quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Ação da PM na Casa foi inédita no Brasil, dizem especialistas

GAZETA DO POVO, 3 de fevereiro de 2011

A ocupação do prédio da Assem­­bleia Legislativa por policiais militares a pedido do presidente da própria Casa é um fato inédito no país desde o restabelecimento do regime democrático em 1985. Historiadores e cientistas políticos ouvidos pela Gazeta do Povo não se recordam que algo semelhante tenha ocorrido nos Legislativos estaduais.

“Não tenho lembrança de que [uma ocupação dessa natureza] tenha acontecido em alguma Assembleia Legislativa, e muito menos em um estado rico como o Paraná”, diz o cientista político e historiador Octaciano Noguei­­ra, da Universidade de Brasília (UnB). O historiador Marco Anto­­nio Villa, da Universidade Fede­­ral de São Carlos (UFSCar), também não se recorda de ter visto algo semelhante. “Não me lembro de nenhum caso como esse e espero que seja a última vez que vejo algo assim ocorrer porque é algo muito grave.”

Embora inédito, o caso do Paraná é possível num Estado Democrático de Direito. Como observa a cientista política Maria do Socorro Braga, também da UFSCar, o Legislativo pode solicitar ajuda da polícia sempre que se sente ameaçado.

O cientista político Mário Sérgio Lepre, da PUCPR, concorda que o uso das forças polícias é legítimo para proteger qualquer espaço público que esteja ameaçado. “Mas não sei se a proporção disso foi adequada”, comenta Lebre. Na avaliação de Maria do So­­corro, esse é o momento de os de­­putados do Paraná começarem a repensar o sistema de se­­gurança da Casa. “Talvez o estabelecimento de uma polícia le­­gislativa seja uma saída”, comenta a professora. Já para Villa, o ideal é manter a segurança nas mãos da PM: “Uma polícia legislativa abriria mais espaço para o corporativismo”.


A ocupação da Assembleia
e o "nosso" Morro do Alemão

GAZETA DO POVO, Blog Caixa Zero, 3 de fevereiro de 2011

Os termos usados para definir os acontecimentos na Assembleia Legislativa nesta quarta-feira lembram, não por acaso, os fatos ocorridos no Rio de Janeiro em dezembro passado, quando a polícia finalmente conseguiu retomar do tráfico o Morro do Alemão.

Falou-se ontem em "ocupação", como ocorreu no Rio. Falou-se em "retomar a Assembleia" como se mencionava, dois meses atrás, a "retomada de território" no Rio de Janeiro. E falou-se em "poder paralelo".

E esse é o verdadeiro elo entre uma e outra situações. A denúncia de que, em ambos os casos, havia um "poder paralelo" que atuava fazendo algo que só seria permitido aos poderes públicos.

No Rio, fazia-se o tráfico. Na Assembleia, segundo o presidente Valdir Rossoni e vários deputados ouvidos (alguns dos quais preferiram nem dar o nome, por medo de retaliações), menos o tráfico, fazia-se de tudo um pouco.

A reportagem achou depoimentos de gente que preferiu deixar de ser deputado estadual em parte por medo do tal poder paralelo (leia mais na versão impressa).

A dúvida, assim como no Rio, também é a mesma. Como é que se chegou a essa situação?

No morro carioca, ainda havia a desculpa de que o local era isolado e de difícil acesso. Mas em plena sede da Assembleia Legislativa? Num prédio público do Centro Cívico de Curitiba?

Só se pode imaginar que alguém tenha sido conivente com isso. Que a questão tenha saído de controle de todos é outra história. Mas alguma força atuou para montar esse poder. E quem podia atuar contra isso, aparentemente, nada fez. Ou porque não pôde, ou porque não quis.

O fato é que foi preciso que a sociedade começasse a ver o que havia nos bastidores da Assembleia para que tudo começasse a mudar. E o que se iniciou com denúncias de corrupção acabou levando a outros tipos, cada vez menos imagináveis em um Legislativo, que agora vão sendo desvendados.

É como diz a velha frase: não há desinfetante como a luz do sol. Bastou um pouco mais de transparência (trazida pela sociedade, não por vontade da Assembleia) para que os problemas começassem a se resolver.

Que ninguém mais duvide do poder da informação. Ele move montanhas. E ajuda a remover poderes paralelos.

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