quarta-feira, 18 de agosto de 2010

CIAP: a cada dia um novo problema em Londrina

JORNAL DE LONDRINA, 18 de agosto de 2010

Profissionais do PSF cruzam os braços para receber salários atrasados há mais de dez dias; pressão deu resultado. CIAP foi denunciado por corrupção e está com diretores ainda presos pela Polícia Federal em Curitiba


Afundado em suspeitas de corrupção e com diretores ainda presos pela Polícia Federal em Curitiba, o Centro Integrado de Apoio Profissional (Ciap) completa três meses sem se pronunciar publicamente sobre a avalanche de problemas enfrentados pela entidade. Até agora, a estratégia é o silêncio. Desde maio, o Ciap é alvo de investigações que apuram o desvio de mais de R$ 300 milhões em todo o Paraná – R$ 14 milhões apenas da Prefeitura de Londrina. O Ciap presta serviços para o Programa Saúde da Família (PSF) e o controle da dengue, faz a gestão da Políclinica na zona oeste e é responsável pelo Serviço de Atendimento Médico de Urgências (Samu). São 1,1 mil funcionários em serviços que somam R$ 65 milhões nos contratos firmados com a entidade desde 2004.

Ontem, pelo menos 700 profissionais ligados ao PSF paralisaram o atendimento nas 65 Unidades Básicas de Saúde (UBSs), em protesto contra a falta de pagamento de salários desde o dia 5.

Na sede do Ciap próximo à Prefeitura, quase 200 agentes comunitários de saúde (ACS), funcionários do PSF e do Serviço de Internação Domiciliar (SID), entre eles enfermeiros, médicos, odontologistas e auxiliares bloquearam as entradas da entidade. Exibiam, revoltados, extratos das contas pessoais zeradas, sem o depósito dos salários, apesar da Prefeitura alegar já ter enviado os recursos para a folha de pagamento ao Ciap. Carina Eveli, auxiliar de enfermagem do SID, afirmou que a situação está no limite. “Temos 100 pacientes terminais e em estado grave sem atendimento em casa. É lamentável porque eles são prejudicados diretamente”, lamentou.

Por toda cidade, a paralisação dos funcionários do Ciap piorou o que há tempos já era ruim nas 65 unidades básicas. Nos postos de saúde na zona rural de Londrina, praticamente não houve atendimento. Na UBS do Jardim Cafezal (zona sul), apenas 30% do corpo médico estava disponível. “Estamos muito cansados. A cada dia é um problema diferente e nos sentimos totalmente desmotivados”, diz a enfermeira Eliane Ferrari Dela Flora, 10 anos de PSF.

“Não recebi nem minhas férias e já está no prazo para que eu volte a trabalhar”, reclamava, com o comprovante de corte de energia residencial em mãos, uma agente comunitária da UBS da Vila Brasil (centro), onde o atendimento também ficou deficiente. “Uma humilhação para quem cuida da saúde da população”, define.

“Tem que haver uma entidade idônea para fazer o serviço”, protestava outra, alertando para a falta de recolhimento do FGTS pela entidade. Na UBS do Jardim São Lourenço, também na zona sul, o atendimento odontológico foi totalmente paralisado pela manhã: “Sem salários para quem trabalha, 13 pacientes vão voltar para a casa”, afirmou uma auxiliar de odontologia.

No final da tarde, os funcionários do Programa Saúde da Família receberam os salários. Os trabalhos serão retomados normalmente hoje.

Advogada se nega a falar - Enquanto o protesto ganhava adeptos na porta da sede, a diretoria do Ciap manteve-se fechada em reunião durante toda a manhã, mas não havia informações nem para trabalhadores nem para a imprensa. Como os diretores do centro nunca falaram sobre os escândalos e suspeitas sobre a entidade desde a Operação Parceria, deflagrada pela Polícia Federal, jornalistas enviaram um bilhete requisitando uma entrevista coletiva. No final da manhã, a advogada Maria Lúcia Lozovey, identificada como representante do Ciap, saiu da sede da entidade, dando a entender que falaria aos jornalistas. Hostilizada e vaiada, a advogada cruzou no meio dos manifestantes e negou-se, mais uma vez, a dar qualquer explicação à imprensa. Após a negativa, atravessou a Avenida Duque de Caxias a pé e entrou na Faculdade Inesul, do lado oposto à sede do Ciap. Sem dar declarações apenas pediu aos repórteres para que não a filmassem ou fotografassem, mesma atitude adotada na Câmara durante audiência pública na semana passada.

