sábado, 20 de novembro de 2010

Sanepar responde oficialmente à Prefeitura de Maringá que não abandonará serviço de água e esgoto

GAZETA MARINGÁ, 20 de novembro de 2010

Companhia reafirma que fica no comando do sistema. Prefeitura estuda ação de retomada de posse


A Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar) protocolou resposta à Prefeitura de Maringá, no fim da tarde desta sexta-feira (19), dizendo que não tem interesse em concorrer à licitação aberta para tratar do sistema de água e esgoto. A administração municipal quer retomar o serviço, e pediu que a estatal se manifestasse sobre a concorrência aberta, prazo que venceu nesta sexta. Com a negativa da Sanepar, a Prefeitura vai estudar o teor da resposta antes de entrar com ação de retomada de posse, o que pode ocorrer na próxima semana.

A Sanepar apenas confirmou que protocolou a resposta, mas que a não vai se pronunciar sobre o teor das declarações dadas à prefeitura. O procurador jurídico da administração, Luiz Carlos Manzato, confirmou que a resposta da Sanepar é uma negativa, mas que ainda não teve de analisar com cuidado o documento.

Esse é o mesmo posicionamento declarado pelo presidente da companhia, Hudson Calefe, em entrevista coletiva concedida nesta semana.

Na prática, a recusa da Sanepar é uma forma de dizer que não vai abandonar o serviço que já vem prestando, pois no entendimento da companhia, a licitação é dispensável e o contrato ainda tem validade.

Após a análise da resposta, a Prefeitura deve entrar com pedido de imissão de posse na justiça. A manobra tem como argumento o vencimento do contrato em agosto, e assim a Prefeitura pede autorização para entrar nas dependências e assumir o sistema.

O jogo bruto da corrupção

ÉPOCA, 20 de novembro de 2010

Como uma promotora de Brasília extorquiu o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda com a ajuda de um assessor de seu vice Paulo Octávio


Na manhã do dia 10 de julho de 2009, um automóvel Fiat Linea passou pela guarita da Granja Águas Claras, a residência oficial do governador do Distrito Federal. Seus dois ocupantes não precisaram se identificar aos seguranças. O motorista era o empresário Marcelo Carvalho, na época o principal executivo do grupo Paulo Octávio, um gigante nos setores de construção civil, hotelaria e comunicações, controlado pelo ex-vice-governador do Distrito Federal Paulo Octávio Pereira. A passageira, a promotora Deborah Guerner, chegava ali depois de uma cuidadosa preparação para um encontro com o então governador, José Roberto Arruda. De acordo com denúncia do Ministério Público à Justiça Federal, Deborah Guerner foi à casa do governador fazer uma chantagem: exigir contratos de prestação de serviço para uma empresa de coleta de lixo e, também, a quantia de R$ 2 milhões para não divulgar vídeos que mostravam Arruda e assessores recebendo dinheiro de propina.

Derrubado em março de 2010 pelo escândalo revelado pela Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal, Arruda relatou o encontro com Deborah em dois depoimentos prestados ao Ministério Público Federal. Em um deles, dado em 29 de setembro e obtido em primeira mão por ÉPOCA, o ex-governador afirma que recebeu a promotora devido a insistentes pedidos do vice, Paulo Octávio. Diz também que, em nenhum momento, Paulo Octávio lhe contou sobre o que seria tratado na conversa com a promotora. “Fui apanhado de surpresa. Eu disse que não aceitava chantagem, e ela me ameaçou aos gritos”, diz Arruda. O ex-governador afirma que foi Carvalho quem telefonou para sua assessoria para confirmar a hora do encontro na residência oficial. Na versão de Arruda, Carvalho testemunhou boa parte da conversa com Deborah.

Os preparativos para a reunião em Águas Claras foram gravados em vídeo por Deborah. Como ÉPOCA revelou em junho, a promotora tinha em sua casa um sistema interno de câmeras com sensores infravermelhos. Ali foram filmados os ex-governadores Joaquim Roriz e Arruda e o então procurador-geral de justiça do Distrito Federal, Leonardo Bandarra. As gravações dos preparativos mostram que a promotora não esperava uma aceitação imediata de Arruda para suas exigências. O roteiro preestabelecido previa que o então governador telefonaria para Bandarra e Paulo Octávio e seria aconselhado a se acertar com a promotora Deborah.

No dia 7 de julho de 2009 – três dias antes do encontro de Deborah com Arruda –, Marcelo Carvalho foi flagrado pelas câmeras da promotora numa reunião que teve a participação do empresário Jorge Guerner, marido de Deborah. Eles falavam tão baixo que a perícia da Polícia Federal teve dificuldade para transcrever os diálogos. Mesmo assim, os técnicos constataram que eles usaram codinomes para se referir a Arruda (“Ricardo”), a Leonardo Bandarra (“Fernando”) e ao delegado Durval Barbosa (“Gabriel”) – o delator do escândalo do panetone, como ficou conhecido o caso.

Em depoimento, Marcelo Carvalho disse que esteve quatro ou cinco vezes na casa de Deborah Guerner para tratar de assuntos profissionais com Jorge Guerner. Carvalho afirmou que, a pedido de Jorge, providenciou o Fiat Linea na concessionária Bali, pertencente ao grupo Paulo Octávio. O uso desse carro, segundo os investigadores, tinha o objetivo de camuflar a visita de Deborah ao governador. Antes de seguirem para Águas Claras, Deborah e o marido chegaram ao estacionamento de um hotel da rede de Paulo Octávio em dois carros – um BMW e um Pajero. Lá, Deborah trocou de carro e entrou no Fiat Linea.

ÉPOCA ouviu o advogado Almeida Castro, o Kakay, responsável pela defesa de Paulo Octávio e de Marcelo Carvalho. Segundo Kakay, Carvalho teve várias reuniões com Jorge Guerner porque eles planejavam abrir em Brasília uma franquia de uma grife de luxo. Por causa dessa parceria, Carvalho teria concordado em levar Deborah à casa do governador, mas não teria participado da conversa. Além de Arruda, duas outras testemunhas ouvidas no inquérito afirmam que Carvalho assistiu à conversa da promotora com o ex-governador. De acordo com Kakay, Paulo Octávio não ajudou Deborah a se encontrar com Arruda. O que pode ter acontecido, segundo o advogado, é que seu secretário particular, Frank May Neto, tenha pedido a reunião com o governador. Em depoimento filmado pelos procuradores, Paulo Octávio deu uma versão diferente. Ele diz que atendeu Deborah e pediu a Arruda para recebê-la por causa de “ligações afetivas pretéritas”. Nos anos 80, Octávio e Deborah foram namorados.

Entre os seis acusados pelo Ministério Público por crime de extorsão está o delegado Durval Barbosa, autor das gravações que derrubaram Arruda. Em um dos depoimentos, Arruda afirmou que, além de Paulo Octávio, Barbosa também insistiu para que ele recebesse a promotora. Até agora Barbosa aparecia como principal testemunha de acusação dos esquemas de corrupção no governo do Distrito Federal. ÉPOCA tentou ouvir Barbosa. Seus interlocutores dizem que ele não pode dar declarações por ser colaborador da Justiça. Mesmo depois de ser denunciado, Barbosa pode receber benefícios da delação premiada, como a redução ou extinção de penas.

Ao dar detalhes sobre a reunião de Águas Claras ao Ministério Público, Arruda procura se colocar na posição de vítima de uma tentativa de extorsão. Na verdade, o grande prejudicado são os cofres públicos, de onde saía o dinheiro que abastecia o submundo do governo Arruda.



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O ex-ministro José Dirceu volta ao Alvorada e diz que presidente Lula vai ajudá-lo a desmontar a farsa que é o mensalão

O GLOBO, 20 de novembro de 2010


Sentindo-se em dívida com o companheiro que teve que afastar do governo por causa do escândalo do mensalão, em 2005, o presidente Lula, que pretende se despedir do Palácio da Alvorada no dia 24, não quis deixar Brasília antes de fazer um afago ao deputado cassado José Dirceu. Reabilitado entre os companheiros e com função de direção no PT, faltava a Dirceu a volta ao palco do poder, sem ter que ser às escondidas. Nesta quinta-feira, Dirceu foi para o Alvorada tomar café da manhã com Lula, quando conversaram sobre o futuro dos dois. O próprio ex-ministro relatou sobre o que falaram:

- Foi uma coisa pessoal. O Lula estava preocupado comigo, como vou ficar. E prometeu que quando sair do governo, além da reforma política, da criação do instituto voltado para África e da articulação de partidos de esquerda, vai desmontar essa farsa que é o mensalão. Ele quer me ajudar - contou Dirceu, que participou ontem da reunião do Diretório Nacional do PT, onde é um dos 81 integrantes.

Com direitos políticos cassados até 2016, Dirceu acredita que se for inocentado no processo do qual é réu no Supremo Tribunal Federal, ele conseguirá ser anistiado da cassação do mandato de deputado federal na Câmara, recuperando seus direitos políticos:

- Se o Supremo me absolver, a Câmara me anistia na hora. Mas eu não quero anistia, eu faço questão de ser julgado e inocentado.

O dirigente petista foi o todo-poderoso ministro da Casa Civil do 1º mandato de Lula e caiu em desgraça sob a acusação de ser o comandante do esquema de pagamento de "mesadas" a políticos de partidos aliados, para garantir o apoio ao governo no Congresso.

Sentindo-se em dívida com o companheiro que teve que afastar do governo por causa do escândalo do mensalão, em 2005, o presidente Lula, que pretende se despedir do Palácio da Alvorada no dia 24, não quis deixar Brasília antes de fazer um afago ao deputado cassado José Dirceu. Reabilitado entre os companheiros e com função de direção no PT, faltava a Dirceu a volta ao palco do poder, sem ter que ser às escondidas. Nesta quinta-feira, Dirceu foi para o Alvorada tomar café da manhã com Lula, quando conversaram sobre o futuro dos dois. O próprio ex-ministro relatou sobre o que falaram:

- Foi uma coisa pessoal. O Lula estava preocupado comigo, como vou ficar. E prometeu que quando sair do governo, além da reforma política, da criação do instituto voltado para África e da articulação de partidos de esquerda, vai desmontar essa farsa que é o mensalão. Ele quer me ajudar - contou Dirceu, que participou ontem da reunião do Diretório Nacional do PT, onde é um dos 81 integrantes.

Com direitos políticos cassados até 2016, Dirceu acredita que se for inocentado no processo do qual é réu no Supremo Tribunal Federal, ele conseguirá ser anistiado da cassação do mandato de deputado federal na Câmara, recuperando seus direitos políticos:

- Se o Supremo me absolver, a Câmara me anistia na hora. Mas eu não quero anistia, eu faço questão de ser julgado e inocentado.

O dirigente petista foi o todo-poderoso ministro da Casa Civil do 1º mandato de Lula e caiu em desgraça sob a acusação de ser o comandante do esquema de pagamento de "mesadas" a políticos de partidos aliados, para garantir o apoio ao governo no Congresso.

'Pena repara uma parte da nossa dor', diz irmão de Celso Daniel

O ESTADO DE S. PAULO, 20 de novembro de 2010

Em entrevista ao 'Estado', Bruno Daniel afirma que sentença 'significa mais um grande passo que permite que continuemos a acreditar que lutar vale a pena'


Bruno Daniel, cidadão brasileiro a quem a França outorgou o título de refugiado porque reconheceu que sua vida aqui corre riscos, disse que a condenação de um dos assassinos de seu irmão Celso Daniel - prefeito do PT de Santo André executado à bala em janeiro de 2002 - repara uma parte da dor que persegue a família. "Significa mais um grande passo que permite que continuemos a acreditar que lutar vale a pena", ele diz.

Marcos Roberto Bispo dos Santos foi condenado a 18 anos de prisão por um júri popular na quinta-feira, 18. A promotoria o acusa de ter participado da ação de arrebatamento de Celso e sua remoção para dois cativeiros. Bispo está foragido. O Ministério Público o classifica de "bandido perigoso".

Incomoda Bruno Daniel e os seus o fato de que outros seis acusados - entre eles o empresário Sérgio Gomes, o Sombra, apontado como mandante do crime - ainda estão longe de prestar contas à Justiça. Se é que um dia isso vai acontecer, porque todos eles recorreram da sentença que os mandou para o banco dos réus.

Também indignam o exilado as muitas ações judiciais que envolvem antigos colaboradores e aliados da administração do irmão em atos de desonra, corrupção e improbidade. O Ministério Público se desdobra, insiste, questiona, cobra medidas cautelares, mas as ações se arrastam na Justiça congestionada.

Por e-mail, de algum lugar do País que o acolheu, Bruno Daniel, 56 anos, professor, relata suas expectativas, esperanças, medos e aflições. Ele escreve também sobre um partido, o PT, que a eles virou as costas no momento mais dramático.

Assusta-o o fato de Marcos Roberto Bispo dos Santos estar foragido?
O que mais nos assusta é que os esquemas que levaram à morte de meu irmão e a nosso exílio continuam como sempre. O que quer dizer que não temos nenhuma segurança de poder viver tranquilos no Brasil.

Esperava que o PT tomasse alguma medida com relação à morte de seu irmão?
Sem nenhuma dúvida. Mantivemos conversações com pessoas do PT durante todo o ano de 2002, após a morte do Celso, porque acreditávamos nessa possibilidade. Mas fomos ingênuos. Só contamos com ações isoladas de alguns petistas, dentre eles dr. Hélio Bicudo, então vice-prefeito de São Paulo, do então vereador pelo PT de Santo André, Ricardo Alvarez, e do senador Eduardo Suplicy.

O PT abandonou a família?
Não se trata de abandono. Trata-se da explicitação de uma maneira de fazer política da qual discordamos radicalmente.

A pena imposta a Bispo dos Santos de alguma forma repara a dor por vocês sofrida nesses anos todos?
Repara uma parte de nossa dor. Ela significa mais um grande passo que permite que continuemos a acreditar que lutar vale a pena para que se encontre a verdade sobre o assassinato de meu irmão e se faça justiça condenando aqueles que o sequestraram, torturaram, assassinaram e encomendaram o crime. Tal pena refere-se a apenas um dos acusados e que se encontra foragido.

O que o preocupa agora?
Temos que continuar vigilantes em relação à demanda do dr. Podval (Roberto Podval, advogado de defesa de Sérgio Gomes), ao Supremo Tribunal Federal, arguindo a inconstitucionalidade do poder de investigação do Ministério Publico. Se tal demanda for aceita, estaremos diante de um grande retrocesso institucional. Não só as provas colhidas pelo Ministério Público no caso de Celso poderão ser invalidadas, como as de todos aqueles que dependem de suas investigações.

Por que os processos sobre corrupção não chegam ao fim?
Temos que acompanhar a eventual demora do julgamento dos demais indiciados e recursos de seus advogados a outras instâncias, que podem levar esse tipo de decisão a demandarem muito mais tempo para se tornarem efetivas. Resta verificar o andamento dos processos em que Sérgio Gomes e muitos outros estão indiciados por corrupção nos negócios públicos de Santo André, elemento que pode estar articulado à morte de Celso. Seu desvelamento e punição aos culpados pode abrir caminho para aperfeiçoamentos institucionais também nesse campo.

Como vê o fato de até hoje nenhuma ação sobre corrupção e desvios na administração municipal de Santo André ter chegado a uma solução?
É mais uma mostra de que reformas profundas nas instituições brasileiras precisam ser feitas. Creio que ainda temos que fazer as duas coisas: vigiar e cobrar para que esses processos caminhem, mas também apontar o que deve ser mudado, para que coisas como essa deixem de acontecer.

Considera que a Justiça demorou demais para a primeira sentença criminal?
Não há a menor duvida, fato inclusive reconhecido pelo juiz (Antônio Galvão França)de Itapecerica da Serra, segundo notícias da imprensa. Sua posição tem sido de uma firmeza ímpar. Isso não nos impede de perceber que o sistema judiciário brasileiro precisa de reformas profundas. Tal demora significa impunidade a criminosos.

Por que é assim?
Podemos nos perguntar por que o STF concedeu habeas corpus bastante tempo depois do prazo legal dentro do qual Bispo dos Santos deveria ser julgado, soltando-o da prisão, ele que é réu confesso, e apenas a uma semana da decisão do juiz de Itapecerica de levar o caso a júri popular, o que o manteria onde estava? Como aceitar que testemunhas de defesa não eram encontradas para depor, quando tinham domicilio fixo, trabalho regular, cotidiano definido? Como aceitar que o julgamento do então deputado pelo PT, Donisete Braga, cujo celular foi rastreado na região onde meu irmão provavelmente se encontrava sequestrado, ainda em vida, possa ter ocorrido em foro especial? Como aceitar que meu afilhado de casamento, Marcio Chaves Pires (eleito prefeito pelo PT na cidade de Mauá), tenha fornecido álibi ao referido deputado, tendo inicialmente dado depoimento em contrário no Ministério Público e à minha família e depois o altere sem ser condenado por perjúrio?

Acredita que a condenação de Bispo dos Santos poderá abrir caminho para outras condenações, inclusive de Sérgio Sombra?
Esta é nossa esperança. Como analisamos tanto o vergonhoso inquérito do Departamento de Homicídios como as excelentes investigações do Ministério Público, que provam que o crime foi encomendado, sabemos que um júri popular, com as mesmas informações de que dispomos, muito provavelmente formará as mesmas convicções que temos, levando às necessárias punições. Acreditamos que em júri popular novos fatos possam surgir, implicando mais pessoas no assassinato de meu irmão. Não podemos acusar ninguém, mas supomos que Sérgio Gomes não agia sozinho.

Há quanto tempo a família exilou-se na França?
Estamos na França desde março de 2006. No final desse mesmo ano o Estado Francês nos outorgou o titulo de refúgio, reconhecendo o perigo que nossas vidas corriam no Brasil, aliás também reconhecido pela policia estadual paulista, que nos forneceu equipes de segurança a partir do segundo semestre de 2005, quando depusemos na CPI dos Bingos.

Que atividade exercem?
A maior parte das atividades que minha esposa e eu temos tido é no campo do ensino, da pesquisa e consultorias relacionadas com nosso passado profissional no Brasil. No entanto, nunca conseguimos nada regular. Tudo o que conseguimos foi obra de amigos brasileiros e daqui da França, sempre solidários e atentos à situação de precariedade em que nos encontramos. Meus filhos estão na universidade, mas já trabalharam em restaurante universitário, em hotel aos finais de semana, ou cuidando de crianças.

Como é a rotina da família na França?
Não temos rotina definida, dado que não temos nem trabalho e nem moradia regulares. Já estamos no quinto endereço diferente e um de nós já teve nesses últimos 4 anos mais de 15 pequenos contratos por prazo determinado.

É possível que a família retorne ao Brasil diante do primeiro revés imposto à quadrilha que matou Celso?
Consideramos que os mecanismos que levaram à morte de meu irmão e a nosso exílio continuam no mesmo lugar. Isto significa que, se retornarmos, teremos muito medo de voltar a sofrer perseguições, intimidações, ameaças, como as que vivemos antes de nossa partida e, desta vez, sua concretização, como ocorreu com tantos que amavam o Brasil, como Chico Mendes, Zuzu Angel ou a irmã Dorothy Stang. Portanto, essa não é uma decisão tranquila a ser tomada.

Quando e como surgiram as ameaças à família? Quando foi tomada a decisão do exílio?
As intimidações e perseguições começaram antes das ameaças. Estas começaram após nossos depoimentos, de meu irmão mais velho, João Francisco Daniel, e o meu à CPI dos Bingos, em 2005, e se intensificaram após a morte do médico legista Carlos Del Monte Printes, que declarou à mesma CPI que Celso foi torturado e que isto era elemento que permitia descartar a hipótese de crime comum. Quando as ameaças se dirigiram a nossos filhos, no fim de 2005, decidimos sair do pais.

As autoridades brasileiras não são confiáveis?
Temos uma institucionalidade que leva a que muitas autoridades ajam fora de preceitos legais. Nossa legislação precisaria melhorar muito. Para ficar em apenas um exemplo, apesar de nossa Constituição afirmar o principio da independência entre os poderes, isto só ocorre muito parcialmente. Portanto, abre-se espaço para que quem está no poder, principalmente no Executivo, mas não só, atue fora da lei. O assassinato de meu irmão é emblemático no sentido de mostrar as fragilidades de nossa democracia. Mas, por outro lado, o mesmo caso mostra um juiz firme e um Ministério Público muito sério, o que quer dizer que temos que pressionar para que as autoridades cumpram com seus deveres e também atuem no sentido de alterar o marco em que os poderes atuam.

Os executores de Celso Daniel começaram a ser castigados.
Chegou a hora de identificar e punir os mandantes do assassinato


Polícia reabre investigação sobre assassinato do prefeito Toninho do PT

O ESTADO DE S. PAULO, 20 de novembro de 2010

Processo estava parado desde 2008 e retornou ao Fórum de Campinas em julho deste ano


A Polícia Civil de Campinas reabriu as investigações sobre as circunstâncias da morte do prefeito Antonio da Costa Santos, o Toninho do PT, assassinado com um tiro em 10 de setembro de 2001. O processo com sete volumes e cerca de 20 mil páginas foi encaminhado nesta sexta-feira (19) pelo juiz da 1ª Vara do Júri, José Henrique Torres, ao delegado Seccional José Carneiro Campos Rolim Neto. Na próxima semana, Rolim Neto vai indicar um delegado para dar andamento às novas apurações do caso.

O processo estava parado desde 2008 e retornou ao Fórum de Campinas em julho deste ano, depois de passar pela junta de três desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que sustentam a insuficiência de indícios da responsabilidade de Anderson Nilton de Paula Lima, o Andinho, na autoria do crime contra o prefeito. Conforme denúncia apresentada pelo Ministério Público Estadual (MPE) ao TJ-SP, Andinho seria o autor dos disparos contra o carro de Toninho, na noite em que o prefeito retornava para sua residência seguindo avenida Mackenzie, Vila Brandina, após passar por uma loja de roupas no Shopping Iguatemi. Um dos tiros atingiu o prefeito e o seu carro parou em uma das margens da via.

Após o encaminhamento de várias linhas de investigação, depoimentos e descartar três jovens ocupantes de duas motocicletas como suspeitos, a policia chegou à quadrilha chefiada por Wanderson Lima, o Andinho. Ele está preso na Penitenciária de Presidente Bernandes, interior de São Paulo, sentenciado a cumprir penas que somadas ultrapassam os 400 anos em regime fechado, sendo a maior parte delas com a acusação de práticas de sequestro, extorsão, formação de quadrilha, latrocínio entre outros. Em juízo, o réu nunca confessou participação na morte do prefeito. A pistola 9 milímetros de onde partiu o disparo que matou Toninho jamais foi localizada pela policia.

Segundo o processo que agora está na Delegacia Seccional, Andinho estava em um carro modelo Celta de cor prata em companhia de três homens em alta velocidade quando o Fiat Palio conduzido pelo prefeito Toninho, em baixa velocidade, "atrapalhou" a fuga do grupo do sequestrador. Na versão da Policia, o grupo disparou contra o carro de Toninho para que desobstruir a via. Após a prisão de Andinho, os outros três integrantes da quadrilha que eram procurados pela Justiça foram mortos em tiroteio com policiais de Campinas em uma casa em Caraguatatuba, litoral norte de São Paulo.

A reabertura do caso para apurar a morte do Toninho do PT reacende a dor da família, que sempre desconfiou na motivação política e não em um crime comum. Segundo a viúva Roseana Garcia, "Antonio contrariou muitos interesses", quando esteve a frente da Prefeitura de Campinas. Conforme aliados mais próximos a ele, Toninho estava juntando documentos e preparando um dossiê que denunciaria desvios de conduta em sua administração.

