sexta-feira, 21 de maio de 2010

Polícia Federal procura 91 por crimes ambientais no PR e outros quatro estados

GAZETA DO POVO, 21 de maio de 2010

Operação Jurupari ocorre em diversos municípios de Mato Grosso, São Paulo, Paraná, Rio Grande Sul e Espírito Santo, com objetivo de reprimir as práticas ilegais na região, principalmente com os produtos provenientes do interior e do entorno de áreas


A Polícia Federal (PF) deflagrou uma operação para prender 91 suspeitos de extrair, transportar e comercializar ilegalmente produtos florestais na Amazônia mato-grossense. A Operação Jurupari ocorre em diversos municípios de Mato Grosso e nos Estados de São Paulo, Paraná, Rio Grande Sul e Espírito Santo, com objetivo de reprimir as práticas ilegais na região, principalmente com os produtos provenientes do interior e do entorno de áreas protegidas. Os agentes também cumprem 91 mandados de busca e apreensão.

Um dos mandados de prisão que será cumprido nesta sexta-feira (21) é contra um empresário de União da Vitória, no Sul do Paraná. Ele é dono de madeireiras na cidade do interior do estado e também em Cuiabá, capital do Mato Grosso. De acordo com a assessoria de imprensa da Polícia Federal, ele é acusado de ter cometido nove crimes ambientais no Paraná e no Mato Grosso.

A prisão preventiva do empresário foi decretada pela 4ª. Vara Federal de Cuiabá. A Polícia Federal de Curitiba deveria cumprir o mandado de prisão do empresário em União Vitória. Mas, segundo a PF, ele teria fugido para Cuiabá e estava sendo procurado pelos policiais da capital do Mato Grosso, por volta das 11 horas.

A pedido da PF, a Justiça Federal em Mato Grosso também decretou o sequestro e indisponibilidade dos bens de todos os envolvidos, bem como o afastamento preventivo de todos os servidores indiciados. O valor mínimo dos danos ambientais causados pelos investigados, nestes últimos anos, somado, é de aproximadamente R$ 900 milhões.

Segundo a PF, a ação é fruto de cerca de dois anos de investigações. Além de madeireiros e proprietários rurais, entre os suspeitos estão engenheiros florestais e servidores públicos da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (SEMA) que eram responsáveis por produzir e aprovar licenciamentos e planos de manejo florestal fraudulentos, necessários para legalização e comércio de madeira. Foram apuradas irregularidades em pelo menos 68 empreendimentos e propriedades rurais.

A corporação identificou os crimes de fraude na concessão de licenciamentos e autorização de desmatamentos; disponibilidade de créditos florestais fictícios, e que permitem o desmatamento e retirada ilegal de madeira de áreas não documentadas, especialmente de terras públicas e áreas protegidas; e transporte, processamento e comercialização destes produtos pelas serrarias e madeireiras, as quais recebem o produto "esquentado" com documentação fraudulenta.

Após interrogatório, os presos serão encaminhados ao sistema prisional e responderão pelos crimes de formação de quadrilha, corrupção ativa e passiva, furto, grilagem de terras, falsidade ideológica e inserção de dados falsos em sistema de informática, além de diversos delitos previstos na Lei de Crimes Ambientais.

Guarda Municipal está em 15% das cidades

GAZETA DO POVO, 21 de maio de 2010


Criadas para proteger o patrimônio público municipal, as guardas municipais ou guardas civis vêm estendendo sua área de atuação e até assumindo o vazio deixado pela polícia. Em 2009, 15% das cidades brasileiras tinham guardas municipais e 16% delas usavam armas de fogo, de acordo com a Pesquisa de Informações Básicas Municipais, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A criação desses órgãos vem sendo incentivada pelo governo federal e eles podem ser envolvidos no Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack, mas não atuarão como uma nova instituição policial.

De 2006 para cá, o número de cidades com guarda chegou a quase 900, elevando o efetivo para 86 mil em todo o país. Sua presença é mais expressiva nas grandes cidades: nove entre 10 municípios com mais de 500 mil habitantes têm guarda. Quase 40% do efetivo do país está nessas cidades. Em mais da metade desses municípios, os guardas portam armas de fogo. A proporção entre a existência do órgão, seu equipamento e a população da cidade se deve basicamente a dois fatores: maior orçamento e maiores índices de criminalidade.

“O gestor público deve levar em conta a percepção de insegurança da população. Mas de que serve criar uma outra polícia armada, com as mesmas mazelas das que já existem?”, questiona a pesquisadora da Universidade Federal Fluminense Gláucia Mouzinho. Ela participou da elaboração do programa de capacitação de guardas no Rio de Janeiro, que subsidiaram as diretrizes do Ministério da Justiça para a formação da categoria. “As guardas são adequadas para tratar de pequenos conflitos – perturbações da ordem, brigas domésticas, de trânsito e entre vizinhos que têm um potencial de acabar em violência. É a maior demanda real da população”, sintetiza.

A criação das guardas é facultada às prefeituras para proteger bens municipais, mas em tese a corporação pode atuar em qualquer situação de flagrante delito. Sua criação é incentivada pelo Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), do Ministério da Justiça. Apesar de não estar prevista no plano de enfrentamento ao crack, o secretário Nacional de Segurança Pública, Luiz Eduardo de Mello Soares, já manifestou a intenção de envolver a categoria na abordagem de usuários da droga. “O consumo da droga está incluído nos conflitos cotidianos. Mas ela [a guarda] não tem condições de lidar com o tráfico e a criminalidade”, ressalva Gláucia.

No entanto, é isso que acaba acontecendo em algumas cidades. É o caso de Araucária, na região metropolitana de Curitiba, onde os 66 guardas equipados com armas de fogo e de eletrochoque atendem em média oito ocorrências policiais por dia e efetuam prisões e apreensões. “As pessoas foram acorrendo à guarda gradualmente, ao verem que atendíamos as ocorrências que a polícia não dava conta. Essa atividade acabou institucionalizada”, pondera o diretor do órgão, Adair Milani.

Com 19 anos de atraso, PR pode regulamentar defensoria

GAZETA DO POVO, 21 de maio de 2010

Atualmente o órgão não tem defensores públicos, orçamento próprio, nem autonomia. Criação foi anunciada ontem


Com 19 anos de atraso, a Defensoria Pública do Paraná pode, enfim, ser regulamentada neste ano. O governador Orlando Pessuti (PMDB) anunciou a criação oficial do órgão para 2011, durante a abertura do 9.º Simpósio Nacional de Direito Constitucional, na manhã de ontem. “É um preceito constitucional e um entendimento, que nós e a sociedade organizada temos, de que o estado do Paraná deve ter estruturada uma defensoria pública”, afirmou. A atual Defensoria Pública do Paraná não respeita as constituições Estadual e Federal porque não apresenta defensores, orçamento próprio e autonomia de atuação (veja quadro nesta página).

Baseado em moldes estabelecidos pela Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep) e pela Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais (Anadef), o projeto foi encaminhado à Secretaria de Estado de Planejamento e está em fase de dotação orçamentária. Ontem, a Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania (Seju) e a Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Seti), responsável pela elaboração da proposta, não informaram a previsão de recursos. O Rio Grande do Sul, estado com índices habitacionais semelhantes ao do Paraná, prevê para este ano um total de R$ 12,5 milhões para o órgão.

De acordo com apuração da Gazeta do Povo, em um primeiro momento o órgão deverá ser instalado somente em Curitiba, com cerca de 100 defensores, enquanto o resto do estado será atendido pelo convênio de advocacia dativa firmado entre o governo e a Ordem dos Advogados do Brasil Seção Paraná (OAB-PR). Com o aumento do orçamento e a abertura de novos concursos, a Defensoria deverá se estender ao interior gradativamente. “A defensoria não prejudica ou elimina o convênio, mas, mesmo que algo tenha que ser alterado, valerá a pena pelos benefícios que o órgão vai trazer”, disse Pessuti.
Interior
O presidente da Anadep, André Castro, defende a presença de defensores em todo o estado desde a instalação, especialmente em regiões com índices de exclusão social mais acentuados. “Deve haver distribuição entre as principais cidades, não somente na capital. A ideia da defensoria é que comece interiorizada, não necessariamente cobrindo todo o interior, mas as principais cidades”, avalia. Para Castro, o Paraná deve se espelhar no Rio Grande do Sul, um dos estados mais bem estruturados no quesito.

A Defensoria Pública gaúcha tem 370 defensores públicos – média de um profissional para cada grupo de aproximadamente 20 mil habitantes, levando-se em conta um público-alvo de 7,8 milhões de pessoas. Para alcançar índice semelhante ao dos gaúchos, o Paraná precisaria de cerca de 380 profissionais.

