quinta-feira, 20 de maio de 2010

Por unanimidade, Senado aprova projeto Ficha Limpa

O GLOBO, 20 de maio de 2010


Sob forte pressão popular, o Senado aprovou nesta quarta-feira, por unanimidade dos presentes (76 senadores), o projeto Ficha Limpa, que veta a candidatura de políticos com condenação em instâncias colegiadas da Justiça . O projeto segue agora para a sanção presidencial. Mas a aprovação de uma emenda de redação, nesta quarta, provocou polêmica e pôs em dúvida o verdadeiro alcance e a abrangência da lei. As novas dúvidas se somam à polêmica sobre a vigência ou não das novas regras para as eleições deste ano. A palavra final caberá ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Para a aprovação ocorrer uma semana após a votação na Câmara, o Senado adotou entendimento que permitiu a apreciação da proposta mesmo com a pauta trancada por medidas provisórias e as urgências dos projetos do pré-sal. O clima foi de festa e euforia no plenário.

Há juristas que entendem que, se a lei for sancionada antes de 9 de junho, as regras valerão para as eleições deste ano. Mas reconhecem que prejudicados pela lei poderão levar o caso à Justiça. A emenda de redação aprovada nesta quarta abriu margem à interpretação de que a nova lei só valerá para condenações futuras - ou seja, quem for condenado em segunda instância a partir da sanção da lei. Os senadores modificaram o texto e, em alguns artigos, onde se lia "os que tenham sido condenados", o texto aprovado diz: "os que forem condenados".

Segundo o relator do projeto no Senado, Demóstenes Torres (DEM-GO), foi só emenda de redação para harmonizar o texto. Mas deputados que trabalharam no projeto acreditam que a mudança altera o mérito.
- Modificaram o texto para que não haja dúvida de que só vale para condenações futuras. Isso é ruim. Dizem que a lei não pode retroagir para não prejudicar, mas prejudicar a quem? O problema é que o Ficha Limpa não pode dar aval para aos fichas-sujas de ontem - disse o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ).

Senadores comemoram a aprovação do projeto
Para o relator do projeto na Câmara, José Eduardo Cardozo (PT-SP), e o deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), a alteração do Senado foi de mérito. Dá margem ao entendimento de que não abrangerá processos pendentes, só condenações futuras.
- Na forma como estava na redação da Câmara, a eficácia era imediata e valeria para processos pendentes. Mas a nova redação tem uma projeção para o futuro. Elimina uma discussão jurídica - afirmou Cardozo.

O secretário-geral da OAB, Marcus Vinicius Coelho, disse que o melhor teria sido manter a redação da Câmara, mas que há no projeto outro dispositivo que deixa claro que se aplica a processos em andamento.
- A nova redação pode gerar dúvidas de interpretação no sentido de se aplicar apenas no futuro, mas o artigo 3 da lei diz que os recursos dos que se encontram condenados podem ser aditados após a aprovação da lei (Ficha Limpa). Esse artigo se aplica às condenações já existentes.

Segundo Demóstenes, nenhuma lei pode retroagir para prejudicar, por isso realmente só valeria para condenações futuras.
- Você não pode usar uma lei retroativamente para prejudicar ninguém. Casos com julgamentos definitivos não serão atingidos pela lei. Isso sempre esteve claro, mas os processos em andamento serão abrangidos por ela - afirmou Demóstenes.

Pelas regras atuais - sem a vigência do Ficha Limpa -apenas políticos condenados definitivamente, em última instância, são impedidos de concorrer. A proposta aprovada nesta quarta veda a concessão do registro eleitoral a políticos condenados na Justiça por crimes graves como cassação de mandato, crimes contra a vida, por tráfico de drogas ou improbidade administrativa. O texto amplia o prazo de inelegibilidade de três para oito anos.

