R$ 1 mil: Caíto Quintana (PDMB), Luiz Carlos Martins (PDT), Valdir Rossoni (PSDB) e Péricles de Mello (PT).

Caíto, o campeão nesse quesito, apresentou despesa de R$ 1,8 mil em um única nota, no Restaurante Frizzo’s Grill, de Francisco Beltrão, Sudoeste do Paraná. Caíto argumenta que o valor da nota se refere ao acúmulo de diversas refeições. “Tenho três funcionários que trabalham em Francisco Beltrão. E esses R$ 1,8 mil não são de uma única refeição. No final do mês eu peguei uma nota somando todos os gastos”, diz Caíto. “Muitos desses custos são fruto de reuniões políticas, com prefeitos e vereadores da região.”

Em Curitiba, Luiz Carlos Martins (PDT) gastou na Chur­­rascaria KF uma conta de R$ 1.313,00. “Não esbanjei”, defende-se Martins. Segundo ele, o jantar foi um encontro com lideranças comunitárias. “Eu não me lembro o número de pessoas nesta reunião. Esses encontros servem para me orientar no sentido de como agir nas votações, por exemplo.”

Valdir Rossoni foi o terceiro que mais gastou com nota única em restaurantes. Ele desembolsou R$ 1,2 mil na Churrascaria Dom Nunes, em Guarapuava, no Centro do Paraná. Rossoni não foi encontrado pela reportagem para comentar essa despesa.

No ranking das maiores no­­tas fiscais apresentadas pelos deputados, o quarto foi o petista Péricles de Mello. Ele gastou R$ 1.180,00 no Restaurante Adécio Ferreira Porto, em Ponta Grossa. “As minhas duas maiores notas são deste restaurante de Ponta Grossa e do restaurante da As­­sem­­bleia. São nesses dois lugares que meus funcionários almoçam. No fim de cada mês pego uma única nota e apresento”, explica Mello.

O professor de ciência política e direito constitucional Carlos Luiz Strapazzon, do Centro Univer­­sitário Curitiba, diz não ser possível julgar o método de prestação de contas dos deputados, já que a Assembleia não determinou nenhuma regra de despesas. “É claro que a forma mais transparente de prestação de contas de alimentação seria a apresentação de diversas notas e não de uma única. Entretanto, a Assembleia não determina uma forma. Ela (Assembleia) deveria, por exemplo, estipular um número de refeições e o teto de gastos, como as empresas adotam.”


Portal traz informações incompletas

Apesar de estar em funcionamento há mais de duas semanas, até o fim da semana passada o Portal da Transparência da Assembleia ainda apresentava falhas que dificultam a fiscalização dos gastos dos deputados estaduais. A prestação de con­­tas de pelo menos 10 parlamentares estava incompleta, apresentando valores muito menores do que os gastos realizados. Além disso, a comprovação do uso da verba mensal de R$ 27,5 mil de quatro deputados também não havia sido colocada no site, embora todos já tenham prestado contas.

Comparando as notas fiscais de ressarcimento de todos os parlamentares, o deputado Tadeu Veneri (PT) aparece como o que menos gastou no mês de agosto – R$ 2.645,00. O valor, no entanto, não está correto. O próprio petista confirma que já recebeu cerca de R$ 13 mil e não sabe o motivo da demora na apresentação dos dados. “Já reclamei e disseram que foi um problema no pen-drive que enviamos”, afirma Veneri.

Cada gabinete envia mensalmente à Comissão de Tomada de Contas as informações sobre as despesas do mês, acompanhadas do número do Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) das notas fiscais. Após análise, os dados são colocados no Portal.

Outro problema constatado pela Gazeta do Povo é que pelo menos dois números de CNPJ de despesas dos deputados com a divulgação da atividade parlamentar são considerados inexistentes. É o que revela o site da Receita Federal sobre a situação cadastral da empresa ou prestador de serviço. Isso ocorre em notas fiscais apresentadas pelos deputados Miltinho Pupio (PSDB) e Antonio Belinati (PP).