Sob esse ponto de vista, Roseana e outros membros da família do prefeito chegaram a sugerir a entrada da Policia Federal nas investigações. Os pedidos foram feitos pessoalmente ao então ministro da justiça Thomaz Bastos e, no final do ano passado, seu sucessor na pasta Tarso Genro, hoje eleito governador pelo Rio Grande do Sul nas ultimas eleições. Ainda, com a mesma intenção de ver a Policia Federal frente as investigações das causas da morte de seu marido, Roseana aguarda uma resposta do mesmo pedido protocolado em setembro do ano passado na Procuradoria Geral da República, em Brasília.

República sindical

BLOG DO NOBLAT, Ruy Fabiano, 20 de novembro de 2010

Na reta final da atual legislatura, e sem que o tema tenha sido debatido ou sequer levado ao conhecimento da sociedade brasileira, a Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados aprovou proposta que concede às centrais sindicais dez minutos semanais de transmissão gratuita no rádio e TV.

O texto original, de autoria da deputada Manuela D’ávila (PCdoB-RS), era bem mais radical: previa nada menos que dez minutos diários de programação sindical em rádio e TV, sete vezes mais que o texto final aprovado.

Havia ainda proposta similar, do deputado Vicentinho (PT-SP), que estabelecia que a transmissão seria entre as 20 horas e 22 horas – horário nobre - das terças-feiras. Assegurava também programa anual de dois minutos em cadeia nacional para cada central sindical.

Prevaleceu o substitutivo do deputado Roberto Santiago (PV-SP), que estabelece que as transmissões serão às terças-feiras, entre as 6 horas e as 22 horas, em bloco ou em inserções de 30 segundos a um minuto, no intervalo da programação normal das emissoras.

Se aprovada, a regra será incluída no Código Brasileiro de Telecomunicacões, que fixa as obrigações das radiodifusoras - e, em troca, concede-lhes compensação fiscal pela cessão do horário. Ou seja, a gratuidade dada aos sindicatos, sabe-se lá para quê, será paga pelo contribuinte, que não foi consultado a respeito.

O agravante é que a proposta tramita em caráter conclusivo no âmbito das comissões da Câmara. Ou seja, não vai a plenário. Será ainda analisada por duas outras comissões permanentes: a de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática e a de Constituição, Justiça e Cidadania. Considerando-se o poder do lobby sindical no Congresso, é improvável que seja rejeitada nessas instâncias.

Trata-se de passo decisivo para a consolidação do que se convencionou chamar de república sindical. Na gestão Lula, os sindicatos ganharam visibilidade e influência sem precedentes. Lideranças egressas do sindicalismo controlam os bilionários fundos de pensão. As centrais sindicais passaram a ter acesso ao imposto sindical, pago mesmo pelos que não se sindicalizaram. Não lhes é exigida também prestação de contas.

No âmbito do Estado, e em cargos estratégicos – inclusive no primeiro escalão -, figuram nomes forjados no sindicalismo. O resultado notório é a cooptação desse setor pelo Estado, situação que atende pelo nome de peleguismo e distorce os fundamentos da própria instituição sindical, suprimindo-lhe a autonomia e independência. A luta contra o peleguismo, introduzido no Brasil ao tempo da ditadura do Estado Novo de Getúlio Vargas, foi uma das bandeiras inaugurais do PT, que propugnava por um sindicalismo moderno, sem vínculos com o Estado.

No poder, Lula, porta-voz desse novo sindicalismo, tratou de torná-lo velho. E tem colhido bons resultados.

Basta ver o papel que as centrais sindicais desempenharam na recém-concluída campanha eleitoral, quando, violando a legislação – que proíbe que se associem a partidos e candidatos -, organizaram comícios e fizeram circular panfletos, jornais e revistas em prol da candidatura de Dilma Roussef. Tudo pago com o imposto sindical.

A conquista de horário gratuito na TV aberta, se confirmado, soma-se à recente aquisição da TV do Trabalhador, pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, filiado à CUT, que, por sua vez, é ligada ao PT.

O ministro da Comunicação Social, Franklin Martins, saudou o novo canal como “uma revolução”, fator decisivo para que a mídia convencional “perca o controle sobre as notícias levadas à opinião pública”. Ou inversamente para que as notícias levadas à opinião pública estejam sob controle, como postulam a Conferência de Comunicação do PT e o Programa Nacional de Direitos Humanos.

De uma forma ou de outra, a república sindical avança a passos largos. Ganha mais visibilidade e tribuna própria, ainda que esses atributos nada tenham a ver com a natureza de seu papel institucional. Passam a integrar na linha de frente o jogo do poder.

Ruy Fabiano é jornalista

Prazo termina e Richa fica sem dados sobre caixa do estado

GAZETA DO POVO, 20 de novembro de 2010

Relatório, que será entregue a governador eleito, não terá informações sobre valores disponíveis, capacidade de investimento e dívida


O relatório que o governador eleito Beto Richa (PSDB) receberá na próxima semana sobre a situa­­ção do Paraná, a menos de 40 dias de sua posse, terá uma deficiência importante: não haverá informações sobre o caixa do governo do estado. A equipe do atual governador, Orlando Pessuti (PMDB), ainda não entregou os dados da Secretaria da Fazenda, onde deveriam constar dados como o volume de dinheiro em caixa, o tamanho da dívida, capacidade de investimentos, os cronogramas de pagamentos, etc.

A equipe de Richa pretendia entregar um relatório completo da situação já na semana que vem, depois que o governador eleito voltar ao Paraná de uma viagem de descanso de duas semanas aos Estados Unidos. No entanto, a parte financeira precisará ser entregue mais tarde – ainda não há prazo para que os dados sejam informados.

O chefe tucano da equipe de transição, Carlos Homero Giacomini, ex-secretário de Planejamento de Curitiba no mandato de Richa, lamentou a falta dos detalhes de caixa, mas minimizou uma possível má vontade por parte da atual equipe do governo. “Eles só estão atrasados. Vamos dar um crédito a eles. Seria um relatório melhor se essas informações estivessem mais claras, mas podemos acrescentar novas informações depois.”

Mesmo sem as informações completas, a previsão do grupo de Richa é que na semana que vem o futuro governador anuncie diversas medidas administrativas, com base nas informações disponíveis e no plano de governo apresentado na campanha eleitoral.