No projeto aprovado, a condenação que torna o político inelegível só valerá se o julgamento se der em instância colegiada (decisões tomadas por mais de um juiz). A proposta permite que o condenado recorra a uma instância superior para tentar suspender a inelegibilidade e concorrer. A suspensão tem que ser aprovada por um colegiado de juízes e provocará a tramitação prioritária do processo.

- O projeto traduz a indignação da sociedade com a classe política - afirmou o líder do PT, Aloizio Mercadante (SP).

O líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM) também comemorou:
- Não podíamos virar as costas para a sociedade e não viramos.

O senador Pedro Simon (PMDB-RS) endossou:
- Hoje termina o Brasil conhecido pela impunidade. Está provado que para mudar é preciso que a sociedade se mobilize.
Projeto chegou à Câmara com 1,3 milhão de assinaturas

Conhecido como Ficha Limpa, o projeto de iniciativa popular chegou à Câmara em setembro do ano passado, com 1,3 milhão de assinaturas e defendido pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral. Vetava candidaturas dos políticos com condenação, por crimes graves, em primeira instância. Encontrou resistências nas bancadas e acabou sendo engavetado. No início deste ano, o presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB), criou grupo de trabalho para tentar um texto alternativo, que viabilizasse a votação do projeto. O grupo flexibilizou o texto, impedindo a concessão de registro apenas em casos de condenações por órgãos colegiados.

Novamente houve resistência e outro acordo foi fechado, com nova flexibilização: permitir que condenados possam recorrer a instância superior, para tentar suspender a inelegibilidade. O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB), chegou a dizer que o projeto só era prioritário para a sociedade, e não para o governo. Mas, pressionados, governistas acabaram votando a favor do texto.

Tudo limpeza


Conheça os principais pontos do projeto Ficha Limpa

Saiba quais são os principais pontos do projeto Ficha Limpa, aprovado, por unanimidade, no Senado .

1 - Veta candidaturas de políticos com condenação na Justiça, nos julgamentos em instâncias colegiadas (decisão de mais de um juiz)

2 - Amplia de 3 para 8 anos a inegibilidade

3 - Permite que um político condenado por órgão colegiado recorra a uma instância superior, para tentar suspender a inelegibilidade. Neste caso, o tribunal superior terá que decidir, também de forma colegiada e em regime de prioridade, se a pessoa pode ou não concorrer

Serão abrangidos pela proposta:

- Os crimes dolosos, onde há a intenção, e com penas acima de dois anos. Por exemplo, tráfico de entorpecentes, crimes contra a vida, a economia popular, o sistema financeiro e o meio ambiente, entre outros

- Os condenados por atos de improbidade administrativa. Geralmente os que exercem cargos no Executivo e os ordenadores de despesa

- Os que tiverem seus mandatos cassados por abuso de poder político, econômico ou de meios de comunicação, corrupção eleitoral e compra de votos, entre outros

- Os condenados por crimes eleitorais que resultem em pena de prisão. Estão fora da lista os crimes eleitorais em que os políticos são punidos com multa

- Os que forem condenados, em decisão transitada em julgado, por crimes graves

- Os que tiverem sido excluídos do exercício da profissão, por algum crime grave ético-profissional. Aqui incluem-se os casos de pessoas que tiverem seus registros profissionais cassados

- Os eleitos que renunciarem a seus mandatos para evitar processo por quebra de decoro também ficam inelegíveis nos oito anos subsequentes ao término da legislatura


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sobre o Ficha Limpa

Justus culpa Bibinho pelas irregularidades da Assembleia Legislativa

GAZETA DO POVO, 20 de maio de 2010

Em entrevista ao telejornal da Rede Massa, presidente do Legislativo procura se eximir da responsabilidade pelas ilegalidades e diz que não renuncia


O presidente da Assembleia Legislativa do Paraná, deputado Nelson Justus (DEM), afirmou ontem que o ex-diretor-geral da Casa, Abib Miguel, o Bibinho, é o grande responsável pelo desvio de dinheiro dos cofres do Legislativo e por todas as irregularidades mostradas na série de reportagens “Diários Secretos”, da Gazeta do Povo e da RPCTV. Justus assegurou ainda que não pretende se afastar do cargo, como vem sendo pressionado a fazer.