A prestação de contas de An­­­to­­nio Anibelli (PMDB) também não condiz com os gastos. Consta que ele teve despesas de R$ 4.499,00 com hospedagem, mas após consulta detalhadas nas notas fiscais, é possível constatar que se referem a gastos com alimentação. Anibelli garante que não gastou nada com hotéis ou pousadas nem sabia que no site as despesas estavam relacionadas com hospedagem. No Portal também faltava a divulgação dos gastos de quatro deputados. Um deles é Artagão Júnior (PMDB), que já havia apresentado a prestação de contas. “Fica parecendo que nós é que atrasamos a entrega dos comprovantes para ressarcimento, mas na verdade é um problema técnico”, reclama ele.

Em menos de 5 meses, Caapsml de Londrina gasta R$ 574 mil sem licitação

JORNAL DE LONDRINA, 14 de setembro de 2009

Segundo diretora do órgão, procedimento ocorre desde 2005 porque outras modalidades de “aquisição emergencial de material cirúrgico” não teriam funcionado


Em 131 dias, desde o início da gestão do prefeito Barbosa Neto (PDT), entre 1º de maio e 8 de setembro, a Caixa de Assistência, Aposentadoria e Pensões dos Servidores Municipais de Londrina (Caapsml) realizou 191 dispensas de licitação em compras de “materiais para cirurgia emergencial”, média de 1,45 processo por dia. O volume de recursos envolvido nessas compras é de R$ 573.929,70, de acordo com levantamento feito pelo JL nas edições do Jornal Oficial do Município. Comparado com o mesmo período do ano passado (apurado nas edições de 1º de maio a 9 de setembro de 2008 do Jornal Oficial), o valor gasto este ano com compras sem licitação nesse período é 97,04% maior com relação ao mesmo período de 2008, quando o desembolso foi de R$ 291.263,70 em 117 processos.

O superintendente da Caapsml, Denio Ballarotti, foi procurado pelo JL para comentar o volume de dispensas de licitação na sua gestão, mas encaminhou a reportagem para a diretora de Saúde do órgão, Ester Jandre. Segundo ela, esses casos são de compras que se enquadram na modalidade “pelo seu caráter emergencial”. O inciso IV do artigo 24 da lei de licitações (8.666/93) prevê dispensa em “casos de emergência” ou “quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas”. São materiais para diversos tipos de procedimentos cirúrgicos pagos pelo plano de saúde da Caapsml, que atende o funcionalismo municipal e seus dependentes.

Ester Jandre explicou que até 2005 a Caapsml pagava o material para os hospitais conveniados, mas o preço era acrescido de taxa de 25%. Ela afirmou que desde que substituiu esse procedimento – baixando o preço – o órgão “tenta achar a melhor alternativa para fazer a compra dos materiais”. Segundo ela, modalidades como pregão eletrônico e credenciamento foram experimentadas, mas não teriam funcionado. A diretora de Saúde explicou que está sendo “montada uma tabela de preços, que será aprovada pelo Conselho Administrativo da Caapsml”. Essa tabela se enquadraria na modalidade registro de preços. Feita a tabela, os fornecedores são credenciados e as compras são feitas com base nesse tabelamento.

Ester Jandre afirmou que a dispensa é adotada porque há pressa para atender às necessidades dos pacientes. Como os médicos têm preferência por materiais de determinadas marcas, fica difícil prever toda a demanda por meio de outras modalidades de licitação. A explicação da diretora de Saúde é que conforme o equipamento usado, somente algumas marcas se adequam. Não há uma padronização. Ela citou como exemplo materiais como lente intraocular. Outro exemplo são as ponteiras de shaver, usadas em cirurgias de joelho.

O advogado Miguel Ângelo Aranega Garcia, especialista em licitações, disse que “quando há dispensa, deve ser fundamentada nas causas do artigo 24 (da lei de licitações). “Toda a dispensa, como qualquer ato administrativo, deve ser justificada. Deve ter uma justificativa plausível”, declarou o advogado.

