sexta-feira, 16 de abril de 2010

Ex-secretário de Nedson Micheleti (PT) é investigado por suposto mensalinho

FOLHA DE LONDRINA, 16 de abril de 2010

Com exclusividade à FOLHA, ex-funcionário de terceirizada detalha como o hoje vereador Jacks Dias (PT), ex-secretário de Nedson, prefeito de Londrina nas duas últimas gestões anteriores, teria recebido R$ 6 mil mensais


Suposto pagamento de um ''mensalinho'' de R$ 6 mil durante, pelo menos, três anos, a secretário municipal com salário mensal exatamente de R$ 6 mil; compra de convites para churrasco de um partido ligado à administração municipal da época e até um servidor de carreira que receberia ''esporadicamente'' para prestar informações que, se não facilitassem, ao menos subsidiassem reajustes de contrato subsequentes a seus pagadores. Esses são os ingredientes da mais nova denúncia de crime de concussão investigada em Londrina pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), em conjunto com a Promotoria de Defesa do Patrimônio Público.

Diferentemente do escândalo denunciado em junho de 2008 pelo então vereador cassado Orlando Bonilha - segundo o qual empresas do transporte coletivo pagariam mensalinho de R$ 1,2 mil, em média, a vereadores da cidade -, dessa vez o suposto pagamento teria ocorrido a um alto integrante do Executivo municipal à época do prefeito Nedson Micheleti (PT): seu secretário de Gestão Pública e ex-presidente do PT, o hoje vereador Jacks Aparecido Dias. Ele se elegeu em outubro de 2008, depois de ter perdido a disputa em 1996. Foi sob o comando de Jacks que a Prefeitura de Londrina, no segundo mandato de Nedson, centralizou na Gestão Pública todas as licitações da administração direta - a pretexto de baratear e agilizar procedimentos.

No Gaeco e na Promotoria, o assunto ainda é tratado com evasivas - admite-se apenas que é investigado suposto caso de concussão porque duas empresárias da cidade teriam sido compelidas a pagar propina ao agente público a fim de que não sofressem retaliações, uma vez que mantinham contrato com o Executivo. As informações foram confirmadas à reportagem, contudo, após a FOLHA ter ouvido com exclusividade um ex-funcionário dessa empresa - o Grupo Setrata, onde um dos braços é a empresa Sertcon, que presta serviços de limpeza à Prefeitura de Londrina em unidades básicas de saúde (UBSs) e na Centrofarma. O contrato, fechado ainda na gestão petista, valia entre R$ 170 mil e R$ 180 mil mensais.

O ex-funcionário, ligado ao setor de contabilidade da Setrata, aceitou conceder entrevista gravada à reportagem desde que seu nome fosse mantido em sigilo. Ele conta que, tão logo pensou em levar adiante as informações que teria sobre o suposto mensalinho a Jacks, passou a ser procurado pelo agora vereador, por telefone, ainda que, garante, não fossem amigos, sequer conhecidos. Uma dessas ligações foi presenciada pela reportagem, na casa do entrevistado, há pouco mais de dois meses -o número chamado de fato era o do hoje vereador, cuja voz era a do próprio -, mas, como nas demais abordagens que teriam ocorrido, a conversa não vingou. ''Alguém certamente passou meu telefone a ele, que não falou o que queria, disse apenas que queria se encontrar comigo. Mas marcava e desmarcava, depois não ligou mais'', relata o ex-funcionário.

De acordo com ele, desde 2005 eram comuns nos relatórios contábeis da empresa retiradas em nome da Autarquia Municipal de Saúde (AMS), órgão com o qual a Setrata mantinha o contrato de limpeza. Os pedidos para que se lançassem na movimentação financeira da empresa despesas inicialmente de R$ 5 mil mensais, depois de R$ 6 ml ao mês, sob o registro ''retirada mensal autarquia'', seriam feitos pelas sócias-proprietárias do grupo, as empresárias Marli Aparecida Batilani e Monica Amstalden.

Indagado sobre qual motivação para acreditar que as retiradas fossem destinadas ao então secretário, o entrevistado explicou: ''Todos os meses a diretora Marli ou esporadicamente a Monica me pediam a retirada de R$ 5 mil, que depois passou para R$ 6 mil, e sempre no mesmo dia que a AMS efetuava pagamento de notas fiscais para o Grugo Setrata, ou no máximo um ou dois dias depois. Efetuava-se o pagamento da nota, então me mandavam tirar esse numerário e sempre entregar, em dinheiro, dentro de um envelope que ela (Marli) ou seu Antonio Batilani, pai dela e um dos sócios, levavam até ele (Jacks)''.

O ex-funcionário conta ter ouvido do próprio Antonio Batilani que o dinheiro abastecia o ''mensalinho'' de Jacks, mas reforça que, esta semana, após prestar depoimento ao delegado do Gaeco, Alan Flore, teve certeza do destino dos saques. ''Ainda que não no período todo em que esses pagamentos foram feitos, mas elas, as duas empresárias, admitiam no depoimento delas ao delegado que o Jacks pedia o dinheiro; já a pessoa que entregava na maioria das vezes, o seu Antonio, confirmou que era para o secretário e que ele pedia o dinheiro'', atesta.

Ao Gaeco, onde corre inquérito policial, além do procedimento no Patrimônio, o depoente informou nomes de outros três funcionários que saberiam não apenas da retirada, mas do pagamento a Jacks, além de uma funcionária que saberia das retiradas, pelo menos. Uma dessas funcionárias, ele conta, teria comentado, em certo momento, aspectos que justificariam - na análise desse ex-funcionário - vantagens para a terceirizada, nessa suposta relação com o então secretário de Gestão Pública.

''Enquanto trabalhei lá, não sei se esse contrato foi de fato fiscalizado... porque nunca vi a Prefeitura de Londrina pedir documento algum, por exemplo, referente a ele.

A fonte apontou ao Gaeco locais na cidade em que parte da documentação que comprovaria as retiradas e os pagamentos pudesse ser localizada. Mandados de busca e apreensão foram cumpridos na sede da empresa e em residências, de modo que uma vasta papelada está sob análise da auditoria do MP, e um notebook apreendido já foi devolvido. Uma agenda que conteria anotações de encontros de almoço, por exemplo, entre as diretorias da Setrata e o ex-secretário não foi localizada. ''Dentre outros locais, se encontravam em um restaurante na Rua Pio XII (região central), na casa delas ou em uma estância. Isso eu via, porque a agenda, às vezes, ficava aberta sobre a mesa. E bem nos dias em que eram feitos os pagamentos, o Jacks contatava a Marli ou a Monica, e então acertavam o local.''

Um dos relatórios contábeis que seria também alvo da busca e apreensão do Gaeco, aponta um total geral de R$ 167.950,30 que, entre 2006 e 2008, teria sido pagos sob as inscrições ''retirada mensal autarquia'' ou ''retirada diretoria AMS'' ou ''retirada diretoria autarquia'', e mesmo ''retirada autarquia doação PT''. As retiradas seguem uma regularidade de valores e datas - são suspensas depois de fevereiro de 2008, mas retornam, em uma parcela de R$ 43 mil (escalonada em quatro vezes), em setembro daquele ano. ''Ficaram com medo, porque um pouco antes o vereador Henrique Barros foi preso com dinheiro em um envelope (isso em janeiro de 2008). Deram um tempo, mas todo o período não pago foi quitado em setembro, perto da eleição'', detalha o ex-funcionário.

A promotora de Defesa do Patrimônio Público, Leila Schimiti Voltarelli, confirmou o procedimento aberto, ''a partir de notícias de um esquema de corrupção porque as vítimas teriam sido compelidas a pagar supostamente propina a agente público para manutenção de contrato''. ''Chegamos a um fato que gerou a busca e a apreensão, em medida cautelar, mas isso tudo agora está sendo analisado pelo MP'', resumiu. O promotor do Gaeco Jorge Barreto admitiu que mais cinco intimações foram expedidas para tomada de novos depoimentos.

Após a entrevista - marcada após muita conversa e a garantia de anonimato -, o ex-funcionário desabafa e explica o motivo de, mesmo expondo algo que supostamente poderia ter lesado os cofres públicos, não querer ser identificado. ''Preciso preservar a minha vida e a vida da minha família. Hoje eu vivo com medo, em pânico. Tenho medo de represália deles. Mas a gente sabe que isso é o pedacinho de um esquema muito grande, o pedacinho de um quebra-cabeça que vai ser montado agora.''

O vereador foi procurado ontem pela reportagem mas não foi localizado. Ele também não compareceu à sessão na Câmara Municipal. Segundo um assessor de seu gabinete, Jacks teria tido um problema de saúde e, por isso, não foi ao Legislativo.

O advogado Omar Baddauy confirmou que advoga para as empresárias mas disse desconhecer as denúncias que estão sendo investigadas pelo Gaeco. Ele afirmou que só depois que discutisse o assunto com suas clientes poderia se posicionar. (Janaína Garcia – Colaborou Luciano Augusto)


Servidor receberia até R$ 1 mil por informações do contrato
Além do ex-secretário de Gestão Pública e hoje vereador Jacks Dias
(PT), quem também aparece no depoimento do ex-funcionário da Sertcon ao Gaeco como suposto beneficiário de pagamento de propina é um funcionário de carreira da Prefeitura de Londrina. De acordo com a fonte, se trata de um servidor do departamento administrativo-financeiro que receberia valores como R$ 250, R$ 500, R$ 750 e até R$ 1 mil que seriam contabilizados, na movimentação financeira da empresa, sob a inscrição ''retirada complemento autarquia''.

De acordo com o ex-funcionário da terceirizada, o recebimento por parte do servidor, ''esporádico'', se daria em troca de informações supostamente repassadas a uma das sócias-proprietárias do grupo, Marli Aparecida Batilani, sobre licitações ''de um modo geral'' na administração municipal, e, em específico, sobre reajustes de contrato da Setrata.

''Há um documento repassado ao Ministério Público, inclusive, que é uma carta do Grupo Setrata a esse funcionário, solicitando reajuste no valor do contrato da Sertcon com a Autarquia Municipal de Saúde. Um dia depois dessa carta protocolada, foram pagos R$ 5 mil ao Jacks'', relatou, negando que, ao servidor, se tratasse, em essência, de mensalinho. ''Não era mesada porque acontecia esporadicamente. Mas o vi várias vezes na empresa - várias vezes, durante todos os anos em que estive lá.'' A respeito dessa correspondência, aliás, comentou que em 21 de agosto de 2008, graças à ligação com o servidor público, a Sertcon teria conseguido a aprovação da recomposição de preços do valor pago pela Autarquia de Saúde, pelos serviços. Um mês depois - quando o ex-secretário teria recebido os R$ 5 mil -, contudo, Marli teria pedido que o acréscimo nos valores pagos fosse retroativo a fevereiro daquele ano.

Ainda em 2008, apontou, as idas do servidor teriam sido mais assíduas à firma de terceirização. O motivo: dinheiro ''para convites de churrascos do PT, ou de pagamentos desses churrascos''.

A reportagem apurou que um desses documentos, por exemplo, já apresentado ao MP, aponta um registro de despesa de 9 de dezembro de 2005 no valor de R$ 2 mil referente à aquisição de churrasco ao partido do então secretário. Há ainda relatórios financeiros - alguns, alvo da busca e apreensão da semana passada - com registros como o seguinte: ''retirada diretoria autarquia doação PT'', com valores a partir de R$ 1 mil.

Nem o Gaeco, tampouco a Promotoria de Defesa do Patrimônio Público citaram o nome do servidor municipal, uma vez que o caso segue sob investigação. Ambos, porém, confirmaram que também essa situação apontada no depoimento do ex-funcionário da terceirizada - e reforçada na entrevista à FOLHA - segue sob análise dentro dos procedimentos instaurados. (J.G.)


Corregedor vai buscar informações sobre Jacks Dias
O corregedor da Câmara Municipal de Londrina, vereador Rony dos Santos Alves, pretende solicitar informações ao Grupo de Atuação contra o Crime Organizado (Gaeco) sobre a denúncia de que o ex-vereadores Jacks Dias (PT) teria recebido propina enquanto era secretário de Gestão Pública do ex-prefeito Nedson Micheleti. A denúncia se tornou pública hoje (16) através de reportagem da Folha de Londrina.
16/04/2010 - Ex-secretário de Nedson teria recebido "mensalinho"


"O objetivo é saber se este suposto crime ocorreu apenas enquanto ele era secretário ou se houve continuidade depois que foi eleito vereador", disse ao Bonde Rony, acrescentando que como corregedor tem dever de ofício de buscar as informações. "Se não houver provas de continuidade, a Câmara nada poderá fazer, porque não teria havido quebra de decoro parlamentar".

Pilantra e desonesto
O corregedor disse ainda que lamenta que atualmente quatro vereadores – Rodrigo Gouvêa, Joel Garcia e Paulo Arildo, além de Jacks Dias – estejam sendo investigados por atos desta natureza. "É lamentável que alguns vereadores ajam desta forma", comentou.

"No entanto, os políticos saem da sociedade e os eleitores precisam entender que se votam e elegem um pilantra, desonesto, dificilmente esta pessoa irá mudar depois que passar a ocupar o cargo público. Pelo contrário, este político tende a continuar decepci
onando brutalmente a sociedade", finalizou Rony Alves.

Um comentário:

Curioso disse...

É uma beleza ver o Ministério Público agindo com firmeza. Mas a gente sempre se pergunta por que em certas cidades acontece tanta coisa e o MP não vai em cima.