Em entrevista ao telejornal da Rede Massa de Televisão e ao jornal Estado do Paraná, Justus procurou se eximir da responsabilidade pelas irregularidades na Assembleia. Afirmou que não sabia das ilicitudes e que não tem dúvida de que os crimes descobertos pelo Ministério Público Estadual (MP) foram cometidos também nas gestões passadas.

Os últimos presidentes da Assembleia, antes de Justus, foram Hermas Brandão (ex-PSDB, hoje presidente do Tribunal de Contas do Estado), Orlando Pessuti (PMDB, hoje governador), Caíto Quintana (PMDB, que continua como deputado) e Aníbal Khury (já falecido).

Nas entrevistas, Justus deu a entender que existiam duas Assembleias Legislativas no Paraná – uma comandada por ele e a outra chefiada por Abib Miguel. Essa última seria, no entendimento de Justus, a responsável pelas ilegalidades. “A Assembleia tem uma administração praticamente terceirizada e ao longo dos anos é a mesma”, disse, citando que Bibinho tinha um poder gigantesco dentro da Assembleia e que, por causa disso, conseguiu empregar funcionários fantasmas para desviar dinheiro público sem que ele tivesse conhecimento.

“Eu não posso dizer que sabia [das irregularidades]. Como é que eu poderia saber de funcionários que estavam contratados, agricultoras fantasmas que recebiam valores altos sem trabalhar? Não sabia de jeito nenhum”, disse Justus. “Compete a ele [Bibinho] administrar a Casa e não ao presidente e nem ao primeiro-secretário [cargo ocupado atualmente pelo peemedebista Alexandre Curi, neto de Aníbal Khury]”. Justus disse que confiava no ex-diretor-geral.

Justus, em nenhum momento durante as entrevistas, se referiu ao fato de que o presidente da Assembleia, juntamente com o primeiro-secretário, são os responsáveis legais por assinar a contratação e demissão dos servidores da Casa.

Ladrão, não
Na entrevista ao telejornal da Rede Massa, Justus foi questionado se era “ladrão”. Prontamente respondeu que “não”. E afirmou que qualquer cidadão pode ter acesso à declaração de bens dos políticos (inclusive a sua), que é entregue ao Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE).

Reportagem da Gazeta do Povo e da RPCTV de 7 de abril mostrou, porém, que a declaração de bens apresentada por Justus na última eleição ao TRE não está completa. O documento omitiu da Justiça Eleitoral que Justus é sócio de uma rádio de Guaratuba, no litoral do Paraná. Outra sócia da emissora é Isabel Stein Miguel, filha de Bibinho – a quem agora o presidente da Assembleia imputa todas as irregularidades e crimes cometidos dentro da Assembleia.

Justus ainda criticou a postura adotada pela Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná (OAB-PR), que iniciou o movimento “O Paraná que queremos”, contra a corrupção na Assembleia. A campanha da OAB já conta com o apoio de mais de 50 entidades e empresas. “A OAB se aproveitou do momento”, disse Justus.

Ao fim da entrevista na televisão, Justus disse que não cogita renunciar à presidência da Assembleia. Afirmou ainda que disputará a eleição deste ano e que vai se reeleger deputado estadual. Apesar disso, ele confidenciou que não pretende ser presidente da Casa novamente.

Ao jornal Estado do Paraná, o presidente da Assembleia ainda reclamou da série de reportagens “Diários Secretos”, da Gazeta do Povo e da RPCTV. Segundo Justus, a cobertura jornalística teria atrapalhado o processo de transparência e modernização que ele vem conduzindo dentro da Assembleia.

Nada a declarar
O presidente da OAB-PR, José Lúcio Glomb, não quis se manifestar sobre a declaração de Nelson Justus. O advogado Alessandro Silvério, que defende Abib Miguel, foi procurado pela reportagem, mas disse que preferia não se manifestar sobre as declarações de Justus.