Carta aérea

JANIO DE FREITAS, 13 de setembro de 2009

Não encontrei nem um grande negócio de armamentos sem corrupção". A partir de tal constatação, para nós, brasileiros, os negociantes de armas são como as grandes empreiteiras.

Aí está uma razão definitiva, além de muitas outras, para que as atuais compras de armamentos pesados pelo Brasil -ou, mais precisamente, por Lula e Nelson Jobim em nome do Brasil- não lembrem os negócios para realização de obras públicas. Mas, depois dos submarinos, é o negócio da compra de aviões de caça, não importam seus tipos e procedências, que se enrola em inverdades, negaças e cartas marcadas.

Aquela frase é de Andrew Feinstein, autor de pesquisa mundial sobre negócios de armamentos, para o livro que escreve a respeito. Sua dedicação ao tema tem boa origem. Quando deputado na África do Sul, encabeçou a extraordinária investigação parlamentar que desvendou uma trama de grossa corrupção na compra, à Rússia, de grande número de caças Sukhoi. A frase consta da entrevista transmitida pelo "Milênio", na GloboNews, em 27.jul.09.

Será melhor que o Brasil não venha a figurar no livro de Feinstein nem de modo inconclusivo, apenas por estranhezas. Como esta, por exemplo: dada autorização especial, do Congresso e do governo dos Estados Unidos, para que a Boeing inclua a transferência de conhecimento tecnológico em sua oferta do caça F-A18E, na sexta-feira o Ministério da Defesa comunicou que só receberá propostas de fabricantes até a segunda-feira 21. Nelson Jobim criou, portanto, uma data-limite e, com ela, apenas nove dias (com dois sábados e dois domingos) para a elaboração de complexos estudos e formulação de propostas. Sendo que a da francesa Dassault já foi esboçada com brasileiros e em Brasília.

A data foi fixada na mesma sexta-feira em que Lula emitia, durante comício televisivo, três afirmações aproveitáveis para numerosos fins: "não há prazo" para a escolha, "eu decido quando quiser", "quem decide sou eu e mais ninguém". Pelo visto, não é o que Nelson Jobim acha, e pratica.

A nota com a informação de data-limite pede que a sueca Saab, do caça Gripen, e a Boeing "apresentem propostas que busquem equiparar-se à francesa", e esta "compatível com os parâmetros do presidente francês Nicolas Sarkozy". Confirma-se, pois, que a proposta francesa já é conhecida, contra nove dias para elaboração das demais, em negócio de bilhões.

Há pelo menos dois outros pontos de curiosidade na nota. Se Jobim não comete a impropriedade de revelar a outros a proposta francesa, é puro nonsense o pedido de que "equiparem" suas ofertas àquela. E "equiparar-se" para quê? O que deveria interessar ao Ministério da Defesa é justamente que não sejam apenas "equiparáveis", mas melhores. Ou, seja lá pelo que for, não conviria que se mostrem melhores?

Lula e Jobim podem querer o caça francês, mas não precisam recorrer à alegação de uma "aliança estratégica" com a França. Sob aliança estratégica com os Estados Unidos, o Brasil fez sua primeira esquadrilha de caças com os Gloster-Meteor de fabricação inglesa. Além da aliança estratégica, já sob o Acordo Militar Brasil-Estados Unidos, que trouxe até militares norte-americanos para dentro de bases e quartéis brasileiros, comprou aos ingleses e reformou na Holanda o finado porta-aviões Minas Gerais. Comprou na França caças Mirage, ainda em uso. Fez a associação, hoje extinta, da Embraer com a Dassault, e comprou na França o atual, mas não atualizado, porta-aviões São Paulo.

Aliança estratégica não é fatura nem contrato de promessa de compra e venda. É geopolítica, é política internacional.

