sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Nova Lei do Inquilinato pode ter vetos de Lula

O ESTADO DE S. PAULO, 30 de outubro de 2009


Apesar da rapidez na tramitação e da unanimidade com que foi aprovado na Câmara e no Senado, o projeto que altera a Lei do Inquilinato pode sofrer vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A Casa Civil da Presidência e o Ministério da Justiça começaram a analisar os pontos polêmicos da nova lei, sobretudo aqueles que enfraquecem o equilíbrio de forças entre consumidores e pequenos empresários e os proprietários de imóveis.

O Estado apurou que são fortes as chances de veto parcial, alcançando alguns pontos polêmicos, dependendo da reação de entidades de defesa do consumidor e de órgãos civis, como a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), que divulgou nota ontem apontando danos às pequenas e microempresas.

Com 14 modificações, a nova Lei do Inquilinato agiliza o processo de despejo, adotando rito sumário em casos de má-fé do inquilino ou atrasos de pagamentos. Pelo projeto, bastará a expedição de um mandado de despejo para o locatário ser obrigado a deixar o imóvel dentro de um prazo de 30 dias, espontaneamente. Depois disso, ele será despejado compulsoriamente por ordem judicial. Hoje, é exigido que o inquilino receba dois mandados e duas diligências, o que faz o processo se arrastar, em média, por 14 meses.

O texto seguirá para sanção presidencial após a contagem de cinco sessões, o que deve ocorrer na próxima quarta-feira. Os dois ministérios terão, a partir daí, 15 dias para avaliar se recomendam vetos. O objetivo das alterações, segundo a senadora Ideli Salvatti (PT-SC), relatora do projeto, é reduzir o déficit habitacional no país, estimado em 8 milhões de moradias. Presume-se que haja 3 milhões de imóveis fechados por receio dos proprietários de colocá-los no mercado.

Ideli não acredita em vetos porque o projeto, segundo ela, teve ampla discussão na base governista e é um dos raros que encontrou apoio de todas as bancadas do Congresso, inclusive da oposição. O tema, a seu ver, é de relevante interesse para o País porque resolve uma insegurança jurídica que já durava 18 anos, causando conflitos entre inquilinos e proprietários. Ela garantiu que o direito de defesa dos locatários foi preservado, inclusive nos aluguéis comerciais.

As novas normas desobrigam a apresentação de fiador, mas nesse caso o inquilino fica sujeito à desocupação do imóvel ao bel prazer do proprietário. Quando houver fiador, este não precisará mais ficar amarrado ao contrato até o final, podendo pedir desligamento em caso de divórcio do inquilino ou de morte de um dos cônjuges, ou ainda por ocasião de renovação do contrato. Nesse caso, o inquilino terá 120 dias para apresentar novo fiador.

A senadora explicou que a demora na retomada de imóveis ocupados por maus inquilinos e o risco de ações judiciais intermináveis fazem com que muitos proprietários desistam de alugar. Com a mudança, a expectativa é que o tempo médio de retomada do imóvel caia para três ou quatro meses. Ela acredita que a maior oferta de imóveis provocará a queda no valor dos aluguéis. O projeto, segundo ela, também beneficia o inquilino bom pagador, que poderá ser desobrigado a registrar um fiador ou qualquer outra forma de garantia, como seguro ou depósito caução.

Nos casos de dissolução familiar ou de morte do inquilino, o fiador poderá renunciar às sua condição. Mas os efeitos da fiança perdurarão por 120 dias, após notificação do fato pelo locador.

A atual Lei do Inquilinato não prevê essas questões. O projeto cria a proporcionalidade na multa rescisória quando o imóvel for devolvido antes do prazo. Atualmente, a multa é linear e estabelecida desde o início do contrato.

Nova lei põe inquilinos em alerta
Aguardando apenas a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, as alterações na Lei do Inquilinato (em vigor desde 1991) ainda confundem muitas moradores e lojistas que pagam aluguel. Roque Pelizzaro Junior, presidente da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), considera a lei prejudicial à proteção ao pequeno varejista. Uma das mudanças não prevê o benefício da indenização para o caso de o locatário não conseguir renovar o contrato com o locador.

– Se estou com meu contrato em dia, vence o meu aluguel e o proprietário pede mais do que posso pagar, eu posso perder meu ponto, mas fico sem a indenização a que tinha direito. Isso tem que ser revisto – alerta o dirigente.

Inquilinos residenciais também estão preocupados. A autônoma Luciana Farias mora no Rio há cinco anos, em casa alugada no Jardim Botânico. Sem fiador, ela optou por dividir apartamento com uma amiga. Juntas, elas pagam mais de R$ 1 mil por mês.

– Como não tenho fiador aqui no Rio e acho seguro-fiança um absurdo, pago metade do aluguel para a minha amiga – explica, para em seguida elogiar a aceleração do processo de despejo. – Não tenho temor de ficar na rua porque costumo ser organizada e mesmo sendo demitida, certamente terei algum dinheiro, pois tem seguro desemprego e teria família para me dar apoio. Mas claro que tem que haver bom senso na hora do despejo. O proprietário deve ponderar entre uma pessoa descompromissada com suas responsabilidades e um profissional que atrasou o aluguel.

Morador de São Paulo há menos de um ano, o publicitário Gabriel Gil Carregal também optou por morar com um amigo para amenizar os gastos no aluguel. Ele paga por mês R$ 1.100 e já teve que deixar R$ 2.428 como seguro-fiança, o que representou mais do que o valor do aluguel e do condomínio.

– Acho horrível ter que pagar seguro-fiança, mas aqui em São Paulo muitas vezes não aceitam fiador de fora. Como seria meu caso e não queria perder o apartamento, não tive opção.

O presidente da CNDL elogia a intenção da nova lei em penalizar o inadimplente com possibilidade de despejo mais rápido (com ordem judicial depois de 30 dias), mas tem outras observações contra o projeto: – O locatário fica preso ao locador. A lei, dessa forma, equipara a venda do negócio à uma cessão de contrato. Ou seja, vou ter que pedir autorização ao proprietário para transferência dessa titularidade. Isso nos preocupa bastante – explica Roque, citando como beneficiados as grandes redes varejistas e grupos de shoppings centers. – Muitas das alterações já são vistas nos shoppings center. Me parece que é para os investidores poderem investir também nas lojas de rua.

Algo Gonçalves, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas do Rio (CDL-RJ), concorda com a ordem de despejo no caso de inadimplência, mas diz que o setor vai pedir uma audiência pública para “proteger casos específicos”. Roque faz coro e critica a forma como o projeto foi aprovado: – Não se dispuseram a discutir com a sociedade esse assunto. Não foi a Plenário, discutiu-se apenas dentro das comissões. Queremos aprimorar o projeto e vamos entrar com alguns recursos.

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