terça-feira, 15 de junho de 2010

‘Quem paga mais impostos são os pobres’, diz especialista

O GLOBO, 14 de junho de 2010

"O brasileiro quer eleger nas eleições de outubro um candidato que assuma o discurso radical pela redução da carga tributária". A conclusão é do cientista político Alberto Carlos Almeida, de 44 anos, do Instituto Análise, que realizou pesquisa em todas as regiões do país para escrever o livro “O Dedo na ferida: menos imposto, mais consumo” (Editora Record), lançado semana passada. Um dado obtido nos levantamentos, financiados por uma instituição financeira, mostra que 85% dos brasileiros sabem que o imposto está embutido nos preços das mercadorias que compra. Apesar disso, nenhum dos principais candidatos a presidente assumiu até agora a bandeira. Na avaliação de Almeida, Marina Silva (PV) tem mais chance do que José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) de defender a redução dos tributos.
A seguir, trechos da entrevista com o cientista político, que já publicou também “A cabeça do brasileiro” e a “A cabeça do eleitor”


O que o livro mostra de mais importante?
Alberto Carlos de Almeida: Esse é o primeiro estudo sistemático sobre o que a população brasileira adulta pensa dos impostos. A elite brasileira tem preconceito e nunca foi lá perguntar para a população se ela paga imposto. Você paga imposto quando compra um produto de vestuário? Você paga imposto quando compra um alimento?

E existia um senso comum de que as pessoas não tinham consciência disso?
Almeida: É. Acreditava-se que poucos no Brasil sabem que pagam imposto. Só aqueles que pagam imposto de renda. Não é verdade. Da população brasileira, 85% sabem que pagam imposto quando compram alguma coisa. Não sabem quanto pagam, mas sabem que pagam.

O livro afirma que as pessoas têm ideia que pagam de 1% a 10% de imposto nas compras…
Almeida: É muito mais. Mas também ninguém sabe ao certo quanto paga. Nosso sistema é complicado. O livro mostra o que a população gostaria que os impostos fossem reduzidos. O que sustenta o discurso de redução de impostos? Se reduzir imposto, você vai comprar porque o preço dos produtos vai ficar menor. A população acha que redução de imposto gera emprego.

Mas reduzir imposto não significa diminuir os serviços prestados pelo Estado?
Almeida: Uma das perguntas da pesquisa era sobre o que dá mais resultado para melhorar a saúde: colocar mais dinheiro, e para isso seria necessário aumentar os impostos, ou utilizar melhor os recursos. O resultado disparado foi: utilizar melhor os recursos existentes. Então, você vê numa campanha o político dizendo “vou investir mais R$ 1 milhão na saúde”. As pessoas não querem ouvir isso. Elas preferem ouvir: eu vou utilizar melhor os recursos. Esse é um discurso que as pessoas querem e os políticos não fazem.

No caso da eleição presidencial, os três principais têm origem política de esquerda. Não existe uma ideia de que reduzir imposto não é uma coisa de esquerda?
Almeida: Quem paga mais imposto no Brasil, proporcionalmente, são os pobres. Reduzir imposto beneficia os pobres.

O pensamento comum não liga redução de imposto ao Estado mínimo?
Almeida: Sim, mas não se aplica ao Brasil. Nós vivemos uma espécie de jabuticaba fiscal. Em todo o país do mundo, o imposto é progressivo. Quem ganha mais, paga mais. No Brasil, é regressivo. Então, o imposto é gerador de pobreza e desigualdade. No Brasil, reduzir imposto é discurso de esquerda.

Mas o mito é de que é um discurso de direita?
Almeida: No Brasil, há muito desperdício de recursos, muita corrupção. A nossa carga tributária é de 36% do PIB. Será que 6% disso não é corrupção? Se for, você reduz para 30% de imediato. Será que teria outros 6% que você poderia ganhar com a economia girando mais? O que nós temos é um sistema político que, quando você tem um problema, repassa a conta para a sociedade, e vai aumentando imposto. A sociedade não aguenta mais isso.

Um das perguntas da pesquisa condicionava a redução de impostos ao impedimento da expansão do Bolsa Família?
Almeida: A pergunta era: vamos cortar impostos, mas com isso não será possível aumentar o Bolsa Família, ou vamos manter os impostos como estão, mas vamos aumentar o número de beneficiários do Bolsa Família? As pessoas preferem cortar imposto e manter como está.