Além disso, essa história de que "a FAB faz a análise técnica" e "o governo toma a decisão política e estratégica" é só invencionice. As duas são indissociáveis: a finalidade condiciona a escolha técnica do instrumento. É a razão que faz os Estados Unidos, com seus tantos tipos de jatos de combate, desejarem testar o Super Tucano da Embraer, a hélice, para situações como as do Afeganistão.

As grandes empreiteiras já são mais do que o necessário para o mau conceito brasileiro.

Corrupção e governabilidade

RUBENS RICUPERO

A CORRUPÇÃO passou a ser condição da governabilidade. É essa a justificativa de dirigentes de partidos do governo para sua cumplicidade no enterro dos escândalos parlamentares. A diferença com o regime militar é uma só: substituíram-se a violência e a tortura pela corrupção como suposta condição para ter segurança e governar.

Corrupção e violência, ensinava o filósofo Norberto Bobbio, são os dois tipos de câncer que destroem a democracia. No regime militar sacrificou-se a democracia em nome da segurança, elemento da governabilidade. Hoje a situação mudou e se usa o mesmo pretexto para fazer engolir o conluio ou a indulgência com a corrupção. Não sendo apanágio apenas de um governo, o vício se agrava ano a ano.

Nem a seriedade dos últimos escândalos, que comprometem instituições inteiras, conseguiu alterar a complacência dos governos, que pode não ser eterna, mas tem se revelado infinita enquanto dura.

Outro escândalo, agora de caráter intelectual, é que os politicólogos julgam o sistema de "presidencialismo de coalizão" como perfeitamente funcional, pois produziria governabilidade. Aparentam-se os nossos sábios aos fundamentalistas do mercado, que também acreditavam na neutralidade moral do mercado, que seria autorregulável, capaz de se corrigir automaticamente.

Em ambos os casos, os resultados justificariam os meios. Contudo, o derretimento do mercado financeiro mostrou que as torpezas e as falcatruas dos operadores acabam por provocar degeneração funcional, destruindo a própria instituição. A moral e a ética não são adornos para espíritos delicados, mas componentes indispensáveis ao bom funcionamento de qualquer sistema.

Isso não vale apenas para os mercados. A Primeira República italiana, que resistira ao desafio de governabilidade devido à presença do maior Partido Comunista do ocidente, se desmoronou à luz da corrupção desvendada pela Operação Mãos Limpas. A República Velha brasileira afundou no pântano da corrupção eleitoral e foram os escândalos que puseram fim à carreira e à vida de Getulio Vargas.

Não passa de autoilusão a ideia de que a economia cresce e o país se desenvolve apesar da corrupção e dos escândalos. Também na Itália, o "milagre econômico", o dinamismo, a inovação pareciam legitimar um sistema decadente. Com o tempo, a corrupção e o fracasso na reforma das instituições produziram o inevitável: a estagnação e o desaparecimento do dinamismo. Seria diferente aqui onde os mesmos vícios tendem a produzir idênticos efeitos?

Quando foi assassinado o juiz Giovanni Falcone, Bobbio chocou a opinião pública ao declarar que sentia vergonha de ser italiano e deixaria o país se fosse mais jovem. Recompôs-se depois desse momento de abatimento moral. Neste centenário do seu nascimento, a capacidade de se indignar do velho filósofo tem sido evocada ao lado da lição do grande poeta Giacomo Leopardi.

Numa das incontáveis horas amargas da Itália, dizia o poeta: "Se queremos um dia despertar e retomar o espírito de nação, nossa primeira atitude deve ser não a soberba nem a estima das coisas presentes, mas a vergonha".

No panorama de miséria moral de nossas instituições, deve-se escolher entre a atitude de soberba e estima das coisas presentes da propaganda complacente e a vergonha regeneradora do país futuro.

RUBENS RICUPERO, 72, diretor da Faculdade de Economia da Faap e do Instituto Fernando Braudel de São paulo, foi secretário-geral da Unvtad (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento) e ministro da Fazenda (governo Itamar Franco).

