terça-feira, 6 de abril de 2010

Procuradoria reage e protesta contra a 'Lei da Mordaça' de Maluf

Projeto de lei de líder nacional do PP abre a possibilidade de condenação de procuradores se for comprovada promoção pessoal, má-fé ou perseguição política. Segundo os procuradores, o projeto vai limitar a atuação do MP no combate à corrupção


ESTADÃO ONLINE, 06 de abril de 2010

A Procuradoria Regional da República da 3ª Região (PRR-3) vai sediar nesta terça-feira, 6, a partir das 11 horas, ato público de repúdio ao Projeto de Lei nº 265/2007, conhecido como "Lei da Mordaça" ou "Lei Maluf". Iniciativa do deputado federal Paulo Maluf, o projeto de lei prevê sanções aos autores de ações civis públicas, populares e de improbidade promovidas contra agentes públicos quando ajuizamento tiver sido temerário, de má-fé, para promoção pessoal ou por perseguição política. O projeto de lei atinge não apenas o Ministério Público, mas o cidadão ou associações que tiverem promovido, nas mesmas circunstâncias imprecisas e indeterminadas, ações populares e ações civis públicas. A mobilização visa mostrar à sociedade que o projeto de lei restringe independência do Ministério Público e o intimida a não cumprir, com autonomia, deveres previstos na Constituição.

A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) realizará um ato contra o projeto de lei, em Brasília, a partir das 15 horas, na Procuradoria Geral da República (PGR). Às 14 horas a Procuradoria Regional da República da 5ª Região (PRR-5) reunirá em sua sede, no Recife, representantes de vários ramos do Ministério Público e de associações de classe para protestar contra aprovação da Lei da Mordaça. Atos em outras cidades também estão sendo organizados para ocorrer amanhã em todo o Brasil. Segundo os procuradores, se aprovada, a "Lei da Mordaça" traria enorme prejuízo à sociedade, pois limitaria em muito a atuação de todo Ministério Público no combate à corrupção e à impunidade. Manifesto de repúdio ao projeto de lei será lido no ato. Além do MPSP e do MPF, outros ramos do Ministério Público, membros e associações da Justiça, representantes de entidades civis e ONGs foram convidados a participar do ato na PRR-3, que também será aberto ao público em geral.

Recentemente, o Ministério Público tem sido alvo de críticas por causa de sua ação contra políticos e associações. O próprio Maluf já criticou a ação dos procuradores por conta das investigações que resultaram na inclusão de seu nome na lista vermelha da Interpol. No dia 23 de março, ele anunciou que vai entrar com um processo contra a Promotoria Distrital de Nova York, nos Estados Unidos, que incluiu seu nome na lista. Em nota, Maluf informou ter contratado os advogados norte-americanos Bryan Skarlatos e Sharon McCarthy, do escritório Kostelanetz & Fink, LLP, para este fim.

Maluf afirma que a Promotoria Distrital de Nova York agiu de maneira "arbitrária e não condizente com o que rege o Direito Internacional e a soberania das nações livres". Na nota, o deputado insiste que a inclusão de seu nome e de Flávio Maluf, seu filho, no alerta vermelho é uma "ação ilegal, descabida e intempestiva".

O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), afirmou, no último dia 1, ser vítima de "discriminação e perseguição política" do Ministério Público, que pede a devolução aos cofres públicos de recursos recebidos pelo senador nos últimos cinco anos que fizeram seus rendimentos ultrapassarem o teto salarial do funcionalismo público, hoje, em R$ 26.723.


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Fernando Grella Vieira, procurador-geral de Justiça: ''Querem inibir o promotor isento''

FAUSTO MACEDO, ESTADÃO ONLINE, 22 de março de 2010

Fernando Grella Vieira, reeleito para o cargo de procurador-geral de Justiça com 1.147 votos - maior placar já obtido na história das eleições para a chefia do Ministério Público de São Paulo -, planeja equipar a instituição, concluir projetos aos quais deu início no primeiro mandato (2008/2009), dar celeridade ao combate à improbidade. Mas a maior preocupação de Grella está em Brasília, precisamente na Câmara, que se prepara para votar projeto que inquieta sua classe porque prevê punição aos promotores que "agirem com má-fé". "É uma clara tentativa de intimidação", adverte o procurador, inconformado com o fato de o governo federal ter apoiado a iniciativa.

A lista com o nome de Grella e de outros dois procuradores - João Viegas, com 408 votos, Márcio Christino, 397 - chegou às mãos do governador José Serra (PSDB) sábado à noite. Cabe ao chefe do Executivo escolher o procurador-geral.[Nota do Instituto Ame Cidade: Neste mesmo dia o governador José Serra assinou a nomeação de Grella]


O que vai fazer se for reconduzido?
Investir mais em equipamentos e instalações físicas para que os promotores tenham melhores condições. Investir em ciência da tecnologia, na construção do sistema de informatização e do banco de dados sobretudo na área criminal. Gestão profissional, com planejamento.