Mas quem é beneficiário não pode mudar a sua opção de voto, se algum candidato ameaçar o programa?
Almeida: A população acha que o Bolsa Família está consolidado. A pesquisa dizia que o programa seria mantido, não haveria redução. Só não haveria expansão. É muito barato, o Bolsa Família. É 0,4% do PIB. A nossa carga tributária é 36%.

E o efeito do corte sobre outros serviços?
Almeida: Foi perguntado se é melhor que o governo cobre imposto e esse dinheiro volte em forma de Pró-Jovem, Bolsa Família, Vale-Cultura, ou que o governo diminua o seu imposto e esse dinheiro fique no seu bolso para você usar. A maioria prefere que diminua o imposto. O brasileiro quer tomar decisões sobre o seu dinheiro. A CPMF foi muito educativa nesse sentido. Quando foi implementada, gerou uma expectativa de que a saúde melhoraria, e não melhorou. E quando tiraram a contribuição, não piorou. Está a mesma droga. Portanto, não faz diferença. Foi só para roubar, só para jogar dinheiro fora.

Por que os políticos não adotam o discurso da redução dos impostos?
Almeida: Os políticos não sabem que o eleitorado está maduro para isso. O livro está mostrando que o povo sabe muito mais do que a gente acha que ele sabe. O povo pobre mesmo, pouco escolarizado. Existe um acordo tácito entre os políticos para manter o sistema de patronagem. Redução de impostos realmente os obrigaria a serem eficientes. Tem que colocar funcionário público para trabalhar. Alguns políticos lá dentro vão ter de romper esse acordo em algum momento e mobilizar a sociedade. Quem fizer o discurso, vai ter muito voto, vai ser eleito. Se o Serra não assumir essa bandeira com ênfase, ele corre o risco não só de perder para a Dilma, mas também de perder de lavada.

O senhor vê perspectiva de um dos candidatos a presidente assumir esse discurso?
Almeida: A Dilma, não. O Lula acabou de falar sobre isso (a carga tributária). A minha resposta ao Lula é muito simples: com 10% (do PIB de carga tributária), não tem Estado. No caso do Brasil, com 36% (do PIB de carga tributária), não tem sociedade. A sociedade brasileira é economicamente sufocada pelo Estado. Vive para sustentar o Estado perdulário. Como a Dilma está encaixada nesta tradição, dificilmente ela compraria o discurso. O Serra vem mais ou menos dessa mesma tradição fiscalista. Talvez como uma ação pragmática, quando a Dilma começar a abrir vantagem. E hoje, talvez, a que tenha maior condição, maior liberdade de tomar decisão de adotar esse discurso, seja a Marina Silva. Se ela adotar esse discurso, ela passa a ser uma ameaça para o Serra.

Na orelha do livro, o senhor cita um discurso do Lula em que ele fala sobre a pretensão de permitir que todos os brasileiros comprem carros.
Almeida: Ele falou, mas não fez. É só zerar o PIS e Confins que estão embutidos na produção de automóvel. Vai faltar dinheiro? Não vai não. É só utilizar melhor o recurso existente. É só não ter mensalão.

Ex-prefeito de Maringá e ex-secretário da Fazenda sofrem condenação milionária

O DIÁRIO DE MARINGÁ, 14 de junho de 2010


O ex-prefeito de Maringá, Jairo Moraes Gianoto, e o ex-secretário de Fazenda, Luis Antônio Paolicchi, foram condenados, junto com mais 16 pessoas, a ressarcir a Prefeitura de Maringá por desvios praticados entre 1997 e 2000. Segundo o Ministério Público, o valor das sentenças, atualizado, ficaria na casa de R$ 500 milhões, a maior condenação, em valores, da história da cidade .

Os valores constam de duas sentenças proferidas pelo juiz Mário Seto Takeguma, da 1ª Vara Cível de Maringá, em março deste ano. Ambas, ainda não publicadas no Diário Oficial da Justiça, são referentes aos processos 196/2001 e 756/2002, ajuizados pela Promotoria de Defesa do Patrimônio Público de Maringá.

O valor a ser ressarcido na primeira ação, é de R$ 50,8 milhões, ainda na dependência de atualização monetária. Na segunda, é de R$ 3 milhões. O cálculo que o MP utilizou para chegar aos R$ 500 milhões, em valores de hoje, leva em conta as multas, honorários, além da correção monetária, previstos na sentança.

Em ambos os processos, Gianoto, Paolicchi e dois funcionários do setor de finanças da prefeitura, Jorge Aparecido Sossai e Rosimeire Castelhano Barbosa, aparecem como os principais responsáveis pelo rombo. Eles respondem, solidariamente, por um desvio de R$ 49 milhões.

Ao contrário dos chefes, Sossai e Rosimeire não ficaram ricos, segundo o juiz, mas tiveram participação fundamental para a série de desvios. Ambos ocupavam cargos estratégicos no setor de finanças da prefeitura, e, segundo a Justiça, sabiam dos desfalques, mas foram omissos.

De acordo com as investigações do Ministério Público, o dinheiro desviado durante a gestão de Gianoto serviu para a compra de fazendas, aeronaves, colheitadeiras, insumos agrícolas e veículos de luxo. Até cestas de Natal e presentes importados, distribuídos para amigos, políticos e autoridades maringaenses, foram comprados com o dinheiro desviado pelo esquema.

Deposto - Gianoto foi deposto em 2000, antes de completar o mandato. Segundo o Ministério Público, fez fortuna como prefeito, às custas da população, tornando-se próspero fazendeiro. Foi com dinheiro da prefeitura, por exemplo, que ele pagou parte da Fazenda Água Limpa, no Mato Grosso.

A mesma fonte de recursos serviu para abastecer outras duas fazendas, no mesmo Estado. Comprou duas colheitadeiras para a Fazenda Nova Mutum. Também comprou fertilizantes e soja para a Fazenda Sapucaia. Os insumos custaram o equivalente ao pago pelas duas colheitadeiras à época.

Mas a aquisição mais luxuosa, e cara, de Gianoto, foi uma aeronave, por R$ 554,6 mil, em valores do final da década de 90. A esposa de Gianoto, Neuza Aparecida Duarte Gianoto, também foi beneficiada pelo esquema. Recebeu R$ 26 mil em depósitos na conta corrente. E disse que nunca desconfiou que o dinheiro fosse ilícito.

Paolicchi, ex-secretário de Fazenda, também fez fortuna. Ele contava com um salário de R$ 3 mil, mas também comprou imóveis, carros de luxo e até um avião. Segundo a sentença, Paolicchi desviou dinheiro da prefeitura para comprar duas fazendas em Nova Mutum (MT).

Também comprou três colheitadeiras, contratou serviços de paisagismo para uma chácara, reformou apartamentos em Balneário Camboriú (SC), adquiriu uma Toyota Hilux e, a exemplo de Gianoto, comprou uma aeronave.

O ex-secretário municipal também depositou milhões de reais em contas de diversas empresas e "laranjas".

Entre os condenados está o ex-deputado federal, hoje prefeito de Jandaia do Sul, José Rodrigues Borba. Ele recebeu um cheque de Paolicchi no valor de R$ 92 mil , em valor da época, para quitar dívida com o INSS, garantindo com isso a sua aposentadoria. Segundo a sentença, o dinheiro já foi devolvido por Borba aos cofres públicos.

Mesmo assim, foi condenado, a exemplo dos demais réus, à perda dos direitos políticos, no caso dele por oito anos, além de multa de duas vezes o valor do cheque, a ser atualizado.

Condenação - Paolicchi, Gianoto, Sossai e Rosimeire foram condenados à devolução dos valores desviados, mais multa e suspensão por dez anos dos direitos políticos. Assim como os demais réus, eles podem recorrer da sentença.


Ex-deputado mensaleiro está envolvido nos desvios
Outro nome conhecido na sentença por desvio de dinheiro público da prefeitura de Maringá é do ex-deputado federal e atual prefeito de Jandaia do Sul, José Borba (PP),

Ele tornou-se conhecido no cenário político nacional após ser acusado de envolvimento no escândalo do mensalão na Câmara do Deputados. Ele renunciou em outubro de 2005, para evitar uma cassação e consequente perda de direitos políticos.

Borba recebeu quase R$ 100 mil de Gianoto para quitar uma dívida do INSS. A sentença explica que esse valor já foi devolvido, o que não livrou o prefeito de Jandaia do Sul da perda dos direitos políticos.

Borba disse que ainda não havia sido comunicado e que seus advogados vão recorrer. A procuradoria da Prefeitura de Jandaia do Sul lembrou que essa á uma decisão em primeira instância e que não se enquadra na nova Lei da Ficha Limpa, que prevê que suspensão de direitos políticos soa validas apenas em condenações colegiadas. Assim como os demais citados, Borba terá 15 dias para responder à Justiça, a partir da data da intimação.

Nas investigações do escândalo do mensalão, o nome de Borba aparece como beneficiário de R$ 2,1 milhões, que teriam sido repassados pelo publicitário Marcos Valério, suposto controlador do esquema. O processo continua em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF).

O criador e a criatura

O ESTADO DE S. PAULO, 15 de junho de 2010


Dilma Rousseff, estabeleceu o presidente Lula, será apenas um nome para preencher o que chamou de “vazio” na cédula eletrônica de 3 de outubro. “Eu mudei de nome e vou colocar a Dilma lá”, discursou ele na convenção do PT que homologou a candidatura da ex-ministra. Que outro governante, a não ser ele, teria a caradura de reduzir à absoluta insignificância a fiel seguidora a quem escolheu solitariamente para lhe suceder? Só mesmo um político que ama a si mesmo sobre todas as coisas e se tosta ao sol de uma superlativa popularidade poderia dizer com desprevenida franqueza o que desde sempre era óbvio a todos quantos acompanham a operação eleitoral lulista: a sua decisão de disputar, por interposta pessoa, o terceiro mandato que a lei lhe veda.

Lula não se pejou de humilhar a sua criatura, cuja incapacidade de respirar politicamente por si rivaliza com uma falta de apelo e carisma que resiste aos esforços dos melhores marqueteiros. Nem os 1.800 convencionais petistas reunidos domingo em Brasília tiveram algum momento de genuína empolgação ao longo do seu discurso de 50 minutos - salvo quando ela se desmanchava em louvações ao patrono, o que fazia com patética insistência. Mas, para ele, a dignidade da candidata, para não falar em autonomia, é o que menos importa. Já se sabe que, tão logo termine a Copa do Mundo, Lula mergulhará ainda mais fundo do que até aqui na operação de sair pedindo votos para si sob outro nome.

O teatro começou na própria convenção, concebida para exaltar a condição feminina de Dilma. Nas pesquisas, como se sabe, a maioria das mulheres prefere o adversário José Serra. O artificialismo da montagem ao menos foi coerente com o confronto postiço armado por Lula entre “nós e eles, pão, pão, queijo, queijo”, como se os aspirantes ao Planalto fossem de fato ele e o antecessor Fernando Henrique. À candidata em carne e osso resta falar em “seguir mudando”, mas “com alma e coração de mulher”. Pode-se contar, durante a campanha, com uma proliferação de platitudes do gênero, testando a paciência daquela parcela do eleitorado que ainda acredita que os candidatos devem lhe oferecer “pão, pão, queijo, queijo”, como sinônimo de propostas e prioridades.

Para Serra, trata-se de um desafio. Não, evidentemente, porque lhe faltem uma coisa ou outra. Mas porque, nesta campanha que o lulismo fará tudo para manter engessada no molde plebiscitário, será pouco para o ex-governador contrapor o noviciado de sua oponente com a sua indesmentível experiência, como tornou a assinalar no sábado, em Salvador, na convenção do PSDB que ratificou a sua indicação. “Não comecei ontem e não caí de paraquedas”, disse então. Ele terá de se haver com o presidente que não se cansará de dizer que estará na cédula com outro nome. Até a convenção, Serra parecia pensar duas vezes antes de não criticá-lo. Chegou a afirmar, numa espécie de fuga para a frente, que Lula “está acima do bem e do mal”.

Bem diverso foi o seu tom na festa tucana. Dessa vez, atacou a presidência imperial de Lula, a sua convivência com a corrupção, o aparelhamento do Estado, as afinidades do presidente com ditadores. Duas passagens de sua fala foram especialmente pontudas. Na primeira, lembrou que “o tempo dos chefes de governo que acreditavam personificar o Estado ficou para trás há mais de 300 anos”, para emendar: “Luís XIV achava o que o Estado era ele. Nas democracias e no Brasil, não há lugar para luíses assim.” Na segunda, pregou “o repúdio da sociedade” a quem “justifica deslizes morais dizendo que está fazendo o mesmo que outros fizeram ou que foi levado a isso pelas circunstâncias”. Estes “são os neocorruptos”.

Serra teria decepcionado os 8 mil militantes presentes no evento que abre a temporada eleitoral propriamente dita se não fizesse as suas críticas mais pertinentes a Lula e ao lulismo - ainda mais sob o impacto da revelação de que arapongas aparentemente a serviço da campanha de Dilma quebraram o sigilo fiscal do vice-presidente executivo do PSDB, Eduardo Jorge Caldas Pereira.

Mas, perante o eleitorado, Serra não poderá transformar o incensado Lula em alvo nem fingir que ele não existe.