Gastos de governos com a crise atingem três trilhões de dólares

FERNANDO CANZIAN, Folha de S. Paulo, 13 de setembro de 2009

Saída da crise deixa endividamento recorde. Um ano depois de o banco Lehman Brothers quebrar, gastos dos governos contra a crise somam quase US$ 3 trilhões


Nos países emergentes, o retorno da atividade se sustenta com o crescimento do mercado interno e da atividade privada. Exemplo disso foi o avanço de 1,9% do PIB brasileiro no segundo trimestre do ano.

Nas economias avançadas, é o endividamento público recorde no pós-Segunda Guerra que tira os países da maior crise global desde a década de 1930.
Pela primeira vez na história moderna a crise fará com que em 2009 o crescimento global seja liderado pelos emergentes, e não pelo mundo rico.

Grandes desafios persistem: o setor privado dará conta de manter o crescimento nos países ricos quando as ajudas estatais terminarem? Qual a consequência da explosão do endividamento público sobre o futuro da economia mundial?

Embora os mercados já tenham recuperado boa parte das perdas desde o colapso do banco Lehman Brothers, em 15 de setembro de 2008, o desemprego em vários países bateu recorde em várias décadas.

A volta dos lucros corporativos nos EUA e em outros países ricos se dá como consequência do corte de custos e de pessoal.

Enquanto os problemas de fundo que detonaram a crise seguem sem solução, o ímpeto para uma nova regulação global a fim de evitar um novo desastre diminui rapidamente.
Passado um ano, as famílias norte-americanas e em vários países ricos seguem endividadas como nunca. E ainda perdem suas casas e empregos.

Já os bancos, embora sigam entupidos com os chamados "ativos tóxicos" que quase os levaram à falência, voltam a pagar elevados bônus a seus executivos. Mesmo os produtos financeiros "exóticos" em Wall Street ensaiam um retorno.

Um retrocesso na recuperação global não está descartado. Por isso, os países do G20 (grupo que reúne as 20 maiores economias do mundo) devem manter pacotes de estímulo de cerca de US$ 2,5 trilhões.

Nos EUA, só em áreas fortemente dependentes de dinheiro público, como saúde e educação, há criação de empregos. Em agosto, o desaparecimento de "apenas" 250 mil vagas foi considerado boa notícia.

O quadro segue desolador no país. Por mês, ainda há cerca de 300 mil ordens de despejo contra mutuários inadimplentes e mais de cem bancos foram fechados neste ano pelo governo.

Dois dos maiores ícones do capitalismo norte-americano, a General Motors e o Citigroup, têm hoje o Estado como principal acionista. O governo também controla a maior seguradora do mundo, a AIG, e as duas maiores empresas de crédito imobiliário do planeta, a Fannie Mae e a Freddy Mac.

Ao redor do mundo, especialmente nos países avançados, o desemprego também segue alto e a atividade baixa.

Mas economias importantes como Japão, Alemanha e França mostram sinais de que já saíram da recessão, embora dependentes de dinheiro estatal.

Brasil passa no teste, mas não supera gargalo

TONI SCIARRETTA, Folha de S. Paulo, 13 de setembro de 2009


Com bom desempenho, país ganha destaque no mundo, mas problemas estruturais podem atrapalhar avanço no longo prazo. Para especialistas, aumento dos gastos permanentes do governo é uma das maiores distorções na política do país e pode elevar juros

Nem tsunami nem marolinha. No início da crise, parecia que a economia brasileira ia sucumbir, mas, um ano depois, o país emerge das turbulências escapando do pior. Para alguns setores da indústria, entretanto, segue o tempo ruim.

A taxa de juros é a menor da história. Os depósitos compulsórios foram reduzidos, acirrou-se a concorrência entre bancos privados e públicos, e a percepção geral do mundo é que o Brasil resistiu bem às intempéries e merece receber investimentos -porém, a entrada de recursos acentua a apreciação do real e atrapalha mais a vida dos exportadores.

