quarta-feira, 6 de outubro de 2010

No rescaldo do impasse na Ficha Limpa

O GLOBO, 6 de outubro de 2010


Apurados os votos, surgem em toda a dimensão os efeitos negativos do fato de o Supremo Tribunal Federal (STF) não ter sido capaz de superar o impasse causado pelo empate em cinco votos em torno da vigência da Lei da Ficha Limpa.

A primeira decorrência deletéria foi, no desdobramento da renúncia de Joaquim Roriz, cuja candidatura ao governo de Brasília era o tema em julgamento, o político haver colocado em seu lugar um candidato laranja, a mulher Weslian, sem qualquer preparo para disputar eleições. O que dirá assumir o cargo.

Mas o poder de Roriz de ordenhar votos em currais eleitorais levou-a a um segundo turno com o candidato petista, Agnelo Queiroz.

Nas eleições proporcionais é que os problemas são extensos. Um levantamento, ainda sem considerar o Acre, calcula em 8,6 milhões os votos colocados em suspenso, à espera da decisão final do STF. Na lista dos dependente do veredicto judicial estão dois candidatos a governo estadual, sete senadores, 42 deputados federais e 92 estaduais.

Há casos de puxadores de votos fichas-sujas cuja eliminação do pleito como se espera alterará a composição de casas legislativas. Como candidatos se elegeram com parte desses votos, eles também não poderão ser diplomados. Paulo Maluf (PPSP), ficha-suja notório, por exemplo, amealhou 497.203 votos, ajudando outros candidatos da legenda.

Situação idêntica à de Anthony Garotinho (PR-RJ), dono de 693.705 votos, todos sob risco de não serem contabilizados oficialmente.

A situação no Pará é única. Estão sub judice os candidatos ao Senado Jader Barbalho (PMDB) e Paulo Rocha (PT). A votação dos dois somou cerca de 3,5 milhões de votos, ou 57% do total. Assim, se mais da metade dos votos paraenses dados a concorrentes para o Senado for declarada nula, outro pleito terá de ser convocado.

Basta que saia vencedora no STF a tese de que a Ficha Limpa, por tratar de matéria constitucional a probidade do homem público , não se subordina à regra da anualidade exigida para alterações na legislação eleitoral. Além disso, argumenta-se, sequer a Ficha Limpa faz mudanças nesta legislação; apenas estabelece novos critérios para a sua aplicação.

A própria supressão dos votos dados aos fichas-sujas não é pacífica, pois há quem de-fenda que, conforme decisão anterior do STF, os partidos são os donos da expressão da vontade do eleitor. O voto é do partido, não do candidato. A ver.

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Ricardo Lewandowski, também ministro do Supremo, remeteu ontem ao STF o recurso do deputado Jader Barbalho à condenação pela Lei da Ficha Limpa. A mais alta Corte do país poderia se apressar para colocar o processo em julgamento, a maneira mais rápida de tentar romper o impasse, sem esperar a nomeação do 11oministro, depois do segundo turno.

E espera-se que todos reflitam sobre propostas colocadas em discussão no julgamento do caso Roriz. Uma delas, defendida pelo próprio Lewandowski, com apoio no regimento interno da Corte, a da proclamação do veredicto anterior (TSE), a favor da vigência imediata da lei, caso ocorra novo empate.

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