Bibinho está preso há quase um mês acusado de chefiar uma quadrilha suspeita de desviar da Assembleia pelo menos R$ 26 milhões (valor não corrigido) – montante que pode ultrapassar R$ 100 milhões, segundo estimativa do Ministério Público. O MP apresentou duas denúncias à Justiça contra Bibinho e contra os ex-diretores de administração da Assembleia, José Ary Nassiff, e de pessoal, Cláudio Marques da Silva. Os três são acusados de formação de quadrilha, desvio de dinheiro, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro.

Cargos em comissões viram objeto de cobiça

GAZETA DO POVO, 20 de maio de 2010

Após serem obrigados a ter no máximo 23 comissionados em seus gabinetes, deputados estaduais pressionam para nomear apadrinhados nas 19 comissões da Assembleia Legislativa


Depois da aprovação da nova lei que determina que cada deputado estadual só pode dispor em seu gabinete de 23 funcionários comissionados, parlamentares estão de olho nos cargos das 19 co­­­­missões da Assembleia Legislativa do Paraná para abrigar apadrinhados políticos. A pressão pela nomeação de funcionários comissionados, de indicação política, para trabalhar nas comissões causou polêmica ontem no plenário.

O deputado Tadeu Veneri (PT) pediu que, dos 13 cargos previstos por lei para cada comissão, apenas um seja de livre nomeação do presidente do grupo. Os demais deveriam ser preenchidos por concurso público, para evitar nomeações de apadrinhados políticos.

Irritados com o posicionamento do petista, alguns parlamentares classificaram o discurso como demagogo. No entanto, o presidente da Casa, Nelson Justus (DEM), garantiu a Veneri que os cargos das comissões serão “congelados” até a realização de um concurso.

Como a Assembleia conta atualmente com 19 comissões – entre permanentes e temporárias –, 247 funcionários poderiam ser nomeados para elas. Para pagar essa quantidade de funcionários, cada comissão pode gastar até R$ 51.360 mensais, o que dá um valor total de quase R$ 1 milhão na Assembleia inteira.

Veneri revelou que alguns deputados já estão assediando e pressionado os presidentes de comissões para conseguir algumas nomeações para si. “A ganância parece que não tem fim. Se alguém está com problema para nomear seus apaziguados, mande para a fila de emprego e não para esta Casa”, disse em discurso no plenário. “Radicalize, presidente [Nelson Justus]. Não assine essas nomeações [às comissões].”

A denúncia de Veneri foi corroborada por Rosane Ferreira (PV), que preside a Comissão da Mulher. “Me causou estranheza a possibilidade de ceder cargos comissionados a outros parlamentares. Não era esse o acordo”, argumentou, em apoio ao petista.

O líder do governo, Luiz Cláudio Romanelli (PMDB), também defendeu o posicionamento de Veneri e disse que “é hora de pés no chão, de reduzir despesas”. Segundo o peemedebista, as comissões devem permanecer com o número mínimo de funcionários para continuar funcionando. Para ele, as novas nomeações só deveriam ser feita com servidores concursados.

Em resposta a Veneri, Justus garantiu que não irá permitir que “sejam cometidos desatinos” na Casa. “Fique sossegado, deputado. Independentemente de acordos, é preciso da aquiescência do presidente [para qualquer nomeação]. Os cargos das comissões serão congelados como reserva para os concursos, que é um sonho desta Casa”, declarou.

Alguns parlamentares, no entanto, criticaram Veneri pelo fato de o petista ter afirmado, sem revelar nomes, que há pressão de deputados para terem acesso a nomeações nas comissões. O mais veemente foi Nereu Moura (PMDB). Para o peemedebista, Veneri agiu com demagogia apenas para ter espaço na imprensa. “Os cargos existem. Se forem preenchidos por pessoas qualificadas, qual o problema?”, indagou. “Não podemos fazer concurso em ano de eleição.”