sexta-feira, 18 de junho de 2010

Em Londrina, 21 pessoas são denunciadas por fraude milionária em contratos públicos

JORNAL DE LONDRINA, 18 de junho de 2010

Representantes e dirigentes do Ciap, com base em Londrina, foram denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF) por prática de crimes de quadrilha, peculato e lavagem de dinheiro


O Ministério Público Federal (MPF) informou nesta quinta-feira (17) que 21 pessoas foram indiciadas sob acusação de participar de um esquema milionário de desvio de recursos públicos através do Centro Integrado de Apoio Profissional (Ciap)). Representantes e dirigentes da Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), com sede em Londrina, foram denunciados, na terça-feira (15), por prática de crimes de quadrilha, peculato e lavagem de dinheiro. A ação penal é resultado da Operação Parceria, realizada no início de maio e que resultou na prisão de 12 pessoas, entre elas, o coordenador do Ciap, Dinocarme Aparecido Lima.

De acordo com o MPF, as investigações da Polícia Federal (PF), em conjunto com a Controladoria Geral da União (CGU) e Receita Federal (RF), apontam que os dirigentes do Ciap “construíram uma organização criminosa, estruturada no Paraná, com atuação em todo o país, voltada ao desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro”. Pelas investigações, a organização tinha ajuda, inclusive, de funcionários do Ciap.

Entre os denunciados pelo MPF estão Dinocarme Aparecido Lima; a mulher dele, Vergínia Aparecida Mariani; a enteada dele, Elzira Vergínia Mariani Guides Martins; além dos filhos José Roberto de Lima e Sergio Ricardo de Lima; e o genro Alexandre Pontes Martins. Todos ocupavam cargos de administração no Ciap ou empresas do grupo que, segundo a investigação, eram utilizadas no esquema.

Também foi denunciado o advogado da Oscip, Fernando José Mesquita, que chegou a ser preso e pagou fiança de mais de R$ 300 mil para sair da cadeia. Outros denunciados, segundo o MPF, são o responsável pela área de contabilidade, José Ancioto Neto; e funcionário do Ciap que tratava da administração geral dos negócios relacionados às parcerias e convênios, Said Yusuf Abu Lawi. O MPF aponta ainda que foram denunciados lobistas, outros funcionários e controladores de empresas envolvidas no esquema de lavagem de ativos.

Organização criminosa - O MPF identificou que o modo de ação da organização “identificava recursos públicos disponíveis para celebração de termos de parceria ou convênios, com prévia atuação de lobistas pertencentes ao grupo para direcionar os recursos para o Ciap”. Para que a Oscip pudesse desviar o dinheiro, os planos de trabalho não detalhavam as despesas, o que dificultava a verificação da aplicação do recurso público firmado em parceria.

A cada parceria, uma conta bancária era aberta, de onde o dinheiro desviado era sacado, em espécie, e transferido para empresas ligadas ao grupo ou outra conta do Ciap. A partir destas contas, o dinheiro era sacado novamente em espécie e depositado em contas dos denunciados ou terceiros favorecidos, além de novas transferências para empresas ligadas ao grupo. Para justificar os gastos nas prestações de contas, o grupo utilizava fraudes contábeis e documentais, dando a “aparência de licitude às operações financeiras que concretizavam o desvio e a apropriação dos recursos”.

A denúncia cita diversas empresas ligadas ao coordenador do Ciap, Dinocarme Aparecido Lima, tais como a Meridional Locadora de Veículos S/S Ltda, que recebeu R$ 12 milhões; Divicon Construtora e Incorporadoria Ltda, que recebeu R$ 2,9 milhões; Inesul Instituto de Ensino Superior de Londrina, para onde foram R$ 2,9 milhões, entre outras. Segundo o MPF, as empresas estão envolvidas no crime de peculato, pois foram beneficiárias do recurso público. Já em relação aos convênios firmados no Paraná, a Controladoria Geral da União apontou desvio de cerca de R$ 20,2 milhões.

A reportagem entrou em contato com a Meridional Locadora de Veículos. Ao aguardar na linha, a mensagem de propaganda no telefone falava sobre cursos da Inesul. As duas empresas funcionam no mesmo endereço. Na Inesul, a pessoa responsável pelo setor jurídico não estava. O JL não conseguiu contato com a Divicon Construtora e Incorporadoria.

Convênios - Dentre os convênios firmados com o Ciap, diversos deles são com a prefeitura de Londrina. Nas parcerias com o município, os desvios chegam a R$ 14,7 milhões, relativo a programas na párea da saúde entre 2004 e 2009. São eles: o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), as Policlínicas, o Programa Saúde da Família (PSF), além do programa de Endemias e os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (Nasf).

Em Rolândia, foram desviados, de acordo com as investigações, R$ 1,9 milhão dos Programas Saúde da Família e Controle Ambiental de Endemias, entre 2003 e 2007; Em Campo Largo, na Região Metropolitana de Curitiba (RMC), o convênio do Ciap com a prefeitura é dos Programas Saúde da Família e Estruturação de Unidades de Atenção Especializada (Policlínicas), abrangendo os anos de 2003 a 2005.

Há ainda outros dois convênios, um firmado com pelo Ministério do Trabalho e Emprego referente ao “Consórcio Social da Juventude de Londrina” e outro entre o Ministério do Trabalho e a Secretaria de Estado do Trabalho e Promoção Social do Estado do Paraná para capacitação profissional em diversas cidades do Paraná, sendo o Ciap o executor do projeto. Nesses dois convênios foram desviados R$ 1,9 milhão e R4 1,6 milhão.

Dentre as prefeituras envolvidas e conveniadas com o Ciap, a única que ainda mantém contratos com a Oscip é Londrina. O secretário de Gestão Pública do município, Marco Cito, disse que aguarda confirmação de indícios para possivelmente rescindir o contrato com o Ciap. “Nós precisamos materializar os indícios. Se forem confirmados, cabe-se a rescisão”, declarou o secretário. De acordo com ele, as informações divulgadas pelo MPF ajudam a acelerar o trabalho da controladoria do município, que investiga os contratos com a Oscip. “A informação de que a data dos contratos chega a 2009 reforça e ajuda a controladoria a ser mais especifica.”

Cito disse que, do ponto de vista formal, o contrato é regular e seria uma irresponsabilidade romper com a empresa neste momento. “Não podemos ser irresponsáveis de rescindir sem ter elementos senão a gente abre a possibilidade da empresa entrar na Justiça contra o município”, afirmou. De acordo com ele, entretanto, a secretaria de Saúde já está organizando uma possível nova licitação. “Não podemos interromper o serviço e prejudicar os trabalhadores.”

A assessoria de imprensa de Rolândia informou que atualmente não há nenhum contrato com o Ciap. Segundo a prefeitura, todas as parcerias foram da gestão anterior. A assessoria de imprensa de Campo Largo informou que o contrato com o Ciap se encerrou no primeiro ano da gestão do prefeito Edson Basso (PMBD), reeleito e atual prefeito da cidade. De acordo com a prefeitura, os contratos já haviam quando Basso assumiu a prefeitura, e se mantiveram até agosto daquele ano, por meio de aditivo, “para que os serviços não paralisassem”.

Procurador - A reportagem tentou contato com o procurador responsável pela denúncia, Alexandre Melz Narde. Entretanto, por meio da assessoria de imprensa, informou que não dará entrevistas neste momento. A assessoria informou ainda que não poderia disponibilizar a denúncia porque há detalhes que estão sob segredo de Justiça.

O JL tentou contato com todos os envolvidos. Três deles estão presos, segundo a assessoria de imprensa do próprio Ciap. Dinocarme Aparecido Lima, Elzira Vergínia Mariani Guides Martins e José Ancioto Neto. O restante não foi localizado pela reportagem, exceto o diretor Paulo Cesar Chanan Silva. “Não posso falar nada sobre o assunto. Foi instrução do advogado”, afirmou, por telefone. Chanan disse ainda que não poderia nem revelar o nome do advogado responsável pela defesa dele e de outros envolvidos. A assessoria de imprensa do Ciap informou que não tinha informações naquele momento.

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