Para a atual chefe da Defensoria Pública do Paraná, Josiane Fruet Bettini Lupion, é possível prestar atendimento de qualidade com 500 defensores. “Não adianta se instalar apenas em Foz do Iguaçu. É preciso atender a região do entorno das principais cidades do estado. A Defensoria Pública deve ir à população, não o contrário.”

A partir da próxima terça-feira, dia 25, o edital com as informações e o regulamento do convênio firmado entre o governo do estado e a OAB-PR estará disponível no site da OAB-PR www.oabpr.com.br.

Ficha Limpa só para o futuro: para presidente do TSE, lei não atinge candidatos já condenados

O GLOBO, 21 de maio de 2010


Aprovado pelo Congresso como remédio contra a corrupção na política, o projeto Ficha Limpa não deve alterar o perfil das candidaturas este ano. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Ricardo Lewandowski, jogou um balde de água fria na euforia dos que esperavam que a lei enquadrasse os candidatos já condenados. Segundo o ministro, ela só poderá ser aplicada contra pessoas condenadas no intervalo de tempo entre a sanção pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o registro das candidaturas. ( Conheça os principais pontos do projeto )

Como Lula tem até 15 dias para confirmar ou não o texto do projeto - ou seja, 3 de junho -, dificilmente algum candidato será enquadrado nas novas regras para as eleições deste ano. O prazo para o registro das candidaturas na Justiça Eleitoral vai de 10 de junho a 5 de julho.

Segundo Lewandowski, uma lei não pode retroagir para prejudicar alguém. Por outro lado, a Justiça Eleitoral costuma considerar, em seus julgamentos, a situação da pessoa apenas na data do registro para examinar a validade dele - ou seja, condenações posteriores não seriam levadas em consideração.

- A lei só pode retroagir para beneficiar alguém, nunca pode prejudicar - disse o ministro.

Lewandowski, entretanto, elogiou a aprovação do projeto. Para ele, a medida servirá para melhorar a qualidade da política brasileira. Como consequência, ele considera que "o povo brasileiro estará bem melhor representado" no próximo ano, se a lei for aplicada nas eleições de outubro.

- Foi um avanço importante, (a lei) prestigiou o princípio da moralidade. Essa lei foi aprovada em um momento extremamente oportuno, porque permite que se possa fazer a melhor escolha possível. Os partidos estão na obrigação moral de escolher os melhores candidatos em termos de antecedente, porque essa foi a manifestação praticamente unânime do Congresso, que representam a voz do povo.
Gurgel defende aplicação este ano

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, também comemorou a nova regra e defendeu a aplicação nas eleições deste ano. Já há duas consultas no TSE questionando se a lei poderia ser aplicada este ano. Lewandowski disse que a dúvida será respondida em breve, antes do prazo para o registro das candidaturas.

- A posição do Ministério Público será no sentido de dar máxima efetividade, ou seja, exigir o cumprimento já a partir deste ano - disse Gurgel.

Para o procurador, a nova lei contribuirá para expulsar os corruptos da política brasileira:

- A partir do momento em que você afasta os chamados fichas-sujas, você melhora sim o nível da política brasileira.

Gurgel disse que não entrará com ação para questionar a validade da lei no Supremo Tribunal Federal (STF).

- O MP vai trabalhar pela aplicação da lei, acho que é um apelo da sociedade brasileira, e é preciso que ela (a lei) seja implementada.

Recentemente, o STF declarou que uma pessoa só pode ser impedida de concorrer se for condenada em última instância. O projeto aprovado menciona apenas uma condenação por tribunal de segunda instância - ou seja, uma sentença que pode ser modificada por tribunal superior.

Para Lewandowski, que integra o STF, o caso examinado pela Corte é diferente do projeto aprovado. Portanto, para ele, a lei tem chance de ser considerada constitucional pela Corte, se for proposta ação contra ela.

- É uma situação um pouco distinta daquela que examinamos. Anteriormente, o tribunal debruçou-se sobre uma situação em que não havia lei nenhuma disciplinando a matéria. O veto ao registro dos candidatos poderia ficar ao arbítrio de um juiz de primeiro grau, ou mesmo da Justiça Eleitoral, sem nenhuma base mais objetiva.