Ao todo, dez pessoas fazem parte da equipe de transição, cinco indicadas pelo atual governador Orlando Pessutti (PMDB) e outras cinco indicadas por Richa. O trabalho de troca de informações entre os dois grupos começou na metade de outubro e o grupo do governador eleito encaminhou 165 questões para serem respondidas pelo governo estadual. Cerca de um mês depois, cerca de 70% das informações foram repassadas.

Nesta semana, Pessutti foi criticado pela equipe de Richa por tomar medidas que poderiam comprometer o orçamento de 2011 em cerca de R$ 700 milhões por meio de benefícios fiscais, antecipações de receita e licitações. “É um volume de recursos significativo e preocupante, fruto de ações unilaterais, sem conversar com a equipe de transição”, acusou na terça-feira o futuro líder de Richa na Assembleia Legislativa, deputado Ademar Traiano (PSDB).

Ontem, Giacomini também disse que o modelo adotado para a transição não foi bom. Para ele, houve muita burocracia para acessar dados do governo estadual, já que era necessário fazer uma requisição para o grupo de transição do governo, que requisitava as informações aos técnicos do governo do Paraná. A resposta era dada à equipe de transição de Pessuti para então ser repassada aos representantes do novo governo. “Podíamos ter tido acesso mais direto aos servidores. Houve muita circulação de papel.”

Ontem, a reportagem da Gazeta do Povo tentou conversar com representantes da equipe de transição nas secretarias da Fazenda e Planejamento, mas a informação das assessorias de imprensas é de que todos estão em viagem e retornam na próxima segunda-feira.


PSDB diz que Paraná pode perder verba
Um dos pontos do relatório parcial sobre a situação do atual governo que mais preocupam a equipe de transição do governador eleito Beto Richa (PSDB) é a possibilidade de o Paraná perder R$ 70 milhões do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), ligado ao Ministério da Justiça, que estão à disposição do governo estadual para a construção de casas de custódia – unidades penitenciárias que poderiam abrigar até 6 mil presos provisórios.

“É um problema substancial da administração do estado. Deveria estar havendo um mutirão do governo para resolver isso. Mas a questão esta paralisada”, disse Giacomini. Segundo Giacomini, a verba do Funpen precisa ser usada até 31 de dezembro, mas o estado não conseguiu apresentar a contrapartida exigida pelo governo federal, que seria a entrega dos terrenos habilitados para as construções com as respectivas licenças ambientais.

Outro Lado - Procurados pela reportagem da Gazeta do Povo, tanto o secretário de Justiça, Moacir Favetti, quanto o do Meio Ambiente, Jorge Augusto Callado Afonso, não responderam as perguntas sobre a possibilidade de perda do prazo para a utilização dos recursos.

A assessoria de imprensa da Secretaria de Estado do Meio Ambiente limitou-se a falar que todos os processos de licença ambiental referentes às novas Casas de Custódia estão dentro do prazo esperado.

Já a Secretaria da Justiça enviou uma nota dizendo que “todas as informações a respeito de pleitos, projetos e atividades da pasta, podem ser esclarecidas de forma transparente e detalhada a qualquer membro da equipe de transição, a fim de dirimir dúvidas e questionamentos de recursos e seus trâmites legais”.

Paraná perde 1,5 mil leitos de internação em 4 anos

GAZETA DO POVO, 20 de novembro de 2010

Em todo o Brasil 11,2 mil vagas foram fechadas. Principal causa é o alto custo de manutenção do serviço


O Paraná perdeu 1.547 leitos de internação nos hospitais entre os anos de 2005 e 2009, ou seja, o equivalente a dez hospitais regionais do porte do instalado em Ponta Grossa, com capacidade para 150 leitos. A situação se repetiu no Brasil, que registrou o fechamento de 11.214 leitos de internação no mesmo período. Os custos de manutenção dos internamentos, com equipamentos e recursos humanos, é a principal causa da desativação. Os números foram revelados ontem com a divulgação da Pesquisa de Assistência Médico-Sanitária feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em parceria com o Ministério da Saúde.

A baixa ocorreu principalmente em hospitais privados e que prestam serviço ao Sistema Único de Saúde (SUS). No Paraná, dos 26.793 leitos de internação existentes no ano passado, 6.512 eram exclusivamente públicos e 20.281 localizados em hospitais particulares com alguns serviços credenciados ao SUS. Em 2005, data da última pesquisa, havia 28.340 vagas de internação no estado, sendo 6.102 públicas e 22.238 privadas.

O Paraná perdeu leitos de internação no sistema privado, enquanto que no público houve um acréscimo de 410 vagas. Apesar da queda geral no país o no estado, o IBGE constatou que a média de leitos na Região Sul (o índice não foi divulgado por estado) está dentro do parâmetro considerado ideal pelo Ministério da Saúde, que é de 2,5 a 3 leitos por grupo de mil pessoas. O Sul chega a 2,6, diferentemente de outras regiões brasileiras, como o Norte, que tem 1,8 leito por mil habitantes.

Segundo o superintendente de Sistemas de Saúde da Secretaria Estadual de Saúde do Paraná, Irvando Carulla, se for feito um levantamento em cada uma das 22 regionais de saúde do estado, o balanço será positivo, visto que alguns hospitais públicos foram inaugurados apenas recentemente. Porém nem todos os estabelecimentos recém-inaugurados estão funcionando integralmente. O Hospital Regional de Ponta Grossa tem capacidade para 150 leitos e atendimento de 500 pacientes/dia, no entanto, usa 10 leitos e realizou desde março, quando foi inaugurado, até agora, 3.572 procedimentos. O diretor da unidade, Adroaldo Araújo, diz que compras e contratações estão em andamento.

Desigual - As estruturas de internação estão voltadas ao sistema privado. No Brasil, apenas 35,3% dos leitos de internação estão no Sistema Único de Saúde (SUS), sendo o restante no privado. As regiões brasileiras apresentam levantamentos desiguais. Enquanto que no Norte, 60,9% das vagas de internamento estão na rede pública, no Sul apenas 19,7% servem ao SUS.