Quais as frentes de atuação?
Estabelecer diretrizes e metas especialmente com relação ao combate ao crime organizado e na esfera da tutela coletiva na infância e juventude e, mais diretamente, na educação, pelo aspecto preventivo. A ofensiva contra a improbidade é prioritária. Recebemos o laboratório de lavagem de dinheiro em convênio com o Ministério da Justiça. Estamos recebendo software do Ministério Público Federal para tratamento de dados decorrentes da quebra de sigilo bancário que vai simplificar e dar eficiência ao rastreamento de contas. Não vamos mais receber documentos em papel dos bancos. As informações virão por meio eletrônico e autenticadas pelo Banco Central.

Para onde caminha o Ministério Público?
Para o papel de coadjuvante no aperfeiçoamento das políticas públicas e valorização da cidadania, do regime democrático. Na medida em que conseguimos colaborar com os Poderes do Estado para a valorização de condições de dignidade e da probidade contribuímos para a construção da cidadania e conscientização das pessoas.

O Congresso vai votar projeto que agita promotores.
Será um equívoco porque situações de abusos são raras.

Os abusos são coibidos?
Sim, para essas situações já existem mecanismos legais suficientes para a devida punição. O projeto representa remédio excessivo e amargo que pode matar o combate à corrupção. Querem inibir o promotor isento, cerceamento inadmissível. Houve alguns poucos casos no passado que poderiam ter conotação política. Há meios legais para coibição, as corregedorias e o Conselho Nacional do Ministério Público, que têm competência para apurar e impor penalidades cabíveis.

O que o preocupa?
A proposta traz conteúdo subjetivo que vai gerar insegurança. Ao contrário do que querem fazer crer, vão inibir a atuação da promotoria. Não tememos apurações. Se há situações de abusos devem ser punidas. Para isso já há lei. Se entendem que não é suficiente, que precisa de aperfeiçoamentos, vamos aprimorá-la. Não podemos aceitar norma tão aberta e tão subjetiva que cria insegurança e vai desencorajar qualquer promotor a atuar com independência.

A proposta é do deputado Paulo Maluf, que a Interpol procura.
O projeto é dele, mas recebeu apoio de vários outros partidos e do próprio partido do governo que, recentemente, revelou todo seu interesse em que essa matéria fosse pautada na Câmara. É isso que nos preocupa, o interesse de vários setores do Congresso e do governo. Não sei o motivo real por trás disso, mas há interesse do governo. Cabe ao Ministério Público ir ao Congresso, dialogar com as lideranças, demonstrar que o projeto vai causar grande prejuízo para a sociedade. Uma norma que penaliza eventual ação temerária de promotor tem sentido altamente subjetivo.

No caso Bancoop o PT apontou linha pró-Serra na promotoria.
Isso não existe. O inquérito da Bancoop foi distribuído naturalmente a um promotor criminal (José Carlos Blat). Ele é o promotor natural, não há designação especial. Ele não atua em grupo especial, mas sob independência funcional plena. Conduz livremente o inquérito. Esse tipo de colocação visa a criar embaraço. O promotor está requerendo medidas que entende pertinentes. Está no exercício regular da função institucional.

Não há nichos do PSDB na sua instituição?

Seria absurdo. Promovemos rotineiramente ações de inconstitucionalidade, pedidos de intervenção, sequestros e outras medidas cautelares contra órgãos estaduais, como deve ser feito, seja o governo deste ou daquele partido.


QUEM É
FERNANDO GRELLA VIEIRA
Procurador-geral de Justiça de São Paulo, recordista de votos nas eleições para o cargo (67% dos 1.694 votos no pleito realizado sábado). Dirige o Ministério Público desde março de 2008. Ingressou na instituição em 1984. Foi secretário-geral da Confederação Nacional do Ministério Público. Integrou o Conselho Superior do Ministério Público paulista.

Projeto da ''mordaça'' é pivô de conflito com o Legislativo

Descontentes com atuação de procuradores, alguns parlamentares têm rejeitado projetos e indicações de nomes


ESTADÃO ONLINE, 22 de março de 2010

A volta para a pauta de votação do plenário da Câmara do projeto da "mordaça" expõe a relação de má vontade de parlamentares com o Ministério Público Federal. Responsável por investigar e denunciar eventuais ilegalidades cometidas por agentes públicos, incluindo deputados e senadores, o Ministério Público tem sofrido derrotas no Congresso e enfrentado dificuldades nas votações.

