O ESTADO DE S. PAULO, Editorial, 9 de setembro de 2009
O presidente Nicolas Sarkozy talvez não seja um grande vendedor, mas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com certeza, é um grande comprador. Sarkozy veio ao Brasil como convidado especial para as solenidades do 7 de Setembro e para fazer um balanço da implementação dos acordos bilaterais de cooperação, inclusive do acordo pelo qual a França fornecerá ao Brasil meia centena de helicópteros, quatro submarinos, um casco para o futuro submarino nuclear, além de promessas de transferência de tecnologias, exceto nuclear. Tudo isso a um custo estimado em cerca de R$ 25 bilhões. Quando voltou para Paris, Sarkozy levava no bolso também o compromisso do governo brasileiro de iniciar negociações com a Dassault para a compra de 36 caças Rafale, a um custo que oscilará entre R$ 7 bilhões e R$ 10 bilhões. Sem ouvir a FAB, Lula atalhou um processo de seleção de equipamentos iniciado em 1994.
Em menos de 24 horas e em circunstâncias que sugerem aquilo que os frequentadores de shopping centers chamam de "impulso de compras", o presidente Luiz Inácio Lula da Silva atrelou a defesa e a segurança nacionais do Brasil, bem como aspectos cruciais da política externa, a um único fornecedor de equipamentos. Os compromissos assumidos em Brasília, no Dia da Independência, são de longa duração. O reaparelhamento da Marinha não se fará em menos de 10 anos - sem interrupções -, não sendo demais estimar o dobro desse tempo para o lançamento do primeiro submarino nuclear nacional. Os aviões de caça, por sua vez, deverão ter uma vida útil de cerca de três décadas - e note-se que 36 aparelhos são apenas o início de um processo de substituição de pelo menos mais uma centena de aviões de combate.
Desde o final da 2ª Guerra Mundial, os principais estrategistas brasileiros salientavam a necessidade de obter equipamentos militares de outros fornecedores que não os Estados Unidos, para evitar ter de absorver a doutrina de emprego desse armamento, que consideravam inapropriada para as condições e os propósitos do Brasil. E, de fato, isso foi sendo feito gradualmente, até que o presidente Ernesto Geisel rompeu de inopino o Acordo Militar Brasil-Estados Unidos. Mas não se podia imaginar que o presidente Lula, que sempre manifestou sua admiração pelo modelo de governo Geisel, fosse de um extremo ao outro. Para não ficar dependente dos Estados Unidos - o que dificilmente aconteceria, mesmo que o avião escolhido para a FAB fosse o F-18 da Boeing -, ficou dependente da França.
E nem se pode dizer que os acordos e compromissos até aqui assumidos permitirão ao Brasil dar um salto tecnológico nas áreas de produção de sistemas avançados de armas, que coloquem o País como líder incontestável da região. O compromisso de compra dos Rafale, por exemplo, foi feito de afogadilho. "Os nossos companheiros trabalharam até quase as 2 horas. Eu nem sequer tive tempo de fazer reunião com o ministro da Defesa para discutir com profundidade", confessou o presidente Lula. O comandante da Aeronáutica, ao que parece, ficou sabendo de tudo no final do expediente, pois os militares foram excluídos do processo de decisão. De fato, essa decisão nem mesmo constava do texto da declaração conjunta assinada pelos dois presidentes. Foi acrescentada, em folha avulsa, depois que o presidente Sarkozy manifestou a intenção - apenas isso - de comprar dez aviões cargueiros de um modelo que a Embraer ainda está projetando. Vivo fosse, o general De Gaulle diria que este ainda não é um país sério.
A França fica com a parte do leão desse negócio milionário. O Brasil compra submarinos convencionais por preço elevado. De quebra, os franceses construirão uma base e um estaleiro. Não repassarão tecnologia nuclear e, a que transferirem, será para uma empresa constituída pela DNCS francesa e pela Odebrecht brasileira - que entrou nesse negócio sem licitação, a convite não de quem paga a conta, mas dos franceses.
No caso dos Rafale, a França livra-se de um problema. O avião foi um fracasso de vendas e, com o negócio brasileiro, amortiza-se boa parte das despesas de projeto e desenvolvimento do caça. A FAB, por sua vez, receberá aviões novos, aos quais certamente dará bom uso. E os contribuintes, bem, esses arcarão com os custos de um negócio feito às pressas e que implicará significativo aumento do orçamento militar, que só é menor que o da Saúde.