Ambulâncias continuam paradas - A paralisação do PSF é o episódio mais recente na crise que envolve o Centro Integrado de Apoio Profissional (Ciap). Na semana passada, 200 agentes de controle da dengue também pararam de trabalhar porque estavam sem salários, atrasando o Levantamento Rápido de Infestação (Lira). Na segunda-feira, a imprensa revelou que dos 12 veículos do Serviço de Atendimento Médico de Urgência (Samu), 9 estavam quebrados e apenas 3 funcionavam, obrigando a Secretaria de Saúde a pedir duas ambulâncias emprestadas ao governo do Paraná. A paralisação do serviço de ambulâncias foi alertada pela advogada do Ciap, que culpava a Prefeitura pela falta de recursos – que não foram liberados porque a entidade se nega a apresentar documentos e comprovações de despesas.

Ontem, a Prefeitura liberou recursos para o conserto. Segundo o secretário interino da Saúde, Jair Gravena, o valor era pequeno, cerca de R$ 350. Um dos veículos já está sendo utilizado nos atendimentos, o outro voltará a rodar hoje.

Procurador não descarta pedido de busca e apreensão - O procurador jurídico da Prefeitura, Demétrius Coelho Souza, afirma que o caos na saúde do Município é responsabilidade exclusiva do Ciap. “Depois que a Polícia Federal deflagrou a operação contra o Ciap passamos a exigir outros documentos para fazer os pagamentos. Como uma parte deles não nos chegou nem foi apresentada, a solução foi depositar em juízo referente ao que estava comprovado. Não conseguimos concluir a auditoria interna porque não tivemos acesso a esses documentos”, afirma.

Como o Ciap deve documentos, o procurador afirma que não descarta entrar com pedido de busca e apreensão na sede da entidade. “É o nosso próximo passo”. O procurador afirmou que a única possibilidade que ainda não foi avaliada é a de uma intervenção no Ciap. Neste caso, a Prefeitura encamparia instalações e executaria os serviços diretamente. “A Prefeitura, entretanto, já optou pela rescisão do contrato”.


Câmara decide não abrir CEI para investigar contratos com Ciap
A Câmara de Vereadores de Londrina não abrirá uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) para investigar contratos entre Prefeitura e Centro Integrado de Apoio Profissional (Ciap), entidade suspeita de um desvio milionário de recursos públicos. A informação foi confirmada, na manhã desta quarta-feira (18), pela vereadora Lenir de Assis (PT), integrante da Comissão de Seguridade Social da Câmara de Londrina.

Segundo Lenir, os membros da comissão se reuniram na noite da terça-feira (17) e definiram que, para ganhar tempo, vão acompanhar e avaliar as informações de todos os órgãos envolvidos nas investigações contra o Ciap, entre eles Ministério Público, Polícia Federal, Tribunal de Contas e auditoria da prefeitura. “Já fizemos pedidos de solicitação de informações e vamos analisar contratos e aditivos até chegar à raiz do problema, focar nele, e abrir uma CEI para tomar providências”, justificou.

A vereadora explicou que não adianta abrir uma CEI, neste momento, para chegar à mesma conclusão dos órgãos investigadores do caso. Para ela, é preciso realizar um trabalho em conjunto. Além de acompanhar as investigações, Lenir afirmou que os membros da Comissão de Seguridade vão visitar postos de trabalho e realizar ações específicas para cada caso. “Nosso papel é garantir o acesso aos serviços pela população e o pagamento dos salários dos funcionários da entidade”, ressaltou.

Lenir disse que a comissão vai trabalhar para que o problema do atraso dos salários dos funcionários do Ciap não se repita no próximo mês. No início de agosto, os salários dos 1,1 mil profissionais terceirizados atrasou duas semanas, o que gerou paralisação dos agentes de endemias e do Programa Saúde da Família (PSF).

“Na quinta-feira (19), vamos notificar o Executivo para apresentar um novo fluxo de trabalho mais ágil, para não ocorrer atrasos”. Na opinião da vereadora, o depósito em juízo realizado pela prefeitura não funcionou bem. Se o procedimento tiver que se repetir em setembro, ela recomendou que a prefeitura antecipe o pagamento.

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