Embora maioria, é o setor privado que está desativando camas de internamento, conforme a pesquisa. Para a diretora de assistência do HC, Mariângela Honório Pedroso, o fechamento de leitos em hospitais particulares é preocupante. “As operadoras de saúde estão remunerando cada vez menos”, afirma. Além disso, a discrepância entre leitos públicos e particulares está relacionada aos custos de manutenção e à burocracia para se contratar pessoal. “Para investir em equipamentos, por exemplo, eu preciso depender de emendas parlamentares, para contratar funcionários eu dependo da autorização de concursos, e nada disso existe na rede privada”, comenta.

Acesso a atendimento é maior nas capitais - Apesar de as capitais brasileiras concentrarem só 23,7% da população, é nelas que se encontram os médicos. A Pesquisa de Assistência Médico-Sanitária divulgada on­­tem confirmou um antigo problema: o da necessidade da interiorização dos médicos. No Brasil, há em média 5,6 postos de trabalho médico para cada mil habitantes nas capitais, enquanto que nos demais municípios (interior e litoral) essa média cai para 2,6.

No Sul do país, a proporção é ainda mais desigual: 7,8 nas capitais e 2,8 no interior. O Paraná segue essa tendência. Há 7,1 locais de atendimento médico em Curitiba para mil pessoas contra 2,5 do interior e do litoral. O estado catarinense representa a maior distorção do país, com o indicador de 10,9 na capital Florianópolis e 2,9 no restante do estado.

O problema não é número de médicos formados. A pesquisa mostra que, na média, o Paraná, por exemplo, teve um acréscimo proporcional no período de quatro anos analisado pela pesquisa. Enquanto em 2005, cada parcela de mil paranaenses tinha 2,8 médicos, em 2009 esse índice passou para 3,3. Segundo o Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM/PR) há 18.379 médicos na ativa hoje no es­­tado. Para o presidente do Conselho, Carlos Roberto Goytacaz Rocha, há duas razões principais para o desnível na oferta de médicos: o primeiro são as más condições de trabalho no interior e o segundo é a baixa remuneração. “Na capital o médico encontra hospitais mais bem equipados, com melhores condições. Se ele vai para uma cidade pequena, o salário é muito baixo.”

O CRM e o Conselho Federal de Medicina defendem a aprovação da PEC 29, que exige o repasse fixo de recursos dos estados, municípios e da União para o setor da saúde. Assim, conforme Goytacaz, se reduziriam os problemas no interior. Outro problema, lembra ele, é a ausência de planos de cargos e carreira que fixem o médico nas prefeituras, já que muitos gestores apelam para as terceirizações.

Cidades querem proibir consumo de álcool nas ruas

GAZETA DO POVO, 20 de novembro de 2010


Pelo menos duas das maiores cidades do Paraná pretendem proibir o consumo de bebidas alcoólicas em áreas públicas como praças, parques, bosques, ruas e avenidas. A iniciativa prevê multa e prisão para quem for flagrado ingerindo bebidas alcoólicas fora dos locais destinados para a venda e consumo desse tipo de produto. Na Câmara dos Deputados tramita um projeto similar, o PL 7.776/10, do deputado Dr. Talmir (PV-SP), que estende a restrição a todo o país.

Os textos dos projetos de leis que estão sendo discutidos em âmbito federal e por vereadores de Foz do Iguaçu e de Cascavel, no Oeste do estado, definem bebida alcoólica como aquela cuja composição apresenta concentração igual ou superior a 0,5 grau Gay-Lussac. No Brasil, as cervejas, por exemplo, possuem teor alcoólico médio de 4,5º. A proposta do deputado federal prevê detenção de 10 dias a um mês ou multa, mas não define quem faria a fiscalização do cumprimento da lei. O projeto em tramitação na Câmara de Foz estabelece que o valor da punição terá como referência a unidade fiscal do município. O controle será feito pela Guarda Municipal.

A justificativa para a proibição se baseia na opinião de especialistas que relacionam o consumo exagerado álcool à violência e às mortes no trânsito e aos prejuízos para a saúde individual e coletiva.

Nesse sentido, o PL 99/10, do vereador de Foz Rodrigo Cabral (PSB) deixa claro que “para fins de segurança pública e proteção da saúde fica proibido o consumo de bebidas alcoólicas com graduação igual ou superior a 0,5º em locais públicos de uso coletivo que não tenham por natureza esta finalidade específica”. O projeto que deveria ser votado na sessão o dia 11 recebeu pedido de vista do vereador Edílio Dall’Agnol (PSB) e deve ser devolvido para nova discussão na próxima semana.

Em Cascavel, o projeto de autoria do vereador Mario Seibert (PTC), apresentado em 2009, causou tanta polêmica que o parlamentar decidiu retirá-lo da pauta e estuda reapresentá-lo ainda neste ano. “O excessivo consumo de bebidas alcoólicas por jovens e adultos em locais públicos está gerando, além do constrangimento, uma insegurança às famílias que utilizam desses espaços”, justifica.

Em Brasília - Mesmo reconhecendo que a responsabilidade é pessoal e intransferível, para o deputado paulista Dr. Talmir “cabe ao Estado impor severas restrições ao consumo de bebidas alcoólicas, sobretudo para desestimular o hábito de ingeri-las em excesso ou de forma abusiva”, a exemplo do que já vem sendo feito com o fumo. O projeto que tipifica a conduta como contravenção penal aguarda parecer da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.

Para o psiquiatra e presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead), Carlos Salgado, o hábito de beber em locais públicos, modelo bastante difundido e incentivado socialmente, tem influência direta sobre o consumo de bebidas alcoólicas. “Esta regulação da venda e disponibilidade é uma medida importante e organizadora da vida social. Dependendo do grau de disseminação de determinado comportamento, qualquer controle que não seja restritivo fica dificultado.”

Salgado lembra, no entanto, que para se garantir a eficiência da proposta, é necessário que as regras de aplicação e de punição sejam muito bem especificadas. É preciso ainda, recomenda, a promoção de uma ampla campanha de esclarecimento, com as orientações necessárias sobre as razões e implicações da lei. “Apesar de a iniciativa ser polêmica, entendo que é infundado não apoiar resoluções como estas considerando a desproporção entre os benefícios do beber e o seu enorme custo social.”