Anistia aos fichas-sujas

O ESTADO DE S. PAULO, Editorial, 21 de maio de 2010

O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), não precisa se preocupar. Depois de manobrar, inutilmente, para impedir a votação do Projeto Ficha Limpa "a toque de caixa", alegando que a proposta nem sequer era do governo, "mas da sociedade", ele teve uma reação característica quando, na quarta-feira, a proposta passou na Casa pelo voto unânime dos 76 senadores presentes, decerto a contragosto em diversos casos.

Jucá disse que o texto restringindo as candidaturas de condenados por um colegiado de juízes em razão de uma série de delitos especificados eles só poderão disputar eleições 8 anos depois de cumprir a pena precisará ser aperfeiçoado porque "ainda é muito genérico, pode cometer injustiças e não pegar quem tem que pegar". De fato, não pegará de imediato quem tem de pegar, embora o que ele e a sociedade entendam por isso decerto não seja a mesma coisa.

E não deverá pegar tão logo quanto a sociedade gostaria por causa de uma daquelas malandragens em que os políticos são especialistas. A esperteza contrasta com a euforia do veterano senador gaúcho Pedro Simon, da ala limpa do PMDB. Para ele, graças à aprovação final do projeto de iniciativa popular apresentado com 1,6 milhão de assinaturas, a que aderiram pela internet outros 3,4 milhões de pessoas, o Brasil deixava anteontem mesmo de ser conhecido como o país da impunidade.

O golpe se deu quando a Comissão de Constituição e Justiça examinava o texto aprovado na Câmara. O senador Francisco Dornelles, do PP fluminense, aproveitou o momento para introduzir uma "emenda de redação", alterando os tempos verbais em 5 artigos da proposta. Assim, onde constava que não poderiam se candidatar os políticos que "tenham sido condenados", passou a se ler "forem condenados". Ou seja, forem condenados depois da sanção da lei, o que se espera que aconteça até o início de junho.

A "emenda Maluf", como merece ser chamada, e não apenas por ser o deputado colega de sigla de Dornelles, anistia os fichas-sujas que conseguiram se eleger quando se entendia que a proibição somente poderia alcançar aqueles cuja condenação tivesse transitado em julgado. É, notoriamente, mas não exclusivamente, o caso do ex-prefeito Paulo Maluf. Mesmo que a Justiça decida que a lei valerá já para as próximas eleições o assunto divide os juristas ele e outros políticos intrépidos, condenados em mais de uma instância, terão preservado o direito de se candidatar.

Das 4 condenações aplicadas a Maluf por órgãos judiciais colegiados, uma trata de delitos previstos no Projeto Ficha Limpa que inclui crimes eleitorais, contra a economia popular, a administração, o patrimônio público e o mercado financeiro, tráfico de entorpecentes, homicídio, estupro e crimes ambientais graves. Políticos que renunciarem ao mandato para não ser cassados também ficarão inelegíveis. No caso que interessa, Maluf foi obrigado a devolver aos cofres públicos o valor gasto com uma compra, considerada superfaturada, de frangos congelados.

Protegido pela maliciosa "emenda de redação" de Dornelles, a futura lei, seja lá quando entrar em vigor este ano ou só a partir do pleito municipal de 2012 não o atingiria, dado que a condenação foi anterior a ela. O relator do projeto no Senado, Demóstenes Torres, do DEM de Goiás, não acredita que a emenda reduza o alcance da lei. "Todos os processos em andamento serão, sim, abrangidos por ela", assegura. Um em cada 4 deputados federais, a propósito, enfrenta pendências judiciais no Supremo Tribunal.

Outros parlamentares têm sérias dúvidas. Para os deputados Chico Alencar, do PSOL fluminense, e Flávio Dino, do PC do B do Maranhão, a mudança amenizou o Ficha Limpa. "A alteração que fizeram não foi de redação, foi de mérito", entende Dino. Fica, de qualquer forma, a experiência alentadora de ver a sociedade dobrar o corporativismo dos políticos, quando não o seu acendrado senso de autopreservação. Como diz o coordenador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, Chico Whitaker, "votar esse projeto era botar a faca na cabeça de uns e dar um tiro no pé de outros, mas foi impossível ser contra".

Sujou a ficha

O GLOBO, Merval Pereira, 21 de maio de 2010:


Está mais uma vez nas mãos do Judiciário o aperfeiçoamento de nosso sistema eleitoral, e desta vez a "judicialização" da política se dará por culpa expressa do corporativismo dos congressistas, que deturparam o projeto de lei da Ficha Limpa o mais que puderam, até o último minuto de votação no Senado.

