quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Leis anticorrupção: hora de ousar

CORREIO BRAZILIENSE, Bo Mathiasen, 27 de janeiro de 2011


Em 1º de fevereiro, uma nova legislatura se inicia no Brasil. Deputados e senadores eleitos em outubro do ano passado tomam posse para quatro e oito anos de mandato, respectivamente, e senadores eleitos em 2006 iniciam os quatro últimos anos da investidura.

Nessa data, que marca o começo do ano legislativo, é preciso que os representantes eleitos reafirmem seu compromisso com os esforços que vêm sendo empreendidos pelo Brasil para conter a corrupção. O início de um novo governo e de uma nova legislatura apresentam também o desafio de dar novos passos na construção de uma cultura de integridade e transparência.

O povo brasileiro vem exigindo de seus representantes uma postura de fato comprometida com a ética. O movimento Ficha Limpa evidenciou o desejo por integridade e demonstrou a força da mobilização social. O recado dos eleitores em 2010 foi claro: a corrupção não será mais aceita.

A partir de hoje, deputados e senadores têm a oportunidade de atender essa demanda legítima da população, dando efetivo andamento a projetos de lei em trâmite no Congresso Nacional que buscam sentar bases para a construção de uma sociedade mais íntegra.

É o caso do Projeto de Lei nº 5586/2005, que tipifica o crime de enriquecimento ilícito quando o funcionário público possuir bens ou valores incompatíveis com a renda, e do Projeto de Lei nº 7528/2006, que define critérios e restrições para ocupantes de cargos públicos que tenham acesso a informações privilegiadas.

Outro importante projeto de lei a ser aprovado pelos parlamentares é o de nº 5228/2009, que trata da garantia do acesso pleno, imediato e gratuito a informações públicas, do estabelecimento de critérios para proteção das informações pessoais e sigilosas, assim como da isenção do servidor público de ser responsabilizado por informar as autoridades competentes sobre atos de improbidade ou crimes.

Não menos importantes são os projetos de lei nº 6616/2009, que propõe tornar hediondos os tipos penais de peculato, concussão, corrupção passiva e corrupção ativa, e nº 6826/2010, que trata da responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas por atos contra a administração pública.

Por fim, deputados e senadores terão a oportunidade de aprovar o Projeto de Lei nº 6577/2009, que propõe alterações na Lei de Lavagem de Dinheiro. O projeto determina infrações penais antecedentes à lavagem de dinheiro, amplia a lista de pessoas sujeitas a obrigações impostas pela mesma, cria o tipo penal “financiamento ao terrorismo” e permite a alienação antecipada de bens, direitos ou valores objetos dos crimes previstos nessa lei.

A existência desses projetos de lei demonstra que pelo menos uma parte da sociedade brasileira está consciente da necessidade de criar mecanismos para enfrentar a corrupção seguindo as convenções internacionais.

Todos os projetos citados acima atendem recomendações contidas na Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção e na Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, ambas ratificadas pelo Brasil.

É fato que o Brasil tem realizado importantes avanços no tema. O desenvolvimento de iniciativas como o Portal da Transparência e a demissão de mais de 3 mil funcionários públicos envolvidos em atos de corrupção pela Controladoria-Geral da União, por exemplo, demonstram a preocupação do país com a devida aplicação do dinheiro público, bem como com a responsabilização dos servidores envolvidos.

Mas o Brasil pode ser mais ousado. A adequação da legislação nacional para controlar a corrupção e o crime organizado transnacional é essencial para o desenvolvimento do país e para o fortalecimento do Estado de Direito. É preciso ter consciência de que cada centavo desviado por atos de corrupção deixa de ser aplicado em melhorias para o povo.

Agora, senadores e deputados podem trabalhar e se empenhar na defesa dos reais interesses dos eleitores, os mesmos que se mobilizaram no ano passado pela ética, pela integridade e pelo fim da corrupção.


Bo Mathiasen é dinamarquês; é o representante regional do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC) para o Brasil e o Cone Sul


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