Propostas de proibir o consumo de bebidas alcoolicas em locais públicos vêm sendo debatidas em São Paulo e Santa Catarina. Fora do país, a proibição já existe, na Austrália e Estados unidos, por exemplo.

Energia - mitos que custam caro

O ESTADO DE S. PAULO, Washington Novaes, 20 de novembro de 2010


É preciso prestar atenção ao estudo que acaba de ser divulgado pela Confederação Nacional da Indústria (Estado, 11/11), segundo o qual a indústria brasileira pode economizar 25% da energia que consome, a começar pela indústria siderúrgica, seguida pelos setores de cerâmica, química, papel e celulose e cimento. É um trabalho na mesma direção do estudo feito em 2006 pela Unicamp, WWF e outras instituições, mostrando que o País pode viver tranquilamente com metade da energia que consome hoje: pode economizar 30% com conservação e eficiência energética (tal como fez no "apagão de 2001, sem nenhum prejuízo para o País); mais 10% com ganhos nas linhas de transmissão (que hoje perdem entre 15% e 17% da energia que transmitem); e mais 10% repotenciando geradores antigos de usinas, hoje com baixo rendimento, e a custos muitas vezes menores que o da construção de mais hidrelétricas. Esse estudo está sendo revisto neste momento por um grupo no Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo, coordenado pelo ex-ministro e ex-secretário José Goldemberg, que está preocupado com o processo de licenciamento de novas usinas na Amazônia, principalmente nas regiões dos Rios Teles Pires e Tapajós, que implicam problemas em terras indígenas, parques e áreas federais de conservação - sem falar no projeto de Belo Monte, que recebeu no próprio Ibama mais dois pareceres contrários ao início das obras.


Curiosamente, o planejamento federal no Brasil continua a trabalhar com a premissa de que o País, para crescer 7% ao ano nos próximos 12 anos, precisa dobrar seu consumo per capita de energia (Agência Brasil, 7/7). E para isso precisaria acrescentar mais 5,1 GW ao seu potencial energético a cada ano, até 2022. Planejamento provavelmente comandado pelo oligopólio das grandes construtoras de usinas, geradoras e distribuidoras de energia - levando em conta seus interesses específicos, não exatamente os de todo o País. Não por acaso, o governo federal inicia neste momento o leilão de mais dez hidrelétricas, com potência total de 3.820 MW, metade das quais nas bacias dos Rios Teles Pires e São Francisco e metade na do Parnaíba (Maranhão e Piauí). As hidrelétricas do Teles Pires serão altamente complicadas, por incluírem terras indígenas e parques nacionais, da mesma forma que as da bacia do Tapajós, que deverão vir logo a seguir.

Se ainda fosse pouco, o setor de energia está dando prioridade nos novos leilões a usinas termoelétricas, altamente poluidoras, sob o pretexto de poupar água nos reservatórios de hidrelétricas. Por essas e outras, o consumo médio de energia termoelétrica em setembro último chegou a 12,5 vezes mais que em setembro do ano passado (Folha de S.Paulo, 7/10). Tem mais: o governo federal dobrou o subsídio para uso de energia termoelétrica na Região Norte do País, que este ano vai para R$ 4 bilhões - distribuídos pelas contas de todos os consumidores no País, inclusive dos que eventualmente estejam lendo este artigo. Algo tão abstruso que o Tribunal de Contas da União já sentenciou que a Aneel não tem nenhum controle sobre o consumo real de combustível nas 301 termoelétricas da região (Folha de S.Paulo, 14/8) - enquanto destina a energia hidrelétrica de Tucuruí, muito mais barata, quase toda para os conglomerados de exportação de alumínio, com altíssimos subsídios (que também vão para a conta de todos os consumidores no País). Da mesma forma que provavelmente fará com a energia da vergonhosa Usina de Belo Monte. E por essas e outras a produção de energia termoelétrica passou de 5,6% do total em junho do ano passado para 7,8% em junho deste ano (idem, 7/7).

A iniciativa do estudo da Confederação Nacional da Indústria, por isso, é muito bem-vinda. Outro estudo, do IFC, que é órgão do Banco Mundial, mostrou há poucos dias que os edifícios comerciais e públicos no Brasil consomem 80% da energia total (reforçando a tese da possibilidade de redução enfatizada pela Unicamp/WWF). A economia de energia fica ainda mais decisiva se se atentar para números divulgados por este jornal (3/9): 54,8% da energia consumida no País não provém de fontes renováveis, só o petróleo e derivados respondem por 40% (hidrelétrica, 13,9%).

Também adquire importância excepcional iniciativa da Hidrelétrica de Itaipu de estimular e financiar a implantação de sistemas geradores de energia em pequenas propriedades rurais a partir do biogás derivado de dejetos animais (bois, porcos, frangos). Além de reduzirem seus gastos com o pagamento de energia da rede, principalmente nos horários de pico (quando ela é mais cara), os pequenos produtores podem colocar o excedente da produção de energia na rede estadual de distribuição e ser remunerados por isso. É um exemplo a ser seguido em todo o País.

A cada dia são mais alarmantes as notícias sobre desastres climáticos, intensificados pela emissão de gases que se concentram na atmosfera, bem como sobre a insustentabilidade dos atuais níveis de consumo de recursos no mundo. O relatório sobre "pegada de carbono" na China divulgado pelo WWF (Agência EFE, 16/11) diz que, se o mundo usasse recursos e gerasse resíduos como a China, "necessitaria de um planeta 1,2 vez maior que a Terra". E nesse país "a construção e o transporte, associados ao avanço no nível de vida, contribuíram em grande medida para que as emissões de dióxido de carbono atingissem 54% do impacto ecológico nacional". Já como a maior emissora de poluentes no mundo, a China compromete-se a reduzir sua "intensidade de carbono" (emissões totais divididas pelo PIB) entre 40% e 45% até 2020, calculada sobre 2005.

Lá, como em toda parte, o setor da energia é o maior responsável por emissões. Por isso o mundo terá de caminhar rapidamente para a redução do consumo de energia e para o uso de combustíveis renováveis e não poluentes. Não se deve perder tempo.