O "aperfeiçoamento" final ocorreu apenas no texto, a chamada emenda de redação, segundo a explicação oficial, mas na verdade representa uma tentativa derradeira de distorcer o espírito da lei.

Em busca de "harmonia estilística", o senador Francisco Dornelles alterou os tempos verbais em alguns artigos da lei, de maneira que as novas regras, que seriam aplicadas aos políticos que "tenham sido condenados", ficaram valendo apenas para aqueles "que forem condenados".

Seria muita ingenuidade imaginar que o senador Dornelles, uma das últimas raposas políticas em atuação no Congresso, estivesse preocupado com o estilo legislativo do projeto.

A partir dessas mudanças verbais, abriu-se uma grande discussão jurídica que pode retardar a entrada em vigor da nova lei e, mais que isso, liberar os poucos "fichas-sujas" que eram alcançados por ela da maneira como foi aprovada na Câmara.

Segundo pesquisa da ONG Voto Consciente, apenas cerca de 10% dos atuais parlamentares estariam inelegíveis com a mudança do alcance da lei, de primeira para a segunda instância (condenação por colegiado).

Mesmo assim, já era considerada um avanço da cidadania em relação às disposições em vigor, que exigem condenação em última instância, o chamado "trânsito em julgado", para tornar inelegível um candidato.

A repercussão da lei nos estados e municípios também seria outro benefício conseguido, com o impedimento de vários deputados, vereadores e prefeitos de disputar a reeleição, além de antigos políticos, que não poderiam retornar à vida pública.

A questão é mais grave por que, apesar da modificação no Senado, a lei não retornou à Câmara e foi diretamente para a sanção presidencial.

Esse procedimento, na visão do senador Demóstenes Torres, relator do projeto e favorável a ele, demonstra que não houve alteração de conteúdo no projeto que saiu da Câmara e, portanto, continuam inelegíveis todos aqueles que já estão condenados.

A questão é que essa interpretação jurídica do espírito da lei não resiste à "interpretação gramatical", como já advertiu o presidente do TSE, ministro do Supremo Ricardo Lewandowski, para quem, pela simples leitura do projeto aprovado no Senado, as restrições só atingem os que forem condenados a partir da vigência da lei.

Essa é uma diferença que vale, por exemplo, a elegibilidade de um Paulo Maluf, para pegarmos um efeito simbólico da nova legislação.

Já há deputados, entre eles o líder do PSOL, Chico Alencar, que defendem que a Mesa da Câmara deve definir como nula a mudança realizada no Senado, fazendo retornar a redação original.

Mesmo aqueles políticos que admitem que a alteração na redação modificou também o sentido da legislação defendem que a lei não pode retroagir para prejudicar ninguém.

Além da interpretação de que a mudança prejudica, sim, a sociedade como um todo para defender a corporação política, existe um fato: o que se aprovou não é uma mudança na legislação atual, mas novas exigências para o acesso à legenda partidária para concorrer às eleições.

O que leva a outra questão em debate, sobre a vigência da lei. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, defende a imediata validade da legislação, já para esta eleição, embora o artigo 16 da Constituição diga que qualquer alteração nas regras do processo eleitoral tem que ser aprovada um ano antes do pleito.

Caberá ao TSE definir quando começa o "processo eleitoral". Até hoje, toda legislação eleitoral tinha que ser aprovada até setembro do ano anterior à eleição, mas o Tribunal pode definir que o "processo eleitoral" só começa após o registro dos candidatos, cujo prazo final é o começo de julho.

Há também a possibilidade de a nova lei ser interpretada não como parte do processo eleitoral, mas uma "norma material", o que permitiria sua aplicação ainda este ano, e não apenas a partir da eleição municipal de 2012, como querem muitos.

Todas essas manobras protelatórias só fazem tornar mais verdadeira a frase do deputado Edmar Moreira, hoje PR, que ficou conhecido como o "homem do castelo", que tinha certeza de que seria absolvido por seus pares, como realmente foi, porque "o Parlamento sofre do vício insanável da amizade".

Impossível não lembrar Tancredi em Il Gattopardo de Tomaso di Lampedusa: "É preciso mudar, para tudo continuar como está".