"Como o descolamento não é possível, usamos a palavra "diferenciação". A crise destacou o Brasil dos demais, já que o seu desempenho tem sido muito melhor do que o de outros países", diz Ricardo Carneiro, professor da Unicamp.

Com receio de uma explosão da inadimplência, os bancos privados cortaram o crédito para clientes de maior risco e priorizaram as grandes empresas que se financiavam no exterior. O resultado foi empoçamento do crédito e aumento dos "spreads" [diferença entre as taxas de captação dos bancos e as repassadas aos clientes].

Para reverter o quadro, o governo colocou os bancos públicos para emprestar e ganhar o mercado deixado pelas demais instituições. Às empresas exportadoras, que não conseguiam mais captar recursos e se financiar, o governo forneceu linhas especiais. Agora, os bancos privados buscam reduzir margens para retomar o espaço perdido no crédito.

"As políticas adotadas foram bem-sucedidas. Somente o corte do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) dos carros garantiu o emprego de 50 mil a 60 mil pessoas. A experiência mundial evidenciou que políticas macroeconômicas contracíclicas são políticas de Estado, e não de governos", afirma João Sicsú, do Ipea.

A despeito dos êxitos de curto prazo, no entanto, algumas distorções continuam atravancando o caminho para o desenvolvimento perene e sustentável do país. Uma das maiores, segundo especialistas, diz respeito aos gastos do governo.

Para Claudio Haddad, presidente do Insper, o nível atual da taxa de juros, entre 4% e 5% reais ao ano, não vai durar muito. "Se a política fiscal ficar como está, provavelmente teremos que voltar a subir a Selic em algum momento do ano que vem. Investimentos temporários -como em projetos de infraestrutura- são indicados em momentos de dificuldade. Não foi esse o tipo de despesa realizada, entretanto", disse.

"Nessa área, não há muito o que fazer. Não tem como voltar para trás o aumento salarial do servidor ou o do salário mínimo", afirma Alexandre Schwartsman, economista-chefe do Santander e ex-diretor do Banco Central.

A retirada dos benefícios tributários do IPI deve adiar o momento em que o BC tornará a puxar a taxa para cima, na opinião de Bráulio Borges, economista da LCA Consultores. "Muita gente que pretendia adquirir tais bens antecipou as compras, o que alivia eventuais pressões inflacionárias."

"O melhor momento para retirar esses benefícios é quando a iniciativa privada já tiver reagido com elevação de consumo e investimento", diz Sicsú.

"Marolinha não foi. O Brasil começou a se recuperar agora e ainda está longe de onde chegou no ano passado", afirma Schwartsman.


1 ano de crise

Tombo do mercado financeiro iniciado nos EUA afeta indústria, emprego e juros

Passado um ano desde a quebra do banco Lehman Brothers, nos Estados Unidos, o colapso total temido por economistas não se concretizou. Embora seja cedo para afirmar que a crise acabou -especialmente em países ricos, como EUA e os da zona do euro, onde a recessão perdura-, o ritmo de queda é menor em todo o mundo. Nos emergentes Brasil, Rússia, Índia e China, pelo contrário, a recessão técnica ficou para trás. O ritmo de crescimento pré-crise, contudo, segue distante.


Um ano de crise

CRÉDITO
Com a crise, os bancos ficaram mais seletivos para emprestar, com medo de calotes. O crédito escasseou e encareceu também no Brasil. Com isso, bancos públicos, como BB e Caixa, assumiram a dianteira para estimular o mercado.

VAREJO
O consumo das famílias se manteve aquecido durante a crise e foi um dos responsáveis por atenuar a queda do PIB brasileiro no último trimestre de 2008 e nos três primeiros meses deste ano. A crise foi sentida no varejo, mas, em áreas menos dependentes de crédito (como bens não duráveis), foi menor do que o temido

JUROS
O governo reduziu os juros cobrados em linhas do BNDES para estimular empresários a vencer a incerteza e investir. O Banco Central também reduziu a taxa básica de juros ao menor patamar da história

INVESTIMENTOS
No ano passado, o crescimento da economia estava acelerado. Com isso, as empresas planejavam expandir negócios quando a crise irrompeu e represou demanda e crédito. Além disso, com a queda do PIB, a confiança dos empresários se deteriorou e muitos esperam sinais mais claros de superação da crise para voltar a investir

ESTÍMULOS
Para auxiliar empresas que ficaram mais expostas à crise, o governo cortou impostos. A principal medida, que surtiu efeito, foi a redução de IPI a automóveis e eletrodomésticos da linha branca

EMPREGO
Desde setembro de 2008, a criação de postos de trabalho no Brasil diminuiu e, em dezembro, atingiu o pior resultado desde 1992. A recuperação começou em fevereiro, mas as vagas perdidas durante a crise ainda não foram reabertas. A indústria foi o setor mais afetado

Indústria aponta necessidade de ampliar nível de investimentos

FOLHA DE S. PAULO, 13 de setembro de 2009

Aumento no uso da capacidade instalada pressiona setor a investir em ampliação


Embora tenha ficado estável no segundo trimestre, o nível de investimentos deve começar a aumentar agora, estimulado pela ampliação do uso da capacidade instalada na indústria.

A tendência é que esse fator tenha nos próximos meses participação maior no crescimento do PIB (Produto Interno Bruto), puxado no segundo trimestre especialmente pelo consumo das famílias e pelo setor de serviços.

Segundo Flávio Castelo Branco, gerente-executivo da Unidade de Política Econômica da CNI (Confederação Nacional da Indústria), a indústria já utiliza em média 80% de sua capacidade -antes da crise, o percentual chegava a 83%.

Com a oferta crescente, o nível de utilização já está chegando a um patamar "justo". "A previsão de alta na demanda obriga as empresas a investir em sua ampliação para não perder espaço no mercado", disse Castelo Branco. "Começa a se aproximar a hora em que as empresas precisarão realizar novos investimentos."

A CNI considera que a crise não está "inteiramente superada", já que a queda de 1,2% do PIB (Produto Interno Bruto) em relação ao mesmo período do ano passado "explicita os danos ainda existentes".

O ambiente, porém, está mais favorável para as empresas investirem, afirma Paulo Francini, diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

"A dose de temor já diminuiu, e as empresas já incorporaram a sensação de que a crise aguda passou."

Para Francini, a ação do governo por meio do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para financiar os investimentos trouxe um estímulo para a indústria investir mais.

"Vamos colher esses frutos no final do ano. Não sabemos em que intensidade, mas sabemos que haverá retorno no nível de investimentos."

Para a compra de máquinas e equipamentos, o BNDES baixou a taxa anual de juros para 4,5% e alongou o prazo de financiamento para até dez anos, com dois de carência. O benefício vale até o fim deste ano.

A Fiesp considera que, apesar do retorno dos investimentos, a "verdadeira recuperação da atividade industrial ocorrerá apenas em 2010".

Segundo Julio Gomes de Almeida, professor da Unicamp e ex-secretário de Política Econômica, os investimentos já "caíram o que tinham que cair". Para ele, a tendência agora é de alta, mas o patamar pré-crise poderá ser alcançado apenas dentro de um ano. "Isso porque o tombo foi muito grande. Demora para recuperar."

A internet e a democracia brasileira

ALEXANDRE HOHAGEN, Folha de S. Paulo, 13 de setembro de 2009

Espera-se que o Congresso Nacional se previna contra medidas voltadas à ampliação do controle sobre os meios online


NOS ÚLTIMOS tempos, os benefícios que a web empresta ao cenário político tornaram-se visíveis em escala global.

A campanha presidencial de Barack Obama nos EUA, por exemplo, mostrou ao mundo o potencial que a internet tem para o engajamento do cidadão comum na discussão política.

Mais recentemente, mesmo sob o duro regime político do Irã, a rede mundial de computadores comprovou mais uma vez sua forte vocação democrática.
A internet vai além de favorecer a livre expressão. Ela permite a inclusão de candidatos e partidos com menos recursos e confere transparência às doações e à publicidade.

Esse é um movimento ao qual o Brasil não pode mais ficar alheio, ainda mais em meio à mobilização social pela ampliação da transparência das instituições políticas nacionais.

Por isso, vale acompanhar de perto as discussões que vêm acontecendo no Congresso Nacional, que está prestes a promover um grande avanço aprovando a liberação do uso da internet no processo eleitoral.

Trata-se de um projeto de lei aprovado na Câmara dos Deputados em junho e que deve
ir à votação no Senado nesta terça-feira. Ele inclui a regulamentação do papel que a web exercerá na chamada reforma eleitoral.

No país, a crescente utilização da internet por parte de candidatos, partidos e eleitores já é realidade. No entanto, na última eleição, as incertezas quanto ao que era permitido pela legislação inibiram o aproveitamento de tudo o que a rede tem a oferecer.

Entendimentos jurídicos diversos e decisões judiciais desencontradas colocaram em risco o delicado equilíbrio entre a livre manifestação das opiniões políticas e o estímulo ao debate eleitoral, de um lado, e o combate a eventuais comportamentos abusivos do outro.

Felizmente esse cenário parece estar perto do fim. Com mais de um terço da população com acesso à web no país, índice que cresce cerca de 15% ao ano, podemos esperar para 2010 algo semelhante ao ocorrido nos Estados Unidos no ano passado.

A iniciativa do Congresso fortalece as instituições políticas e avança na consolidação da democracia ao permitir que todo tipo de ferramenta online -sites, blogs, redes sociais, comunicadores instantâneos etc.- possa ser utilizado eleitoralmente.

O livre uso da internet eleva o grau de informação sobre candidatos, partidos e propostas. Também aproxima candidatos e cidadãos de maneira inédita ao possibilitar a interação direta e reativar a capacidade de mobilização social em torno de boas ideias. A aproximação também se dá com a regulamentação das doações online, desburocratizando a contribuição de pessoas físicas.

Outro ponto favorável do projeto é permitir a propaganda eleitoral paga pela internet. De uma tacada só, tal decisão desfaz uma inexplicável injustiça cristalizada na legislação contra os meios online, estimula a presença de conteúdos positivos na rede e cria um canal mais econômico de publicidade de massa para partidos e candidatos.

Com isso, barateia o orçamento das campanhas, incentiva o crescimento de uma indústria em franco desenvolvimento no país e gera empregos qualificados no curto prazo.

Mas aqui o Congresso deveria ir além, espelhando-se nos exemplos internacionais e apostando com menos timidez na web.

O projeto poderia ser menos restritivo, estendendo a propaganda paga a todos os sítios, independentemente da classificação de seu conteúdo, e também para as disputas de todos os cargos majoritários (além de presidente, senadores, governadores e prefeitos).

A Justiça Eleitoral ficaria encarregada de regular detalhadamente procedimentos que assegurem a igualdade de oportunidades e o respeito às circunscrições eleitorais, entre outras preocupações manifestadas pelos congressistas.

Na reta final da discussão, espera-se também que o Congresso Nacional se previna contra medidas voltadas à ampliação do controle sobre os meios online e que impliquem limitações às inovações propostas.

A própria experiência das últimas eleições no Brasil mostra que, ao mirarem em uma regulação acentuadamente restritiva, os legisladores podem acertar o alvo errado, matando o potencial democrático da web e gerando normas ineficazes em um território de abrangência mundial, como é o da internet.

A riqueza da internet reside justamente na liberdade de expressão que ela oferece e na horizontalidade de seu desenho, inclusivo e transparente. É hora de observar para que não ocorra a invalidação dos efeitos positivos da proposta, o que frustraria a grande expectativa da sociedade.

ALEXANDRE HOHAGEN é diretor-geral do Google na Améica Latina.