segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Para corregedora nacional da Justiça, corrupção no Judiciário tem que ficar fora da alçada de juízes

INSTITUTO AME CIDADE, 21 de novembro de 2011


No final de setembro foi criada muita polêmica em torno de uma entrevista da corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, na qual ela falava de "gravíssimos problemas de infiltração de bandidos que estão escondidos atrás da toga". A corregedora comentava então sobre as dificuldades para fiscalizar o Judiciário brasileiro e punir juízes corruptos.

A fala de Eliana Calmon, que também é ministra do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), era também uma reação às tentativas de setores do Judiciário de limitar os poderes do Conselho nacional de Justiça (CNJ). A Associação Brasileira dos Magistrados (ABM) entrou em julho no Supremo Tribunal Federal (STF) com uma ação direta de inconstitucionalidade contestando o poder do CNJ para fiscalizar e punir juízes.

O CNJ é o órgão encarregado pelo controle sobre a atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e também responsável pela fiscalização da atuação dos juízes.

A corregedora se mostra empenhada em defender a manutenção das prerrogativas do CNJ. Depois da polêmica em torno da sua declaração sobre a existência de “bandidos togados” no Judiciário ela foi contestada pelo ministro Cezar Peluso, do STF, que se ateve à frase destacada pela imprensa para exigir que ela se retratasse. A ministra se negou, até porque em suas entrevistas fica muito claro que ela se refere a juízes desonestos que usam a falta de transparência para cometer delitos.

Ela confirma que existe corrupção no Judiciário, mas da mesma forma que em todos os segmentos da sociedade. Por isso, é necessário o controle.

Na madrugada desta segunda-feira, Eliana Calmon voltou ao tema em entrevista ao programa “É notícia”, da Rede TV, quando fez novamente uma firme defesa das prerrogativas do CNJ e a necessidade de fiscalização do Judiciário, além de dar um esclarecedor depoimento sobre o papel do CNJ. Na entrevista, ela também falou sobre os riscos de conceder aos próprios juízes o poder de fiscalização e punição dos erros e delitos praticados no âmbito do Judiciário.

Segundo a ministra, se a fiscalização e punição forem deixadas nas mãos dos próprios juízes e não sob a guarda do CNJ, como ela defende, é sempre maior a probabilidade de nada acontecer contra magistrados que descumprem a lei. A prática já mostrou que a convivência muito próxima tem como resultado uma proximidade e até mesmo diferenças que vão criando um quadro em que, no final, ninguém investiga ninguém.


Proximidade entre juízes
leva para a gaveta denúncias
de corrupção no Judiciário

Na entrevista do “É notícia”, que é apresentado pelo jornalista Kennedy Alencar, Eliana Calmon disse que mesmo da forma que vem sendo conduzido pelo CNJ, o trabalho de fiscalização dos tribunais sofre com barreiras criadas pelo corporativismo no Judiciário. A proximidade entre juízes e desembargadores permite artifícios que impedem audiências envolvendo colegas e levam processos para a gaveta.

Sobre as dificuldades que podem existir, caso a investigação e punição de delitos nos tribunais fiquem a cargo dos próprios juízes, ela citou o caso da Justiça do Tocantins, onde num tribunal com 12 juízes, nove deles estão sendo investigados pelo CNJ.

Durante o programa a ministra mostrou também que o CNJ tem uma função importante na modernização do Judiciário brasileiro, atuando inclusive sobre aspectos administrativos da nossa Justiça. Além do trabalho rotineiro relacionado à fiscalização e transparência, o CNJ age também na modernização da estrutura e do funcionamento dos tribunais.

Segundo a ministra, tradicionalmente o Judiciário brasileiro vinha sendo uma instituição fechada aos olhos da opinião pública, mantendo sob sigilo até dados básicos de sua estrutura administrativa.

Nada se sabia sobre a atuação dos juízes e nem mesmo qual é o custo econômico do Judiciário para a nação, quantos processos existem, o custo de um processo e tantos outros dados que por direito deveriam estar à disposição da população. Enfim, não havia controle e muito menos transparência em elementos essenciais até para que o Judiciário adquirisse maior qualidade.

Segundo ela, o CNJ trabalhou de forma intensa neste processo de modernização administrativa, agindo como órgão de planejamento, num trabalho que vêm dando bons resultados práticos.


Punição de delitos de juízes
não podem se restringir à
aposentadoria do cargo
Sobre a dificuldade da punição de juízes corruptos, Eliana Calmon afirmou que leis totalmente defasadas impedem que se faça justiça de fato, penalizando de forma exemplar qualquer magistrado. Segundo ela, a lei orgânica da magistratura, que é de 1979, precisa ser atualizada em vários pontos, principalmente no aspecto da punição.

Como exemplo, ela citou o fato de hoje um desembargador ter como punição a aposentadoria do cargo. Hoje este procedimento é visto pelos brasileiros menos como punição. Em relação a um criminoso de toga chega a ser até uma recompensa.

Essa forma de punição poderia ser válida talvez no passado, quando, ainda segundo a corregedora, a aposentadoria de um magistrado por uma sanção era um demérito terrível, “quase como uma morte”.

Eliana Calmon defende que haja penas disciplinares mais modernas, que em sua opinião podem ter como referência a lei de improbidade administrativa. Em sua opinião, esta é uma das leis mais eficientes que temos, pois comporta sanções pecuniárias, multas, perda de função pública e a reposição do que foi tirado dos cofres públicos.

Sobre a corrupção no Judiciário, a ministra acredita que esta é uma situação que vem de um período anterior de 15 anos, quando juízes passaram a ser cooptados por dirigentes públicos, inclusive na esfera municipal. Com o crescimento da corrupção no Brasil, ela disse, “muitos magistrados caíram nesta malha”.

No combate à corrupção, ela vê de forma muito produtiva o papel da imprensa. Hoje em dia, disse a ministra “um dos temores do corrupto é a mídia”. Para ela, ao apontar irregularidades de dirigentes públicos a imprensa reforça a transparência. “Nós estamos vendo que o que pega o corrupto não é tanto a polícia, mas a mídia. Que começa a mostrar as diferenças entre um procedimento e outro. Que é exatamente o grande temor do corrupto.”

A entrevista de Eliana Calmon ao programa "É notícia" pode ser vista na íntegra no site da Rede TV. Para isso, clique aqui.

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