O projeto entrou na pauta de prioridades da Câmara para as próximas semanas, defendido pelo PP, PR e PTB, em acordo dos líderes com o presidente da Casa, Michel Temer (PMDB-SP). Insatisfeitos com a atuação de procuradores, alguns setores só concordaram em apoiar a votação do projeto de reestruturação do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), encaminhado ao Congresso no ano passado, se o projeto da "mordaça", também entrasse na pauta.

De autoria do deputado Paulo Maluf (PP-SP), a proposta responsabiliza pessoalmente e com previsão de pagamento de indenização o integrante do Ministério Público que supostamente agir de forma política. Maluf é processado pelo Ministério Público e foi incluído recentemente na lista da Interpol, podendo ser preso em 188 países se deixar o Brasil.

Na semana passada, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara deu mais um exemplo de indisposição com os procuradores, rejeitando e mandando para o arquivo o projeto de revisão na lei de ação civil pública. As mudanças na lei, que completa 25 anos, facilitariam a ação pública, o instrumento legal para processar políticos e grandes empresas, por exemplo.

No ano passado, o Senado também demonstrou insatisfação com os procuradores. O plenário da Casa rejeitou a indicação de dois nomes do Ministério Público para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Denunciado pela procuradoria da República no chamado "mensalão", o deputado José Genoino (PT-SP) reconhece que a má vontade de setores da Casa com o Ministério Público, mas diz que a relação já foi bem pior.

O petista defende projetos de interesse do Ministério Público e o fortalecimento da instituição. "Não podemos misturar a instituição com algumas pessoas que exageram, nem fazer política com o retrovisor. Não posso transformar uma questão pessoal em institucional", afirmou.

O deputado Flávio Dino (PC do B-SP), ex-juiz federal, diz que a resistência tem raiz na expansão e fortalecimento da instituição. " O Ministério Público trata de temas sensíveis aos parlamentares", avalia.

Polícia internacional procura Paulo Maluf

Dados do deputado estão no alerta máximo do site da Interpol; fraude e conspiração são os crimes atribuídos a ele


ESTADÃO ONLINE, 20 de março de 2010

Procurado. Paulo Maluf, deputado (PP-SP), foi parar na mais importante página da Interpol que exibe em todo o mundo simultaneamente dados pessoais e tipos de acusação que pesam contra alvos de autoridades policiais e judiciais conectados à rede da Polícia Internacional. Fraude e conspiração, registra o endereço virtual da Interpol, são os crimes atribuídos ao ex-prefeito (1993-1996) de São Paulo.

Maluf teve nome e duas fotos incluídos na difusão vermelha da Interpol por solicitação dos Estados Unidos. A difusão vermelha é alerta máximo - categoria mais grave entre as escalas de enquadramento de suspeitos. Ele foi denunciado pela promotoria americana perante o Grande Júri de Nova York como beneficiário da conta Chanani, para a qual realizou remessas que somam US$ 11,68 milhões, entre janeiro e agosto de 1998.

A investigação indica que a Chanani foi utilizada para transferência de fundos e de ativos para contas secretas na Ilha de Jersey, paraíso fiscal do Canal da Mancha, e para "efetuar pagamentos relacionados com campanhas eleitorais políticas".

O promotor de Justiça Silvio Marques, especialista em ações contra improbidade, esclareceu que Maluf deu início a negociações para um acordo com os Estados Unidos a fim de ter seu nome excluído da folha corrida da Interpol.

Segundo Marques, Maluf não pode ser preso no Brasil, signatário da Interpol, e removido para os EUA. "Os americanos teriam que requerer extradição, só que a Constituição veta a extradição de brasileiro nato", disse. Mas o ex-prefeito não pode sair do País - corre o risco de ser capturado por agentes policiais.

"Lamentável que o ex-prefeito, procurado no mundo inteiro, tenha conseguido sucesso no anteprojeto de lei que busca claramente intimidar o Ministério Público", protestou Marques, em alusão à proposta de Maluf que deverá ir a plenário da Câmara na próxima semana e que prevê punição pesada a promotores e procuradores que supostamente agirem com má-fé ou movidos por interesses políticos. "Maluf está agindo em causa própria e de políticos corruptos."

O promotor ressaltou que ações contra Maluf no Brasil, que podem prescrever em um ano, estão sob apreciação do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal.

"Cabe ao Estado brasileiro adotar enérgicas providências contra tamanho acinte, desassombrado abuso, perpetrado contra o Poder Legislativo nacional e contra a soberania nacional", protesta o criminalista José Roberto Batochio, defensor de Maluf.