sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Governo agora admite que faltaria Tamiflu

CÉLIA COSTA E EVANDRO ÉBOLI, O Globo, 4 de setembro de 2009

Remédio só não chegou às farmácias porque não havia estoque para suprir demanda. População só terá acesso ao remédio nas farmácias em 2010


Depois de restringir o uso do antiviral Tamiflu, usado no tratamento da gripe suína, alegando que a automedicação era perigosa, que somente pacientes em estado grave deveriam ter acesso ao medicamento e até que o vírus H1N1 poderia se tornar resistente, o Ministério da Saúde admitiu ontem: o remédio só não chegou às farmácias porque não havia estoque para suprir a demanda. O diretor de Vigilância Epidemiológica do Ministério da Saúde, Eduardo Hage, disse que o laboratório Roche, produtor do Tamiflu, deve distribuir o remédio e que, em 2010, qualquer um poderá adquiri-lo no balcão das farmácias.

— O próprio laboratório priorizou a demanda do ministério, o que foi correto.

Na medida em que foi aumentando a sua capacidade, ele informou que vai ter disponibilidade para atender à nossa nova demanda, bem como para comercializar o medicamento — disse Hage em audiência pública na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados.

A Roche, no entanto, informou que não há qualquer previsão de quando voltará a distribuir o Tamiflu para as farmácias.

As restrições ao uso do medicamento sempre receberam duras críticas de especialistas. Para eles, se o Tamiflu tivesse sido tomado de maneira menos restrita, o número de mortes por gripe suína no Brasil poderia ter sido menor. Segundo um boletim divulgado quarta-feira, no país morreram até agora 657 pessoas por causa da doença. O total de registros mantém o Brasil em primeiro lugar no mundo em número de óbitos causados pelo H1N1 — seguido de Estados Unidos (556) e Argentina (465).

A informação dada ontem por Hage contraria todas as explicações apresentadas pelo ministro da Saúde, José Gomes Temporão, desde o início da pandemia, para restringir a utilização do Tamiflu. Há um mês, mesmo depois de ampliar o uso do antiviral, Temporão determinou que apenas os serviços públicos fizessem a distribuição do medicamento. O ministro disse que isso evitaria uma “corrida às farmácias”.

Para especialistas, no entanto, o antiviral deveria ser administrado em pacientes com sintomas da doença nas primeiras 48 horas, período que o Tamiflu é mais eficaz no combate ao H1N1.

Especialista: mortes seriam evitadas

Para o infectologista Edmilson Migowski, a prova de que o uso mais amplo do medicamento diminuiria o número de mortes é que, depois que qualquer médico — da rede pública ou não — foi liberado a prescrever o medicamento, ocorreu uma redução do total de casos graves da doença.

De acordo com o boletim divulgado na quarta-feira, por três semanas consecutivas houve uma queda significativa dos registros. Entre 9 e 15 de agosto, foram 1.165 casos; dos dias 16 a 22 do mesmo mês, foram 639; finalmente, de 23 a 29 de agosto, foram 151 casos.

No fim de abril, mesmo antes da confirmação de qualquer caso da gripe suína no Brasil, aumentou a demanda pelo medicamento e os estoques encolheram. Depois disso, o remédio não voltou mais aos balcões das drogarias. Segundo a Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias, o governo federal comprou todo o estoque de Tamiflu das grandes redes. O Ministério da Saúde passou a ser o único com acesso ao fabricante.

Segundo nota do ministério divulgada ontem, não há proibição à venda do remédio nas farmácias. “O fato é que o único laboratório fabricante do medicamento, o Roche, deu prioridade aos pedidos de compra feitos pelo Ministério da Saúde (...). Essa medida é necessária para que o governo federal cumpra a sua missão de oferecer o medicamento gratuitamente à população em caso de necessidade”, diz o texto. Ainda na nota, o ministério garante que não há falta do medicamento e que encomendou ao laboratório nove milhões de tratamentos, com entrega prevista até maio de 2010.

Nenhum comentário: