VALOR ECONÔMICO, 9 de junho de 2010
Em sessão tumultuada por um festival de grosserias e sabotagens mútuas, deputados ruralistas e ambientalistas começaram ontem a debater a nova legislação ambiental do país. As discussões sobre a proposta do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) ao Código Florestal Brasileiro devem ser retomadas hoje, mas os ambientalistas atuam para adiar, por meio das brechas regimentais da Câmara, a votação do texto até 2011.
Com direito a torcida organizada, que acenou cartões vermelhos e cartazes contrariados ao relator, os ambientalistas já usaram as regras internas para esticar ao máximo a leitura obrigatória do longo parecer de 309 páginas. "A estratégia é levar até o recesso", resumiu o líder do PV, Edson Duarte (BA). Ansiosos, os ruralistas querem apressar o processo para votar o texto de Rebelo no plenário da Câmara antes do início desse recesso parlamentar, previsto para meados de julho. "Não tem motivo para deixar uma decisão para 2011. O Brasil não aguenta mais essa protelação", defendeu o presidente da Comissão Especial do Código, deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR).
Em 28 páginas, o relator Aldo Rebelo altera radicalmente o atual Código Florestal ao isentar de áreas de reserva legal (RL) propriedades abaixo de quatro módulos fiscais (de 40 a 400 hectares, segundo a região) e reduzir, de 30 metros para até 7,5 metros, a área de preservação permanente (APP) em beiras de rios e cursos d"água em casos específicos. Os Estados poderão fazer essa redução de acordo com seus próprias regras. "Não há problema em termos a legislação concorrente", disse Rebelo.
Pela proposta, os Estados terão poder para anistiar, por até cinco anos, as multas, embargos e termos de compromisso assinados por produtores rurais por derrubadas ilegais. Quem fez desmatamento até 22 de julho de 2008 poderá ser beneficiado com esse perdão. "Isso é o maior absurdo dessa proposta. Dá um sinal completamente contrário aos esforço de preservação ambiental assumido pelo Brasil em todos os fóruns internacionais", avaliou o diretor da ONG Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), André Lima.
O texto dá, ainda, aos Estados o poder de decidir sobre redução das APPs, recomposição por meio de espécies exóticas e prazo de consolidação de áreas exploradas. A proposta também entrega aos Estados o poder de determinar, via legislação concorrente com a União, regras regionais a partir das diretrizes do Programa de Regularização Ambiental (PRA) e do Zoneamento Econômico-Ecológico (ZEE). Haverá "moratória" de cinco anos para supressão florestal. "O corte raso não será permitido", disse Rebelo.
O parecer também permite a exploração de topos de morros, mas proíbe o uso agropecuário das chamadas veredas. As compensações ambientais poderão ser feitas na bacia hidrográfica onde ocorreu o desmatamento irregular. "O parecer do Aldo foi muito mais além na destruição das leis ambientais do que prevíamos", disse o diretor da ONG ambientalista Greenpeace, Sérgio Leitão. "Ele tirou do Poder Público, ou seja, de todos nós, o direito de decidirmos sobre o que queremos para o futuro das nossas reservas florestais". Em defesa de seu parecer, Rebelo afirmou que tenta criar "alternativas reais" para tirar 4 milhões de produtores da ilegalidade ambiental. "Eles [ONGs] têm que vestir as sandálias da humildade", disse. "Querem interditar a infraestrutura, tutelar os índios e trazer boas novas da defesa da natureza com financiamento farto, como braços paramilitares de interesses internacionais".
O texto permite, ainda, a manutenção de áreas desmatadas de forma irregular (consolidadas) por até cinco anos com imunidade de multas. Mesmo depois disso, os donos dessas terras ainda poderão assinar termos de compromissos adicionais sem a devida punição pecuniária ou criminal. Haverá restrições para lavouras em encostas cuja inclinação tenha entre 25 e 45 graus, mas permite exceções determinadas por órgãos de pesquisa.
A proposta de Aldo Rebelo também permite a soma da APP na área da reserva legal e a recomposição da mata com espécies exóticas mediante lei estadual. Rebelo libera o plantio de lavouras em várzeas e concede ao dono da terra o poder de decidir em que local fará a preservação da reserva legal, que deverá ter compensação financeira pela União, Estados e municípios.
As APPs em regiões urbanas serão definidas por meio de leis municipais. E o regulamento poderá definir, segundo o parecer de Aldo Rebelo, "outras hipóteses" para novos desmatamentos em APP por decretação de utilidade pública, como a construção de parques, praças, ruas e logradouros públicos.
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