O presidente Nicolas Sarkozy talvez não seja um grande vendedor, mas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com certeza, é um grande comprador. Sarkozy veio ao Brasil como convidado especial para as solenidades do 7 de Setembro e para fazer um balanço da implementação dos acordos bilaterais de cooperação, inclusive do acordo pelo qual a França fornecerá ao Brasil meia centena de helicópteros, quatro submarinos, um casco para o futuro submarino nuclear, além de promessas de transferência de tecnologias, exceto nuclear. Tudo isso a um custo estimado em cerca de R$ 25 bilhões. Quando voltou para Paris, Sarkozy levava no bolso também o compromisso do governo brasileiro de iniciar negociações com a Dassault para a compra de 36 caças Rafale, a um custo que oscilará entre R$ 7 bilhões e R$ 10 bilhões. Sem ouvir a FAB, Lula atalhou um processo de seleção de equipamentos iniciado em 1994.
Em menos de 24 horas e em circunstâncias que sugerem aquilo que os frequentadores de shopping centers chamam de "impulso de compras", o presidente Luiz Inácio Lula da Silva atrelou a defesa e a segurança nacionais do Brasil, bem como aspectos cruciais da política externa, a um único fornecedor de equipamentos. Os compromissos assumidos em Brasília, no Dia da Independência, são de longa duração. O reaparelhamento da Marinha não se fará em menos de 10 anos - sem interrupções -, não sendo demais estimar o dobro desse tempo para o lançamento do primeiro submarino nuclear nacional. Os aviões de caça, por sua vez, deverão ter uma vida útil de cerca de três décadas - e note-se que 36 aparelhos são apenas o início de um processo de substituição de pelo menos mais uma centena de aviões de combate.
Desde o final da 2ª Guerra Mundial, os principais estrategistas brasileiros salientavam a necessidade de obter equipamentos militares de outros fornecedores que não os Estados Unidos, para evitar ter de absorver a doutrina de emprego desse armamento, que consideravam inapropriada para as condições e os propósitos do Brasil. E, de fato, isso foi sendo feito gradualmente, até que o presidente Ernesto Geisel rompeu de inopino o Acordo Militar Brasil-Estados Unidos. Mas não se podia imaginar que o presidente Lula, que sempre manifestou sua admiração pelo modelo de governo Geisel, fosse de um extremo ao outro. Para não ficar dependente dos Estados Unidos - o que dificilmente aconteceria, mesmo que o avião escolhido para a FAB fosse o F-18 da Boeing -, ficou dependente da França.
E nem se pode dizer que os acordos e compromissos até aqui assumidos permitirão ao Brasil dar um salto tecnológico nas áreas de produção de sistemas avançados de armas, que coloquem o País como líder incontestável da região. O compromisso de compra dos Rafale, por exemplo, foi feito de afogadilho. "Os nossos companheiros trabalharam até quase as 2 horas. Eu nem sequer tive tempo de fazer reunião com o ministro da Defesa para discutir com profundidade", confessou o presidente Lula. O comandante da Aeronáutica, ao que parece, ficou sabendo de tudo no final do expediente, pois os militares foram excluídos do processo de decisão. De fato, essa decisão nem mesmo constava do texto da declaração conjunta assinada pelos dois presidentes. Foi acrescentada, em folha avulsa, depois que o presidente Sarkozy manifestou a intenção - apenas isso - de comprar dez aviões cargueiros de um modelo que a Embraer ainda está projetando. Vivo fosse, o general De Gaulle diria que este ainda não é um país sério.
A França fica com a parte do leão desse negócio milionário. O Brasil compra submarinos convencionais por preço elevado. De quebra, os franceses construirão uma base e um estaleiro. Não repassarão tecnologia nuclear e, a que transferirem, será para uma empresa constituída pela DNCS francesa e pela Odebrecht brasileira - que entrou nesse negócio sem licitação, a convite não de quem paga a conta, mas dos franceses.
No caso dos Rafale, a França livra-se de um problema. O avião foi um fracasso de vendas e, com o negócio brasileiro, amortiza-se boa parte das despesas de projeto e desenvolvimento do caça. A FAB, por sua vez, receberá aviões novos, aos quais certamente dará bom uso. E os contribuintes, bem, esses arcarão com os custos de um negócio feito às pressas e que implicará significativo aumento do orçamento militar, que só é menor que o da Saúde.
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